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A ascensão dos BRIC

Os vencedores do grande impulso na globalização durante a década de 90 foram pequenos Estados, como a Nova Zelândia, Chile, Dubai, Finlândia, Irlanda, Repúblicas Bálticas, Eslovénia e Eslováquia. Os “tigres” do Leste Asiático que se expandiram por iniciat

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Mesmo a Coreia do Sul, que é um gigante em termos comparativos, era só metade de um país.

Este tipo de territórios apresenta vulnerabilidades e o passado está cheio de exemplos de globalizadores pequenos e bem sucedidos que perderam oportunidades devido à política do poder: as cidades-Estado italianas do Renascimento, a República Holandesa ou, já no século XX, o Líbano e o Koweit. Os Estados pequenos tornam-se frequentemente vítimas de vizinhos de maior dimensão, mas mais pobres, que invejam o seu sucesso e estão desejosos de se apoderar dos seus recursos, esquecendo que essa confiscação, na verdade, acaba por destruir a fonte de riqueza e dinamismo.

No mundo da pura globalização, os Estados pequenos saem-se melhor porque são mais flexíveis e são capazes de se adaptar mais facilmente aos mercados em constante mudança. Os Estados de pequena dimensão têm um melhor desempenho ao nível dos ajustamentos políticos, da liberalização dos mercados de trabalho, do estabelecimento de uma estrutura de concorrência sólida e da facilitação de fusões e aquisições transfronteiriças.

A urgência de uma estrutura desse tipo foi enfatizada numa recente análise sobre o fraco desempenho das grandes economias da Europa Continental – França, Alemanha e Itália – por comparação com as economias mais pequenas e muito mais dinâmicas do Norte e Centro da Europa. Ao mesmo tempo, os Estados pequenos também mostram mais probabilidades de serem bem sucedidos na defesa de muitos aspectos cruciais do Estado-Previdência.

Um Estado de maior dimensão consegue, inevitavelmente, controlar melhor a economia e, dessa forma, está exposto à dispendiosa tentação de intervir em resposta a pressões políticas por parte de interesses instalados. Numa estrutura de Estado pequeno, a imposição de uma densa rede de controlo poderá levar à perda dos factores de produção móveis, ao passo que num Estado grande é mais difícil que o trabalho ou o capital fujam.

No palco internacional, os Estados de grande dimensão tentam criar normas internacionais e, muitas vezes, constroem a sua legitimidade interna baseados no pretexto de terem de ser capazes de moldar um mundo mais vasto: pensam em termos de “globalização armada”, como lhe chamam os pensadores franceses. Em vez de aceitarem o sistema internacional tal como ele é, com todas as suas imperfeições, aqueles Estados acham que podem usar do peso que têm para alterar as regras – a seu favor.

O nervosismo e receios dos Estados pequenos começou a aumentar em torno do ano 2000. As novas realidades políticas eram ressaltadas pela Guerra no Iraque, pela procura – por parte da China – de fontes de energia nos países em desenvolvimento e pela assertividade da Rússia em termos de política doméstica e estrangeira.

No mundo actual, parece que os novos vencedores são os grandes Estados, densamente povoados e em rápido crescimento: Brasil, Rússia, Índia e China (BRIC), além dos Estados Unidos. Estes dinâmicos gigantes apavoram as populações abastadas do mundo industrializado devido ao seu poder potencial no que diz respeito à concorrência de baixo custo, produtos baratos e subcontratação de serviços.

Os BRIC (talvez devêssemos reformular a tradução da sigla para “Big and Really Imperial Countries”) projectam o poder mais facilmente, mas também precisam de projectar esse poder para compensarem as suas fragilidades. Eles têm os seus próprios problemas, mas, ao mesmo tempo, têm mais propensão para agir como típicos grandes Estados e tentarão moldar a globalização em vez de simplesmente a aceitarem como um processo inevitável.

Existem, pelo menos, três falhas óbvias que afligem muito mais estes grandes globalizadores do que os pequenos globalizadores que anteriormente se saíram tão bem. Em primeiro lugar, os países com uma forte densidade populacional devem integrar a sua classe baixa, constituída por pessoas pobres e com fracos índices de alfabetização (essencialmente, os meios rurais da China e Índia), enquanto participam nos mercados mundiais.

Em segundo lugar, a China e a Rússia têm sistemas financeiros onde impera a falta de transparência, ao passo que o Brasil e a Índia são financeiramente subdesenvolvidos, colocando em risco o processo de maior integração na economia mundial e aumentando as hipóteses de uma crise financeira.

Em terceiro lugar, a Rússia já está a braços com um forte declínio demográfico e uma população envelhecida e doente; a China, por seu lado, depara-se com a quase certeza de uma inversão de tendência demográfica, como a do Japão, a partir de 2040, um legado tardio da sua política que defende apenas um filho por casal.

Os imperfeitos gigantes geopolíticos têm sido, no passado, uma fonte de instabilidade (a Alemanha de antes da Primeira Guerra Mundial é uma analogia óbvia) e há boas razões para considerarmos que apresentam um risco ainda maior no século XXI. Mas, de momento, são inquestionavelmente poderosos.

O resultado é que os BRIC, em compensação, vão procurar poder, bem como influência e prestígio militar e estratégico, como uma forma de resolverem os seus problemas internos. Já há muito que passou a década de 90, quando por breves momentos, logo a seguir ao final da Guerra Fria, parecia que o mundo iria ficar em permanente estado pacífico, sem preocupações com o poder.

A esperança de que as coisas assim continuassem cedo se revelou ilusória. Com efeito, muitos comentadores ficaram estupefactos com a rapidez com que as tensões regressaram ao sistema internacional. Se bem que muitos culpem o comportamento dos Estados Unidos por isso, o facto é que estas tensões foram desencadeadas pelo desenvolvimento de uma nova lógica de política internacional.

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