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Opinião
05 de Junho de 2012 às 23:30

A quinta dimensão da guerra

O acerto da discussão pública dos méritos estratégicos e operacionais de acções secretas ofensivas no espaço digital – independentemente das suas vertentes de desinformação – é muito duvidoso.

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Uma campanha de condicionamento do eleitorado e de decisores aliados e inimigos da Casa Branca tem vindo a promover fugas concertadas de informação sobre acções dos seus serviços secretos que, por definição, não devem ser objecto de discussão pública.

No intuito de reforçar a imagem de Obama como presidente sem pejo em recorrer à força, altos responsáveis da administração civil e militar reforçaram este ano os esforços para elucidar a alegada eficácia e acerto de duas vertentes essenciais da estratégia de segurança dos Estados Unidos.

O programa de assassinato de suspeitos de terrorismo com recurso a veículos aéreos não-tripulados e operações ofensivas de guerra digital são apresentados como um legado da administração Bush que Obama desenvolveu e alargou com claro êxito.

Deixando na sombra programas de militarização do espaço -- outra dimensão vital que na segunda metade do século XX veio ampliar as tradicionais frentes de combate terrestres, marítimas e aéreas – a Casa Branca centrou mais recentemente os seus esforços de propaganda e desinformação na guerra cibernética.

Para contenção de danos, intimidação e desorientação de adversários os EUA assumiram oficiosamente a responsabilidade pelo lançamento do vírus "Stuxnet" desenvolvido a partir de 2006 em parceria com Israel.

O sucesso do programa que atacou, aparentemente a partir de 2008, as centrifugadoras da central de Natanz teria alegadamente atrasado o programa nuclear iraniano por um período de 18 a 24 meses.

Outras informações indiciam, contudo, que Teerão recuperou rapidamente dos danos acelerando o programa de enriquecimento de urânio.

A propagação do vírus no espaço digital, no Verão de 2010, levou à identificação do seu código e abriu a porta a eventuais usos por organizações terroristas ou criminosas.

A complexidade do "Stuxnet", concebido para provocar avarias a componentes específicos de um sistema computorizado de controlo de processos industriais, levou os especialistas a concluírem tratar-se de um projecto da responsabilidade de um estado.

No final de Maio, tornou-se entretanto pública a existência de um novo programa de complexidade ainda maior que só poderia ser desenvolvido por um estado ou por raras empresas especializadas de grande dimensão.

O "Flame" visa a espionagem por controlo remoto directo e destruição de dados e estará activo há pelo menos dois anos em computadores de instituições da indústria petrolífera do Irão.

O vírus foi igualmente referenciado noutros países, de Israel à Hungria, passando pelos Estados Unidos, Sudão ou Reino Unido, e a sua origem e controladores não foram identificados.

O programa poderá ter sido activado a partir de 2008 e apresenta tal complexidade que o seu desenvolvimento teria necessariamente de implicar centros especializados de países como a Alemanha, Reino Unido, Japão, Taiwan, China ou Rússia, apesar das suspeitas recaírem sobre os Estados Unidos e Israel.

Desta feita, apesar de algumas fugas de informação desencontradas apontarem nesse sentido, Washington não assumiu oficiosamente a responsabilidade pela difusão de um vírus com um código relativamente fácil de copiar por especialistas em informática e cuja proliferação pode ter efeitos altamente funestos.

O facto de o Irão – que requeriu assistência à "União Internacional de Telecomunicações", agência especializada da ONU, para identificar o "Flame" – ter sido alvo dos principais ataques dá credibilidade às suspeitas de que os EUA estão envolvidos.

O acerto da discussão pública dos méritos estratégicos e operacionais de acções secretas ofensivas no espaço digital – independentemente das suas vertentes de desinformação – é muito duvidoso.

As vantagens políticas e eleitorais que Obama possa retirar de acções de propaganda sobre vertentes clandestinas de acções letais e de ataques a sistemas informáticos são irrelevantes perante as percepções que se possam vir a criar acerca do activismo militar cibernético dos EUA.

A dimensão digital da guerra tem vindo a aumentar desde a invasão do Iraque, em 2003, até ao conflito russo-georgiano de 2008, passando por operações promovidas por organizações terroristas e hackers ao serviço de diversos estados, e levanta questões de difícil resolução.

O risco de ataques em cascata a sistemas computorizados de infra-estruturas civis a nível nacional e internacional é elevadíssimo, a identificação atempada do atacante impossível, a definição de agressão é vaga, os termos de retaliação estão indefinidos e faltam tratados internacionais sobre a codificação da dimensão digital da guerra.

Nas areias movediças da guerra digital é má política assumir acções ofensivas que se deveriam manter "sub rosa" até porque arruina as vantagens da ambiguidade estratégica, prejudica negociações diplomáticas e inquina irremediavelmente a confiança entre estados.



Jornalista
barradas.joaocarlos@gmail.com
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