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03 de Dezembro de 2008 às 13:22

Índia e Paquistão de crise em crise

Os ataques de Mumbai foram o culminar de um ano de acções terroristas na Índia, na maior parte perpetradas por redes islamitas, e colocaram o governo de coligação liderado pelo Partido do Congresso numa situação insustentável. Aos fracassos sucessivos dos serviços de informação e segurança de Nova Deli para obstarem a atentados...

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Aos fracassos sucessivos dos serviços de informação e segurança de Nova Deli para obstarem a atentados de organizações como os Mujahideen da Índia, apoiados por islamitas do Paquistão e do Bangladesh, aos ataques de radicais hindus contra comunidades cristãs e muçulmanas, à insurreição maoísta em Bengala Ocidental e no Centro e Leste do país, veio juntar-se o "raide" terrorista de Mumbai.

A ameaça islamita na Índia

Apesar dos operacionais que desembarcaram em Mumbai serem oriundos do Paquistão as acções mais violentas partiram recentemente do Movimento dos Estudantes Islamitas da Índia.

As redes islamitas indianas ganharam força desde a destruição da mesquita de Ayodhya em 1992 por radicais hindus e dos motins em Bombaim no ano seguinte (a Bombaim que Catarina de Bragança levou como dote no casamento com Carlos II de Inglaterra em 1661 só assumiu o nome em maharati em 1996), enveredando pela via terrorista em contacto com militantes paquistanesas e bengalis.

O submundo do crime organizado de Mumbai, com ligações aos emirados do Golfo Pérsico e ao Paquistão, embrenhou-se, também, em acções terroristas que tiveram o seu momento mais sangrento nos atentados organizados em 2003 pelo mafioso Dawood Ibrahim (refugiado actualmente em Karachi) e patrocina grupos radicais hindus e muçulmanos.

Os motins anti-muçulmanos em Gujarat, com a complacência do governo estadual nacionalista hindu, em 2002, marcaram outro momento de radicalização da militância islamita na Índia.

A acentuada degradação das condições de vida da minoria muçulmana (cerca de 150 milhões de fiéis, 14 % da população) reconhecida pelos próprios estudos oficiais, como, por exemplo, o relatório da Comissão Sachar de 2006, tem vindo a facilitar o recrutamento de jovens motivados pela ideologia jihadista.

Desde os anos 90 que organizações como Lashkar-e-Toiba (O Exército dos Puros) e Joish-e-Mohammad (Os Guerreiros de Maomé), sustentadas pelo exército e serviços secretos do Paquistão, revigoraram com fervor fundamentalista a contestação separatista em Caxemira.

A confluência de todas estas tendências é agora cada vez mais notória. O "raide" de Mumbai visou os símbolos cosmopolitas das elites da capital financeira da Índia, atingindo por arrasto visitantes estrangeiros, e assumiu mesmo um teor anti-judaico com o massacre no centro ortodoxo dos Lubavitch numa cidade sem tradição de anti-semitismo.

De Caxemira a Cabul

O diferendo sobre o estatuto de Caxemira, na origem directa de duas guerras entre a Índia e o Paquistão desde a partilha sangrenta de 1947, passou a ser um elemento catalisador da toda a militância islamita no subcontinente.

O arco de crises que vai do Afeganistão (o atentado de Julho à embaixada indiana em Cabul contou com a cumplicidade dos serviços secretos paquistaneses) ao Bangladesh (o Harkat-ul-Jihad-al-Islami, Movimento da Guerra Santa Islâmica, criado durante a guerra anti-soviética no Afeganistão, tem lançado ataques na Índia a partir da fronteira bengali) paralisa o governo de Manmohan Singh que incapaz de negociar um acordo sobre Caxemira se vê obrigado a exigir a Islamabade a repressão de frentes islamitas e bandos do crime organizado.

O governo de Asif Zardari, confrontado com elementos das forças armadas e dos serviços de informação que apoiam os islamitas, não tem condições para cumprir a exigência de Nova Deli sem obter concessões quanto ao referendo adiado desde 1947 sobre Caxemira.

Um agravamento das relações entre as duas potências nucleares do subcontinente é tanto mais previsível quanto maior for o aumento da contestação dos nacionalistas hindus do Baharatiya Janata que têm nas eleições legislativas de Maio uma oportunidade para regressar ao poder e retomarem uma campanha anti-muçulmana à semelhança do que aconteceu durante a sua governação entre 1998 e 2004.

A resposta previsível por parte do Paquistão, depois de Zardari ceder às pressões dos militares, passa pela ameaça de recolocar forças ao longo da fronteira com a Índia o que agravaria ainda mais a situação na Província do Noroeste e nas áreas tribais, aproveitando aos tabilan, além dos separatistas do Baluchistão, no sul do país.

Em Dezembro de 2001 um ataque suicida dos islamitas do Lashkar-e-Toiba ao parlamento de Nova Deli criou uma situação de tal tensão que só a mediação de Washington evitou in extremis uma guerra entre a Índia e o Paquistão.

Ao acabar 2008 a tensão está de volta, mas com a frente afegã a reduzir a margem de manobra, o acordo nuclear entre Washington e Nova Deli ameaçado por um futuro governo nacionalista hindu, e um rol de agravos cada vez mais pesado.

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