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Opinião
12 de Outubro de 2007 às 13:59

Europa: um declínio inevitável?

O processo em curso de aprovação da Constituição Europeia – ou Tratado, como eufemisticamente, após os referendos negativos da França e Holanda, se passou a chamar – tem vindo a suscitar crescentes críticas, dada a quase total ausência de debate entre os

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A Comissão Europeia e os políticos europeus arriscam-se a dar mais um passo para aumentar o crescente fosso entre o edifício burocrático e intervencionista, que têm vindo a criar, e os cidadãos.

A Europa vai sofrendo cada vez mais os males de dois comportamentos prejudiciais e paradoxais: de um lado, a crescente regulação e intervencionismo de Bruxelas; do outro, o cada vez maior apelo ao proteccionismo nacionalista dos políticos dos vários Estado da União Europeia, num movimento, em sentido exactamente oposto, ao do preconizado no tratado que tão rapidamente quer verem aprovado.

Quais os verdadeiros desafios da Europa no século XXI?

O problema é que, de facto, as discussões actuais e os programas políticos da “agenda europeia” estão cada vez mais afastados da abordagem dos verdadeiros problemas da realidade actual e dos desafios que a mesma impõe à União Europeia, a médio e longo prazo. E os grandes desafios da Europa do século XXI são, a meu ver, os seguintes:

a) Que posicionamento face ao crescente poderio económico e político dos chamados países emergentes;

b) Como combater o declínio demográfico europeu;

c) Como proteger os interesses europeus na disputa, cada vez maior, pelo controlo dos recursos naturais a nível mundial.

A recente crise financeira permitiu evidenciar, como nunca antes acontecera, uma nova realidade: as economias emergentes são crescentemente autónomas e começam a constituir o principal motor do desenvolvimento mundial.

Pela primeira vez, uma crise financeira e de crescimento económico nas economias desenvolvidas não está a afectar as economias emergentes.

Pelo contrário, estas respiram saúde em termos de crescimento económico, reservas financeiras sobre o exterior e capacidade para atrair investimento.

Uma nova realidade em marcha acelerada

Estudos recentes estimam que as economias emergentes contribuirão em 47,5% para o crescimento mundial de 2007 contra apenas 15,5% dos EUA e em 2008 a China, o Brasil, a Índia, o México, a Coreia e a Indonésia darão uma maior contribuição para o crescimento que os EUA.

A China já consome mais aço per capita (considerando a população urbana) que os EUA e as encomendas de computadores pessoais na Ásia do Pacífico – exlcuindo o Japão – são tantas como as dos EUA, quando em 1998 representavam apenas 1/3!

A produção de electricidade das economias emergentes terá um crescimento exponencial até 2030, de acordo com as projecções da Agencia Internacional da Energia (ver quadro).

Estes novos cenários implicam que os habituais paradigmas de análise dos blocos económicos e políticos mundiais sejam revistos de alto a baixo.

Os restos do quadro geopolítico de referência herdado do pós-guerra fria, estão em rápido desaparecimento e uma nova realidade emerge à nossa frente.

É por isso, mais importante do que nunca, que a discussão do futuro da Europa seja feito no quadro de desafios completamente novos e diferentes em que, nomeadamente, as potências emergentes passarão a ter um papel determinante. Aliás, várias das economias emergentes – a começar pela China – já deveriam ser designadas como economias convergentes.

A Europa precisa de visão estratégica de longo prazo e não de políticas suicidárias

O problema com a Europa é a ausência de visão estratégica de longo prazo que coloque as decisões políticas em perspectiva e impeça a adopção de políticas que poderão vir a ser suicidárias para o seu futuro.

O que se passa com a política europeia de controlo das emissões de CO2 por via administrativa, impondo um ónus brutal à economia europeia – ainda por cima sem efeitos significativos na redução mundial de emissões – e financiando, à custa das empresas europeias, as novas potências emergentes – Rússia e China, por exemplo –, é um exemplo vivo dessa falta de visão de longo prazo.

Também, por exemplo, a directiva de controlo dos químicos, conduzindo, à deslocalização de muitas indústrias para fora da Europa é outro exemplo de políticas que podendo ser muito populares aos olhos de uma opinião publicada, só olham o curto prazo, esquecendo as suas consequências num quadro de referência em rápida mutação.

É possível evitar o declínio

Evitar o declínio da Europa como grande potência económica e política está nas mãos de todos os cidadãos Europeus.

Temos “massa cinzenta” (“brain power”), iniciativa empresarial, cultura e história como nenhuma outra civilização. O declínio pode ser evitado. Mas isso implica que a classe política europeia assuma, com coragem, políticas estruturais de longo prazo que rompam com o marasmo, o pântano e a inércia que têm caracterizado os últimos anos.

O desenvolvimento não se decreta nem regula. Ele é tanto mais rápido e diversificado quanto maior for a liberdade de uma sociedade e da sua economia. Os soviéticos foram os últimos a tentar o contrário e criaram um monstro civilizacional que deixou milhões de pessoas a viver à míngua durante décadas e décadas.

Reafirmar o princípio da subsidiariedade de Bruxelas nos interesses dos cidadãos, aprofundar as liberdades em todas as suas dimensões, devolver cada vez mais poder aos cidadãos e à sua livre iniciativa são os caminhos para inverter o caminho para o declínio.

O processo até agora implementado para a aprovação da Constituição Europeia – com a ausência total de participação dos cidadãos europeus – está longe, por isso, de contribuir para o fortalecimento dessa Europa líder do desenvolvimento económico e cultural, relevante para o futuro da humanidade no século XXI, que todos desejamos e que, “malgré tout”, ainda é possível!

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