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Jogo de sombras em Ancara

O que se está a passar em Ancara é tremendo. E é tremendo porque, a rigor, ninguém parece ter uma noção sequer aproximada de quais são as verdadeiras intenções do Governo turco.

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O que se está a passar em Ancara é tremendo. E é tremendo porque, a rigor, ninguém parece ter uma noção sequer aproximada de quais são as verdadeiras intenções do Governo turco – em relação ao regresso do adultério ao Código Penal; em relação à repressão dos casos, que diz serem apenas "isolados", de tortura nas prisões; em relação ao processo de separar, de vez, as águas entre militares e políticos.

Estes são apenas alguns exemplos recentes em que o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan dá um dia um passo em frente, para no seguinte voltar ao ponto de partida, num jogo de sombras que levanta legítimas dúvidas sobre se o AKP, um partido até agora classificado de "islâmico moderado", não terá caído, de facto, nas mãos dos seus elementos mais radicais, e se o poder instalado em Ancara está efectivamente interessado em ancorar a Turquia ao modelo político e social da Europa ocidental.

No espaço de uma semana, ouvimos o primeiro-ministro turco afirmar, em tom de ameaça, que as relações entre a UE e a Turquia sairiam "abaladas" caso Bruxelas mantenha a porta fechada, e três dias depois ouvimos o mesmo senhor, no mesmo tom ameaçador, a avisar a UE – a tal que parece ter tanta pressa em fazer parte – que "não pode imiscuir-se nos assuntos internos" do seu país.

Ou seja, que Bruxelas tem de ficar calada quando um Governo de um país candidato, sobre o qual está a ultimar um relatório crucial – tanto para o futuro da Turquia como, e diria até mais, para o da própria UE – resolve tirar do Parlamento uma reforma fundamental, a do código penal, porque o partido no poder está dividido sobre se as relações extraconjugais devem, ou não, voltar a ser crime ...

O senhor Erdogan não entendeu sequer as regras do jogo. Se não que Bruxelas se imiscua nos assuntos internos, melhor que retire o pedido de adesão.

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