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22 de Julho de 2011 às 12:00

CGD - a solução para a crise financeira portuguesa?

Portugal tem actualmente um problema grave de financiamento externo. Tem na realidade uma série de problemas económicos mais profundos, relacionados com a falta de competitividade da economia. Mas esses só podem ser resolvidos a longo prazo. O problema do financiamento externo é mais simples e também mais urgente porque sem o ultrapassarmos dificilmente conseguiremos enfrentar os outros.

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O problema

A crise financeira do Sul da Europa começou em 2009 com o mercado a duvidar das contas dos Estados e da sua capacidade para pagarem as dívidas. Primeiro foi a Grécia com um grave problema de contas públicas; depois foi a Irlanda com uma situação complicada no sistema bancário; por último (para já) foi Portugal, porque teve o "azar" de ser o próximo elo mais fraco - não tanto pelo défice orçamental ou dívida pública acumulada, que não estão longe dos de outros países desenvolvidos, mas sim devido à baixa capacidade de crescimento económico, ao défice estrutural da Balança Corrente e à elevada dívida externa do sector privado.

Os investidores assustaram-se com as contas e Portugal deixou de se conseguir financiar no exterior. E a ideia de que "o mercado" quer especular à custa do nosso país é absurda. Quando o mercado nos pede um "spread" extravagante está na realidade a dizer que não nos quer emprestar.

Uma vez fechado o financiamento ao Estado, fecha também aos bancos, às empresas, aos particulares, e a economia corre o risco de parar. Caímos assim num círculo vicioso, em que a percepção de risco de falência dificulta o financiamento no mercado, o que por sua vez aumenta o risco real de falência e pode torná-la inevitável.

A solução

No passado já enfrentámos problemas semelhantes. As fragilidades estruturais da nossa economia trazem-nos recorrentemente a situações de dificuldade de financiamento.

Mas no passado a solução era mais simples. Havia o Escudo: o Banco de Portugal podia emitir moeda. "Monetizava-se" a dívida, gerava-se inflação, desvalorizava-se o Escudo e assim recuperávamos alguma competitividade externa, ao mesmo tempo que apertávamos o cinto à sombra da ilusão monetária.

Actualmente não temos moeda própria, nem Banco Central emissor, nem controlamos a inflação, nem a desvalorização cambial.

Mas temos um Banco Semi-Central (BSC) que se estivesse saudavelmente capitalizado poderia comprar, no limite, toda a dívida do Estado. Quais as vantagens de tal acção? (1) Tentava-se quebrar o círculo vicioso de falta de confiança dos investidores, reduzindo a pressão da oferta no mercado; (2) Comprava-se a dívida a desconto sem ter que reestruturar; (3) Injectava-se liquidez na economia, por via do desconto da dívida no Banco Central Europeu (BCE); e (4) Tudo feito dentro do quadro normativo existente: o aumento de capital do BSC é requerido pelos reguladores e a compra de dívida e desconto no BCE são procedimentos correntes do BSC.

Pode ser uma solução quase tão eficaz como imprimir moeda!

A nossa divida pública é de pouco mais de €150 mil milhões, pelo que se assumirmos uma "alavancagem" de 15 vezes estaríamos a falar de uma necessidade de capital no BSC de "apenas" €10 mil milhões.

A questão teórica de saber qual a utilidade económica para um país como o nosso de ter um banco estatal sempre me intrigou. Agora, finalmente, vejo-lhe uma enorme utilidade: é o nosso BSC. Enquanto contribuinte, ficaria satisfeito se o Estado reforçasse o capital da Caixa Geral de Depósitos (CGD), de modo a possibilitar a compra de dívida pública em maior escala, com uma "alavancagem" de 15 a 20 vezes e um desconto de 30%.

O ciclo vicioso de falta de confiança que nos atinge é difícil de ultrapassar. Mas penso que a "monetização" da dívida pela CGD, dentro das regras de Basileia e do BCE, pode ser parte da solução para quebrar esse ciclo e resolver o nosso problema de financiamento.

Caso não o resolva, o capital injectado na CGD continuará a fazer parte dos capitais próprios do Banco e poderá sempre ser devolvido ao Estado (excepto numa situação extrema de "default", mas mesmo nessa situação a compra de dívida a desconto oferece uma margem de segurança ao capital investido).

A resolução prévia da crise financeira parece-me uma condição necessária (embora não suficiente) para podermos enfrentar os problemas estruturais da nossa economia. Por outro lado, a presença de um parceiro externo, como a "Troika", que nos "obrigue" a tomar as medidas duras e impopulares que são necessárias, pode ser bastante útil.



Professor convidado da Nova School of Business and Economics

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