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30 de Setembro de 2020 às 20:48

God save America

Os eleitores de Trump, o núcleo duro, não se importam com nenhum dos excessos verbais do candidato, já o conhecem e sabem que ele defende os seus valores.

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Ao terminar o debate Trump-Biden, lembrei-me daquele adjectivo de Hillary Clinton para os eleitores de Trump: "Deplorable".

O debate teve muito de "deplorable". Um cronista do The National Interest, Aram Bakshian Jr, escreveu que se tivesse de dar um título ao episódio chamar-lhe-ia "Grumpy Old Men – The Sequel". Grumpy old men, já que ambos os candidatos "foram malcriados, agressivos e pouco rigorosos nos factos".

Muitos comentadores – dos independentes – concordam que foi o pior debate televisivo de sempre, desde que há 60 anos começaram, com Jack Kennedy contra Richard Nixon. E Bakshian Jr. vai mais longe, ao dizer que mais parecia uma disputa embirrenta num lar de terceira-idade que um debate para o lugar mais importante do mundo.

O moderador, se é que era possível moderar os dois contendores, também não terá sido brilhante mas foi fazendo o que podia.

Trump, que é um lutador agressivo e um incontinente verbal e que tem uma massa de apoio irredutível, jogou o seu papel de Presidente, que teria a eleição na mão não fosse o Corona Vírus estragar-lhe a Economia e pô-lo a comentar os avanços e retrocessos da praga e das suas curas. Trump sabe que a generalidade dos media o odeia cegamente e que vai distorcer tudo o que diz e não diz; por isso – perdido por cem perdido por mil –, diz o que pensa.

Biden é a solução encontrada, à falta de melhor. É a tentativa de sobrevivência do establishment democrático, que quer emergir entre Sila e Caríbdis. Sila é o Trumpismo, um conservadorismo popular assente na religião, no patriotismo, nos valores americanos tradicionais; Caríbdis é a ala esquerda do Partido, o socialista Sanders e – pior – os desordeiros ligados ao Antifas e ao Black Lives Matter, que "humanitariamente" matam polícias e saqueiam lojas nas "manifestações pacíficas", mas que são, com os seus simpatizantes, uma fracção e facção influente do eleitorado democrata.

Biden vem com aquele ar de senhor idoso, bem-educado, mas não se inibe de responder com insultos aos provocatórios insultos do adversário, chamando "maluco", "palhaço" e "mentiroso" a Trump, não olhando para ele e referindo-se-lhe como "he". Quando as perguntas são incomodativas repete "Here is the deal" e aponta pateticamente para a câmara, qual desbotado cartaz dos anos cinquenta, na tentativa de falar ao coração das famílias americanas e de interpelar directamente os co-cidadãos. Enquanto a confusão e a violência reinam nas cidades, diz que devem ser todos amigos e quer reeducar a Polícia, com psicólogos e "sensibilizadores de raça" …

Não creio que o debate vá mudar muito a posição dos americanos: o centro da eleição é Trump, a sua personalidade e o seu governo. Os democratas, da esquerda ao centro-direita – e uma série de personalidades republicanas que ele ofendeu ou magoou nas suas convicções ou egos – querem, a qualquer preço, vencê-lo. Por isso não se importam, na alternativa, de eleger uma espécie de chaperon indeciso, um velho routier da política americana, que no passado alinhou com os segregacionistas contra o "busing" escolar e votou leis duras que serviram para encarcerar e manter atrás das grandes dezenas de milhar de "vítimas do sistema"; vítimas que agora quer capitanear, abrindo caminho aos radicais.

Os eleitores de Trump, o núcleo duro, não se importam com nenhum dos excessos verbais do candidato, já o conhecem e sabem que ele defende os seus valores.

No fim, a decisão vai caber a uma minoria que, não gostando de Trump, talvez não queira, pelo facto de não o quererem, entregar o destino do país a Biden. Veremos. Enfim, "God save America".

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