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Opinião
03 de Junho de 2009 às 12:02

A ressaca eleitoral para lá de Sócrates e Manuela

Gordon Brown vai ser um dos maiores perdedores das eleições desta semana nos 27 e o descalabro trabalhista no Reino Unido augura o pior para o Tratado de Lisboa e as relações entre Londres e os parceiros europeus...

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Gordon Brown vai ser um dos maiores perdedores das eleições desta semana nos 27 e o descalabro trabalhista no Reino Unido augura o pior para o Tratado de Lisboa e as relações entre Londres e os parceiros europeus.

A única dúvida que sobra das sondagens é saber se o Partido Trabalhista acaba ultrapassado pelos Democratas-Liberais de Nick Clegg e até que ponto um eleitorado exasperado com a recessão e os abusos de dinheiros públicos pelos deputados de Westminster acabará por dispersar-se a favor dos Verdes de Caroline Lucas, do United Kingdom Independence Party, que deplora a participação na UE, e dos candidatos de extrema-direita do British National Party.

As votações simultâneas para 34 concelhos locais em Inglaterra também nada indiciam de bom para os trabalhistas, que, na expectativa de uma participação nas eleições europeias na ordem dos 38%, tal como em 2004, se arriscam a quedar-se com pouco mais de 20% dos votos.

A confirmarem-se os piores augúrios, uma votação inferior a 20%, os dirigentes trabalhistas terão de considerar a séria possibilidade de nas eleições legislativas de 2010 correrem o risco de uma derrota comparável à bancarrota de 1983, quando Margaret Thatcher arrebatou 42% dos votos contra apenas 28% de Michael Foot.

Brown já era e Cameron complica
A derrota anunciada de Brown porá em causa a sua intenção de promover uma reforma constitucional, mas a deplorável situação dos trabalhistas levará, provavelmente, muitos rivais a ponderarem duas vezes antes de tentarem derrubar o líder ou sequer apoiarem a convocação de eleições legislativas antecipadas.

Nem a remodelação do governo, que poderá custar o lugar ao ministro das finanças Alistair Darling, também apanhado no escândalo de despesas fraudulentas, deverá ser suficiente para dar novo ímpeto aos trabalhistas, que se encontram presentemente a cerca de 20 pontos de distância dos conservadores nas intenções de voto.

A magna questão que importa tanto quanto o que aconteça em Portugal ou na Alemanha tem, entretanto, a ver com uma declaração inopinada do mais que provável próximo primeiro-ministro britânico.

David Cameron fez um discurso radical a 26 de Maio que nem levantou muitas ondas, tal é a desconfiança corrente entre a opinião pública britânica face aos alegados malefícios de Bruxelas.

O líder conservador anunciou, no entanto, uma viragem radical na atitude dos "Tories" em relação à União Europeia.

Até então, o Partido Conservador tinha-se limitado a prometer um referendo caso o Tratado de Lisboa não tivesse entrado em vigor à data em que chegasse ao poder, o que levaria, na previsível vitória de eurocépticos e eurofóbicos, à anulação da ratificação britânica.

Agora, Cameron, que tem excelentes hipóteses de pôr termo ao ciclo trabalhista iniciado com a vitória de Tony Blair em Maio de 1997, assevera que é imperioso reverter para o Reino Unido os poderes alienados a favor da União Europeia.

O líder conservador assegura, taxativo, que, em qualquer circunstância, convocará um referendo sobre o Tratado de Lisboa, exigirá aprovação referendária de eventuais alienações de poderes nacionais, promoverá um escrutínio detalhado no Parlamento das regulamentações da EU e da aplicação dos orçamentos de Bruxelas, além de reforçar os poderes dos juízes britânicos face à legislação europeia.

Com esta declaração inopinada, Cameron meteu-se numa camisa de sete varas que lhe deixa escassa margem de manobra.

Londres a léguas de Bruxelas
Na mais que provável hipótese de chegar ao Nº 10 de Downing Street, o líder conservador ou cumpre a sua promessa e entra em confronto com os parceiros europeus, ou então renega as declarações e sujeita-se de imediato às críticas da ala maioritária de eurocépticos e eurofóbicos entre os conservadores britânicos, o que em qualquer circunstância é vendaval garantido.

Mesmo que o referendo irlandês em Outubro aprove o Tratado de Lisboa, que o Tribunal Constitucional de Karlsruhe não levante objecções à ratificação pelo parlamento alemão, e que os presidentes Lech Kaczynski e Vaclav Klaus assinem os compromissos da Polónia e da República Checa, a reforma institucional da União bem pode encalhar nas costas britânicas.
Assunto de somenos, nunca falado por cá.

Coisa tremenda que poderá dar cabo do que se aventa por terras portuguesas e um destes dias, de repente, sem que se tenha reparado muito nisso, fica em causa o que Vital, Rangel, Sócrates e Manuela davam por assegurado.


Jornalista
barradas.joaocarlos@gmail.com
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