Opinião
03 de Agosto de 2015 às 10:00
Forças inflacionistas começam a ganhar ímpeto
É prematuro falar de retirada gradual do programa QE. O BCE está empenhado em prosseguir com a compra de ativos até que a inflação atinja o nível da sua meta.
Nos últimos tempos, a inflação tem estado num marasmo, com a estagnação do crescimento global e a grande queda registada no ano passado no preço do petróleo a afetarem as expetativas de inflação. Mas, na segunda metade de 2015 deveremos assistir ao regresso da inflação geral positiva.
Quais foram os "drivers" do mercado de inflação em 2014?
A queda dos preços do petróleo na segunda metade de 2014 apanhou toda a gente desprevenida. O petróleo registou uma queda de quase 60% desde o máximo atingido em junho até ao final de dezembro, o que, dado que o petróleo é um dos contributos mais importantes para os cálculos da inflação, afetou fortemente os números relativos à inflação geral. O mesmo sucedeu com as expetativas de inflação implícita, cujos níveis globais caíram demasiadamente. As obrigações indexadas à inflação mundiais foram penalizadas pelo declínio das expetativas de inflação, ao contrário das suas homólogas nominais, tendo gerado retornos de um só dígito nulos ou muito baixos em 2014.
E em 2015?
A recuperação das taxas de inflação implícita nos EUA, Reino Unido e Zona Euro durante os primeiros meses deste ano foi sobretudo impulsionada pelo aumento das "yields" nominais e pela revisão em alta das expetativas de inflação do mercado quando os preços do petróleo começaram a recuperar. As avaliações das obrigações indexadas à inflação ("linkers") aumentaram com base na variação mensal da inflação devido à subida dos preços do petróleo. A história de "reflação" começa a ganhar força nos mercados mundiais, na altura em que a Reserva Federal norte-americana se prepara para aumentar as taxas de juro e o BCE prossegue com as suas compras de ativos.
Nos EUA, o aumento dos salários reais continua a ser de aproximadamente de 2% em termos homólogos uma vez que o crescimento nominal médio dos salários se mantém resiliente e que o IPC geral se situa em zero. Os efeitos do declínio do preço do petróleo estão a sentir-se e, como os preços da gasolina caíram 28% desde setembro, o consumo discricionário em indústrias tais como a da hospitalidade aumentou.
Na Zona Euro, a grande notícia foi o recente aumento das yields nominais para os níveis a que se situavam no início do ano. O IPC geral da Zona Euro tem estado em território negativo desde dezembro do ano passado, embora tenha recuperado para 0,3% em maio (em termos homólogos). A opinião consensual é de que o programa de compra de ativos ("quantitative easing") do BCE teve até agora êxito ao tirar as expetativas de inflação do marasmo em que se encontravam.
De que forma é que o programa QE do BCE vai afetar os mercados de inflação?
Mario Draghi, presidente do BCE, afirmou explicitamente que o QE depende da aproximação da inflação da meta de "inferior a mas perto de 2%" e esta condição é uma ferramenta poderosa para ajudar a aumentar as expetativas de inflação. O QE do BCE tem três formas principais de encorajamento da inflação.
Penso que é prematuro falar de retirada gradual do programa QE. O BCE está empenhado em prosseguir com a compra de ativos até que a inflação atinja o nível da sua meta - nem mesmo a Reserva Federal norte-americana se mostrou tão clara quanto à condicionalidade do seu QE. Também é importante registar que as "linkers" estão incluídas no universo de compra do BCE no âmbito do programa QE e que, diferentemente do que sucede com as nominais, não estão sujeitas ao limite de um "yield" de -20 pontos base.
Perspetivas e posicionamento
Prevejo que em 2015 as "linkers" terão um desempenho superior ao das obrigações nominais à medida que continuarem a acumular-se fatores inflacionistas: o QE na Europa, a estabilização dos preços do petróleo, a melhoria dos mercados laborais nos EUA e potenciais aumentos de preços dos alimentos relacionados com as condições climáticas… Apesar do potencial para haver um desvio num ou mais destes fatores (o aumento do preço do petróleo poderá afetar o crescimento), acredito que veremos um aumento nos valores relativos à inflação durante o resto de 2015 devido simplesmente ao desaparecimento dos principais efeitos do ano passado. Além disso, os mercados de inflação, tanto dos EUA como da Zona Euro, têm uma larga presença no retalho e prevemos ver uma história autorrealizável onde os resultados positivos da inflação levarão os investidores a comprar proteção contra a inflação e suportar ainda mais as avaliações da inflação.
No que diz respeito ao fundo, continuo a considerar as "breakevens" subvalorizadas e a manter posições longas em "breakevens". Estas posições isolam a componente de inflação prevista das "linkers" através de uma combinação de posições longas em obrigações indexadas à inflação e posições curtas em futuros sobre obrigações nominais ou "swaps" de inflação - os últimos são aqueles em que pagamos uma taxa fixa em troca de um retorno indexado à inflação.
Fora dos mercados principais dos EUA e Zona Euro, tenho uma ligeira sobreponderação no Reino Unido e Japão e tenho pequenas exposições de diversificação na Austrália, Dinamarca, Coreia do Sul e Suécia. No seu conjunto, penso que esta combinação de posições diversificadoras pode sustentar um bom ambiente para os retornos relativos em 2015.
Este artigo foi redigido ao abrigo do novo acordo ortográfico.