Opinião
De que falamos quando falamos de crise
Falamos do esgotamento dos principais propulsores de crescimento económico na última década. Desde os anos 90, observou-se uma forte queda de preços dos bens transaccionáveis por via da entrada dos países do sudoeste asiático no mercado mundial, da redução dos preços dos bens não transaccionáveis...
Desde os anos 90, observou-se uma forte queda de preços dos bens transaccionáveis por via da entrada dos países do sudoeste asiático no mercado mundial, da redução dos preços dos bens não transaccionáveis (devido às tecnologias de informação e comunicação e à liberalização dos serviços nas economias desenvolvidas) e da baixa das taxas de juro (pela conjugação de excesso de poupança no Oriente e complacência face ao risco no Ocidente). Os rendimentos do trabalho estagnavam, mas os orçamentos familiares progrediam. Enquanto os preços dos bens e os encargos com a dívida caiam, a bolha do crédito insuflava, e o mercado imobiliário e as bolsas valorizavam-se. Agora, os benefícios da globalização estão exaustos e a crise financeira enraizou-se de forma virulenta. O petróleo, as "t-shirts" e o crédito encareceram e a recessão subiu à ribalta, num momento que vislumbra a acalmia da desordem bancária.
O simultâneo abatimento dos principais responsáveis pelo impressionante surto de expansão económica da última década significa menores ritmos de crescimento futuro. Recordam-se os acontecimentos no Japão desde 1990, com o rebentamento da bolha imobiliária e a refundação do sistema bancário. Até 2007, os preços dos imóveis nipónicos caíram cerca de 60%. Em 1990, a sobrevalorização do mercado imobiliário nipónico atingia níveis próximos dos registados nos EUA em 2006. O mercado imobiliário americano, que vive os primeiros momentos de correcção, poderá não assistir a uma queda tão pronunciada, beneficiando de uma dinâmica populacional mais benigna. Por exemplo, no Reino Unido, a descida de preços imobiliários na década de 90 foi de 25%. Mas ensombra a estabilidade do sector financeiro, que persistirá, enquanto o mercado imobiliário continuar a fornecer incentivos ao incumprimento. Até agora nenhuma medida tomada para evitar o colapso financeiro foi destinada a inverter este fenómeno, que deixa os bancos no limbo. O consumo privado, que representa cerca de 71% do PIB americano (56% na EU), terá de encolher, reconstituindo-se poupança. Sobre os orçamentos das famílias americanas pesa ainda a subida dos preços e das taxas de juro. A pressão sobre o rendimento disponível das famílias também é visível na Europa e no resto do mundo. Embora as famílias europeias estejam menos endividadas, as empresas da UE estão mais endividadas e dependem mais de crédito bancário (cerca de 50% das suas responsabilidades é crédito bancário, contra 30% no caso dos EUA), numa envolvente de acentuadas restrições creditícias. O propulsor do crescimento europeu são as exportações. Efectivamente, o PIB europeu representa 16.1% do PIB mundial (21.3% nos EUA), mas as exportações europeias correspondem a 29.4% das exportações globais (9.6% no caso dos EUA). Olhando para o paradigma de consumo, para a dinâmica populacional e para a dependência das exportações, a Europa configura a possibilidade de um padrão de crescimento nos próximos tempos mais semelhante ao Japão que os EUA, onde a demografia, a mobilidade regional, a flexibilidade de mercados e investimento empresarial menor que o europeu conferem um crescimento potencial superior.
As economias emergentes irão compensar a quebra de crescimento das economias desenvolvidas? As últimas projecções do FMI apontam para um crescimento mundial de 3% em 2009 (3.9% em 2008) à custa da expansão de 6.1% das economias emergentes, que representam 44% do PIB mundial. Os catalisadores do crescimento serão o consumo e o investimento, em vez das exportações. Para a China manter o ritmo de expansão previsto de 9.3%, é necessário que o abrandamento das exportações (50% dirige-se à Europa e EUA) seja compensado por acréscimo de investimento e consumo privado. O consumo privado representa 36% do PIB e o investimento 40%. O primeiro está a expandir-se, mas a poupança é alta e a subida dos preços internacionais pesa mais nos orçamentos asiáticos que nos ocidentais. Pelo lado do investimento, dada a actual envolvente financeira, o investimento directo na China deverá abrandar e o custo das obras públicas previstas elevar-se-á. Com perfis idênticos, as economias emergentes correm o risco de estagnar. Embora estejam mais resistentes a choques externos, os recentes bons resultados são parcialmente devedores do incremento da procura de "commodities", que definha. Se, num contexto financeiro adverso, as exportações abrandam e as importações aceleram, por via de maior dinamismo interno, alguns fantasmas do passado serão reanimados. O FMI já se encontra a elaborar planos de auxílio para países que vão da Islândia ao Paquistão, passando pela Ucrânia.
O simultâneo abatimento dos principais responsáveis pelo impressionante surto de expansão económica da última década significa menores ritmos de crescimento futuro. Recordam-se os acontecimentos no Japão desde 1990, com o rebentamento da bolha imobiliária e a refundação do sistema bancário. Até 2007, os preços dos imóveis nipónicos caíram cerca de 60%. Em 1990, a sobrevalorização do mercado imobiliário nipónico atingia níveis próximos dos registados nos EUA em 2006. O mercado imobiliário americano, que vive os primeiros momentos de correcção, poderá não assistir a uma queda tão pronunciada, beneficiando de uma dinâmica populacional mais benigna. Por exemplo, no Reino Unido, a descida de preços imobiliários na década de 90 foi de 25%. Mas ensombra a estabilidade do sector financeiro, que persistirá, enquanto o mercado imobiliário continuar a fornecer incentivos ao incumprimento. Até agora nenhuma medida tomada para evitar o colapso financeiro foi destinada a inverter este fenómeno, que deixa os bancos no limbo. O consumo privado, que representa cerca de 71% do PIB americano (56% na EU), terá de encolher, reconstituindo-se poupança. Sobre os orçamentos das famílias americanas pesa ainda a subida dos preços e das taxas de juro. A pressão sobre o rendimento disponível das famílias também é visível na Europa e no resto do mundo. Embora as famílias europeias estejam menos endividadas, as empresas da UE estão mais endividadas e dependem mais de crédito bancário (cerca de 50% das suas responsabilidades é crédito bancário, contra 30% no caso dos EUA), numa envolvente de acentuadas restrições creditícias. O propulsor do crescimento europeu são as exportações. Efectivamente, o PIB europeu representa 16.1% do PIB mundial (21.3% nos EUA), mas as exportações europeias correspondem a 29.4% das exportações globais (9.6% no caso dos EUA). Olhando para o paradigma de consumo, para a dinâmica populacional e para a dependência das exportações, a Europa configura a possibilidade de um padrão de crescimento nos próximos tempos mais semelhante ao Japão que os EUA, onde a demografia, a mobilidade regional, a flexibilidade de mercados e investimento empresarial menor que o europeu conferem um crescimento potencial superior.
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