Opinião
Economia da Arte
Uma tela de linho, de tamanho médio, custa cerca de trinta euros.
Uma tela de linho, de tamanho médio, custa cerca de trinta euros. Se juntarmos tintas, desgaste de pincéis e outros materiais serão mais vinte. A mão-de-obra depende muito do tipo de pintura. Uma pintura pode ser feita nalguns minutos ou demorar vários dias. De qualquer modo, consideremos um tempo médio de três dias de trabalho. Tudo por junto, pintar uma tela tem um custo de produção à volta dos duzentos euros.
Uma tela de Picasso com 70 x 60 centímetros atingiu recentemente num leilão o preço de 43 milhões de euros. Uma tela de Kandinsky com 40 x 70 centímetros foi vendida por 12 milhões.
Dou outro exemplo curioso. Em 1917 Marcel Duchamp comprou na Quinta Avenida um urinol. Não terá pago mais do que algumas dezenas de dólares. Levou o sanitário para o estúdio, virou-o 90 graus, assinou R. Mutt e chamou-lhe "A fonte". Hoje é considerada umas das obras-primas do século 20.
Apresentada a concurso numa exposição, não só não foi exibida como acabou em cacos, deitada para o lixo. Ao longo da vida, Duchamp, sempre aflito de dinheiro, fez cerca de uma dezena de réplicas, verdadeiros falsos assinados R. Mutt e datados de 1917. Em 1999, uma dessas réplicas foi vendida a um colecionador grego por uma milhão e seiscentos mil euros.
Não existe nenhum outro produto que tenha um valor acrescentado tão descomunalmente alto como a arte. A tal ponto que se pode mesmo considerar que na arte tudo é valor acrescentado e os materiais, custos de produção e mão-de-obra não têm o mínimo significado.
Este facto subverte totalmente a lógica da economia. Nem sequer a lei da oferta/procura explica este fenómeno. Em arte a procura não se situa tanto na questão da propriedade mas, entre outras coisas, no usufruto, no desejo de ver, de partilhar a experiência da observação de algo que se considera culturalmente relevante. Daí que, com o tempo, as mais importantes obras de arte tendam a ir parar a Museus. Quantas mais pessoas querem ver uma determinada obra, maior é o valor de mercado atribuído.
Não há nenhuma racionalidade neste mecanismo. A valoração mercantil deste tipo de produtos não segue nenhum método objetivo. Depende do contexto, do tempo histórico e da evolução cultural. Certas obras muito valorizadas num determinado período decaem noutros e o contrário é uma evidência. O urinol deitado para o lixo em 1917 é hoje disputado por colecionadores e Museus. Van Gogh nunca vendeu um quadro em vida.
Vem esta reflexão a propósito de uma reportagem televisiva que vi recentemente onde alguns galeristas "ensinavam" como investir em arte. Disseram todos o trivial. Frequentar galerias e exposições, recolher o máximo de informação sobre autores, preços e leilões. Diversificar a "carteira". Ou seja, fazer aquilo que invariavelmente irá conduzir a um rotundo fracasso nas escolhas, ou investimentos se se preferir.
Impressionou-me a banalidade dos argumentos desta gente que se diz especialista. A história demonstra que só a arte que não é do agrado geral ou não é compreendida numa época pode tornar-se importante no futuro. E isto por uma razão simples. O processo evolutivo da arte assenta numa radical inovação. Numa constante expansão do campo de atuação cultural. Ou dito de outro modo, a arte que marca será sempre incompreensível no momento em que é feita. Já que antecipa o futuro.
É por isso que as grandes coleções, aquelas que hoje enchem os Museus, nunca foram feitas com base no que era aceite, na informação disponível ou naquilo que estava na moda. Nasceram de apostas pessoais, tão subjetivas quanto a subjetividade inerente à sua realização pelos artistas. Fizeram-se com risco, cumplicidade, partilha. E sempre, sempre, contra a opinião dos especialistas.
Deixem-me terminar com uma historieta elucidativa. Nos anos 80, alguém que julgava ser um grande colecionador português, aproveitou a passagem por Lisboa do diretor de um dos melhores Museus de arte moderna e contemporânea do mundo, para lhe mostrar a sua coleção. Ele viu e no fim disse: de facto tem aqui uma série de belas molduras.
Uma tela de Picasso com 70 x 60 centímetros atingiu recentemente num leilão o preço de 43 milhões de euros. Uma tela de Kandinsky com 40 x 70 centímetros foi vendida por 12 milhões.
Apresentada a concurso numa exposição, não só não foi exibida como acabou em cacos, deitada para o lixo. Ao longo da vida, Duchamp, sempre aflito de dinheiro, fez cerca de uma dezena de réplicas, verdadeiros falsos assinados R. Mutt e datados de 1917. Em 1999, uma dessas réplicas foi vendida a um colecionador grego por uma milhão e seiscentos mil euros.
Não existe nenhum outro produto que tenha um valor acrescentado tão descomunalmente alto como a arte. A tal ponto que se pode mesmo considerar que na arte tudo é valor acrescentado e os materiais, custos de produção e mão-de-obra não têm o mínimo significado.
Este facto subverte totalmente a lógica da economia. Nem sequer a lei da oferta/procura explica este fenómeno. Em arte a procura não se situa tanto na questão da propriedade mas, entre outras coisas, no usufruto, no desejo de ver, de partilhar a experiência da observação de algo que se considera culturalmente relevante. Daí que, com o tempo, as mais importantes obras de arte tendam a ir parar a Museus. Quantas mais pessoas querem ver uma determinada obra, maior é o valor de mercado atribuído.
Não há nenhuma racionalidade neste mecanismo. A valoração mercantil deste tipo de produtos não segue nenhum método objetivo. Depende do contexto, do tempo histórico e da evolução cultural. Certas obras muito valorizadas num determinado período decaem noutros e o contrário é uma evidência. O urinol deitado para o lixo em 1917 é hoje disputado por colecionadores e Museus. Van Gogh nunca vendeu um quadro em vida.
Vem esta reflexão a propósito de uma reportagem televisiva que vi recentemente onde alguns galeristas "ensinavam" como investir em arte. Disseram todos o trivial. Frequentar galerias e exposições, recolher o máximo de informação sobre autores, preços e leilões. Diversificar a "carteira". Ou seja, fazer aquilo que invariavelmente irá conduzir a um rotundo fracasso nas escolhas, ou investimentos se se preferir.
Impressionou-me a banalidade dos argumentos desta gente que se diz especialista. A história demonstra que só a arte que não é do agrado geral ou não é compreendida numa época pode tornar-se importante no futuro. E isto por uma razão simples. O processo evolutivo da arte assenta numa radical inovação. Numa constante expansão do campo de atuação cultural. Ou dito de outro modo, a arte que marca será sempre incompreensível no momento em que é feita. Já que antecipa o futuro.
É por isso que as grandes coleções, aquelas que hoje enchem os Museus, nunca foram feitas com base no que era aceite, na informação disponível ou naquilo que estava na moda. Nasceram de apostas pessoais, tão subjetivas quanto a subjetividade inerente à sua realização pelos artistas. Fizeram-se com risco, cumplicidade, partilha. E sempre, sempre, contra a opinião dos especialistas.
Deixem-me terminar com uma historieta elucidativa. Nos anos 80, alguém que julgava ser um grande colecionador português, aproveitou a passagem por Lisboa do diretor de um dos melhores Museus de arte moderna e contemporânea do mundo, para lhe mostrar a sua coleção. Ele viu e no fim disse: de facto tem aqui uma série de belas molduras.
Este artigo de opinião foi escrito em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.
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