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17 de Março de 2008 às 13:59

Bom capitalismo, mau capitalismo

Muitas pessoas partiram do princípio, quando o Muro de Berlim caiu em 1989, que o “capitalismo” tinha ganho a Guerra Fria ideológica e que o “comunismo” tinha sido derrotado. No entanto, se bem que o “capitalismo” – definido como um sistema económico cria

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Julgamos ser útil dividir as economias capitalistas em quatro grandes categorias. Ainda que muitas economias conjuguem algumas destas categorias, a maioria enquadra-se essencialmente apenas numa delas. A tipologia que se segue ajuda a explicar o porquê de algumas economias crescerem mais rapidamente do que outras.

O capitalismo oligarca existe quando o poder e o dinheiro estão fortemente concentrados em meia dúzia de pessoas. É a pior forma de capitalismo, não só devido à extrema desigualdade de rendimentos e riqueza que esse tipo de economias permite, mas também porque as elites não promovem o crescimento como objectivo central da política económica. Em vez disso, os oligarcas estabelecem as regras que os ajudam a maximizar os seus próprios rendimentos e riqueza. Esses esquemas predominam em vastas regiões da América Latina, do Médio Oriente árabe e de África.

O capitalismo dirigido pelo Estado descreve economias em que o crescimento é um objectivo económico central (como acontece nas restantes duas formas de capitalismo), mas tenta alcançá-lo favorecendo empresas e indústrias específicas. Os governos atribuem crédito (através de bancos estatais ou orientando decisões de concessão de crédito tomadas por bancos de capital privado), atribuem subsídios directos e/ou incentivos fiscais, garantem protecção comercial ou recorrem a outros instrumentos regulatórios na tentativa de “seleccionarem vencedores”.

As economias do sudeste asiático demonstraram um enorme sucesso com o dirigismo estatal e, até finais da década de 90, surgiram apelos nos Estados Unidos para que se imitassem as suas práticas. Mas o calcanhar de Aquiles do dirigismo estatal é que, assim que essas economias se aproximam da “fronteira das possibilidades de produção”, os estrategas políticos ficam sem indústrias e tecnologias para imitar. Quando os responsáveis governamentais, em vez dos mercados, tentam seleccionar os vencedores que se seguem, correm um enorme risco de escolherem as indústrias erradas ou de canalizarem demasiado investimento – e, consequentemente, excesso de capacidade – para os sectores existentes. Essa tendência contribuiu significativamente para a crise financeira da Ásia de 1997-98.

O capitalismo das grandes empresas ou empresarial caracteriza as economias em que grandes empresas – frequentemente chamadas “símbolos nacionais” – dominam a produção e o emprego. Existem empresas de menor dimensão, mas são tipicamente do sector do retalho ou dos serviços, com apenas um ou poucos empregados. As empresas crescem por meio da exploração das economias de escala, aperfeiçoando e produzindo em massa as inovações radicais desenvolvidas por empreendedores (discutidos mais adiante). As economias da Europa Ocidental e do Japão são importantes exemplares do capitalismo empresarial que, como o dirigismo estatal, também apresentam uma sólida “performance” económica.

Mas o capitalismo empresarial também tem o seu calcanhar de Aquiles. As empresas burocráticas são, por norma, alérgicas a assumirem grandes riscos – ou seja, a desenvolver e comercializar as inovações radicais que impulsionam a fronteira da possibilidade de produção e que geram enormes saltos sustentados em matéria de produtividade e, consequentemente, em termos de crescimento económico.

As grandes empresas são relativamente avessas ao risco não só porque se tratam de burocracias, com vários níveis de gestão necessários para aprovar qualquer inovação, mas também porque não estão dispostas a apoiar inovações que tornem obsoletos os produtos ou serviços que actualmente são responsáveis pelos seus lucros. Na nossa perspectiva, os limites do capitalismo empresarial explicam por que razão é que, depois de se aproximarem dos níveis norte-americanos do rendimento per capita em finais dos anos 80, tanto a Europa Ocidental como o Japão foram incapazes de se equiparar ao ressurgimento da produtividade fomentada pelas tecnologias de informação nos EUA, que teve início na década de 90.

Isto conduz-nos ao quarto tipo: o capitalismo empreendedor. As economias em que o dinamismo provém de novas empresas têm comercializado, historicamente, as inovações radicais que continuam a impulsionar a fronteira da possibilidade de produção. Entre os exemplos dos dois últimos séculos incluem-se produtos e inovações transformadores, como as autoestradas, automóveis e aviões; telégrafo, telefones, rádio e televisão; ar condicionado, e, conforme já salientámos, as várias tecnologias responsáveis pela revolução nas tecnologias de comunicação, incluindo os computadores de grande porte e os computadores pessoais, “routers” e outros dispositivos de “hardware”, bem como grande parte do “software” que neles corre.

Não há dúvida que nenhuma economia consegue consumar o seu pleno potencial tendo apenas companhias empreendedoras. A combinação ideal de empresas contém uma saudável dose de grandes empresas, que dispõem de recursos financeiros e humanos para aperfeiçoarem e produzirem em massa as inovações radicais, a par com empresas mais recentes.

A título de exemplo, foi necessário que a Boeing e outros grandes fabricantes de aviões comercializassem o terreno que os irmãos Wright desbravaram, ou que a Ford e a General Motors produzissem automóveis em massa, e assim por diante. No entanto, sem empreendedores, poucas das inovações realmente ousadas que moldaram a nossa economia moderna e as nossas vidas estariam disponíveis.

Assim sendo, o desafio que se coloca a todas as economias que procuram maximizar o seu potencial de crescimento reside em encontrar a combinação correcta de capitalismo empresarial e empreendedor. As economias nas quais os empreendedores começam agora a florescer não devem tornar-se complacentes. As economias dirigidas pelo Estado podem manter a sua rota de crescimento acelerado, mas acabarão por ter de fazer uma transição para uma mistura compatível com as outras duas formas de “bom capitalismo” se quiserem continuar a crescer de forma rápida.

A Índia e a China, cada uma à sua maneira, já estão a caminhar nessa direcção. O maior desafio estará nas economias atoladas no capitalismo oligarca, que terão mais dificuldades em conseguir uma transição desse tipo. Poderá exigir uma revolução – idealmente pacífica, é claro – que substitua as elites que neste momento dominam essas economias e sociedades e para as quais o crescimento não é a meta central.

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