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Clima de oportunidade

Quando, no ano 2000, Al Gore perdeu as eleições mais equilibradas da história americana, a maioria das pessoas ficou mais preocupada com a personalidade do vencedor que com a derrota do vencido.

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Não era considerado carismático e fazia análises sombrias sobre o futuro – falência do sistema de saúde americano; agravamento das desigualdades, económicas e de acesso à informação; e profundas alterações climatéricas. Esta última observação foi talvez a mais subversiva, já que sugeria a necessidade de alterar estilos de vida e punha em causa o direito de 3% da população do planeta a produzir cerca de 25% das emissões de dióxido de carbono (CO2).

Passados mais de seis anos, a questão ambiental tornou-se um tema preponderante. A perspectiva de desconforto das subidas de temperatura foi suplantada por três fontes principais de ansiedade: o degelo acentuado, na Gronelândia e nas calotes polares, pode levar à subida do nível da água do mar e inundará vastas zonas costeiras; a corrente do Golfo, já em perda de velocidade, poderá deixar de garantir a moderação do clima predominante nas zonas costeiras da Europa Ocidental; o aquecimento da tundra siberiana, um acumulador eficiente de gás metano, pode conduzir à sua libertação a um ritmo que agravará ainda mais o aquecimento global.

A "Verdade Incómoda" que Al Gore apresenta de forma convincente no seu recente documentário sobre alterações climatéricas veio consolidar a sua posição como percursor e aumentar a sua respeitabilidade à escala mundial. Políticos e empresários, como Richard Branson, da Virgin, vêm fazendo eco das suas posições e apelam à tomada de medidas urgentes. Mesmo nos EUA surge, de novo, como possível candidato às presidenciais de 2008.

A dificuldade de travagem do efeito humano das alterações climáticas resulta da natureza global do problema. Cada país, individualmente, pode adoptar uma atitude de "free rider", ou seja, pensar que se todos os seus vizinhos adoptarem políticas de contenção das emissões, extrai os benefícios correspondentes sem ter de suportar os custos decorrentes da redução do nível de emissões.

Felizmente há experiências de cooperação internacional bem sucedidas, mesmo no campo do controlo ambiental. O exemplo mais notável é o do protocolo de Montreal que eliminou a produção de frigoríficos com base em CFCs, uma substância destruidora da camada de ozono na atmosfera. A aceitação pelos países ricos de esforço unilateral, permitindo aos países pobres um prazo maior para a substituição dos CFCs e cedendo tecnologia em condições favoráveis permitiu evitar uma catástrofe iminente. No início, também este acordo foi encarado com cepticismo por parte dos países envolvidos.

Uma nova experiência, igualmente ousada, está em curso para travar o crescimento das emissões de CO2 – o Protocolo de Quioto. Também neste quadro os países ricos, principalmente europeus, o Japão e o Canadá, aceitam um modelo mais flexível para os países em desenvolvimento, em que as suas empresas podem vender direitos de emissão, mas é adiada a data de início de compromisso nacional de redução das emissões.

Anteriormente a Quioto, a questão ambiental era já considerada uma fonte de oportunidades para as empresas. No início dos anos 90, Michael Porter havia já identificado a estratégia "win-win" em que os benefícios resultantes das vendas e margens mais elevadas compensavam os custos suportados para reduzir a poluição provocada pelas empresas. Muitas empresas seguiram este conselho. A BP iniciou cedo a investigação em fontes de energia alternativas, como a solar, afirmando mesmo que as suas iniciais significavam "Beyond Petroleum" (para lá do petróleo) em vez de "British Petroleum".

A área ambiental tornou-se uma das principais fontes de oportunidades para empreendedores. Da reciclagem à conservação, da produção de energia renovável à plantação de florestas, numerosas actividades encontram hoje novas oportunidades de expansão e geração de rendimentos. As preocupações ambientais são susceptíveis de revolucionar todas as actividades económicas. A arquitectura pode produzir edifícios mais eficientes nalguns casos com saldo energético positivo; os transportes podem reduzir substancialmente os consumos e melhorar o seu prestígio como foi evidenciado pelos fabricantes de veículos híbridos; do mesmo modo, a banca e os seguros podem melhorar os seus resultados e evitar sanções económicas severas se privilegiarem o apoio a empresas e sectores com boas práticas ambientais. Finalmente, para os países, a sua praxis ambiental é relevante para a imagem e competitividade internacional. A Holanda era conhecida pelos moinhos, mas a Dinamarca construiu a sua reputação com base nos "moinhos" para produção de energia eólica. Portugal ainda tem uma das mais baixas emissões de CO2 da União Europeia. É imperioso construir um modelo de crescimento económico que preserve e tire partido dessa posição.

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