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Porque é que muitos chefes são incompetentes (e o que fazer a esse respeito)

Na gestão, bem como noutras relações interpessoais, devemos evitar uma superioridade ilusória e procurar feedback. Devemos enfatizar o auto-aperfeiçoamento em oposição à auto-afirmação. E, tal como Sócrates, assumir “Só sei que nada sei”. 

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É um bom profissional e o seu chefe simplesmente não sabe tanto como você. Não recebe muito apoio e não é gerido de forma eficaz. Já alguma vez sentiu que o seu chefe é incompetente?

A percepção de uma gestão incompetente tem uma certa lógica. Permita-me falar do Princípio de Peter, assim chamado por causa do sociólogo Laurence Peter que, na década de 1960, postulou que os colaboradores dentro de uma organização serão promovidos e ascenderão até atingirem um nível que excede as suas capacidades. Existem outros, anteriores a Peter, que fizeram observações semelhantes. Por exemplo, o filósofo espanhol José Ortega y Gasset afirmou, em 1910: “Todos os funcionários públicos devem ser despromovidos para o seu nível imediatamente inferior, pois foram promovidos até se tornarem incompetentes.”

O Princípio de Peter é frequentemente expresso da seguinte forma: “Numa hierarquia, cada funcionário tende a subir para o seu nível de incompetência”, o que leva a um corolário: “Com o tempo, cada posto tende a ser ocupado por um profissional que é incompetente para desempenhar as suas funções.” Assim, a incompetência parece estar enraizada no sistema da hierarquia empresarial.

Kelly Shue, professora da Universidade de Yale, estudou recentemente esta tendência entre um grupo de vendedores. Na análise de dados de RH sobre vendedores de mais de 130 empresas, Shue encontrou evidências impressionantes de que os vendedores com melhor desempenho tinham muito mais probabilidades de serem promovidos a uma função de gestão. No entanto, como gestores de vendas, estes já não estavam directamente envolvidos nas vendas e eram, na realidade, piores gestores. Portanto, a teoria parece quase infalível.

As empresas sentem pressão para promover em função do desempenho actual, por duas razões, pelo menos: a primeira, porque a política de promoção funciona realmente no sentido de incentivar os colaboradores a trabalharem mais arduamente; e a segunda, porque há provas de forte desmotivação se as empresas se desviarem desta política e promoverem um colaborador com um desempenho menor, por acreditar que essa pessoa tem, de facto, mais potencial de gestão. A investigação mostra que, nestes casos, os melhores vendedores ficam, de facto, desmotivados, diminuem o seu desempenho, e são mais propensos a abandonar a empresa.

O tema da incompetência não é novo. Um dos exemplos mais antigos é o do sistema imperial chinês. Durante milhares de anos, a China seleccionou os seus funcionários com base num exame de mérito. O problema residia no facto de o exame se basear no conhecimento e na capacidade de escrever poesia clássica, entre outras coisas. Assim, a pessoa que obtivesse a pontuação mais alta seria colocada no papel de administrador fiscal ou cobrador de impostos. Apesar de o exame avaliar uma verdadeira competência, esta não era necessariamente compatível com o desejável para a função que estas pessoas deveriam preencher.

Como é que as organizações reagem ao problema do Princípio de Peter? Algumas empresas (especialmente escritórios de advogados e empresas de consultoria) têm adoptado estratégias de “subir ou sair” – os colaboradores que não progridem são despedidos. Pretende-se assim que se alcance uma posição e um bom desempenho dentro de um determinado período de tempo. Se não conseguirem cumprir, os colaboradores devem abandonar a organização.

Uma solução não tão severa como o despedimento daqueles que não evoluem foi proposta por Tom Griffiths, um professor de Psicologia da UC Berkeley. Griffiths propõe uma hierarquia “dinâmica”, na qual os funcionários são regularmente promovidos, mas em que os trabalhadores que atingem o seu ponto de fracasso na nova posição são retirados dessa posição e transferidos para uma área onde são produtivos.

Parte do problema da incompetência nasce também de uma espécie de mito em torno da necessidade de estar sempre certo, quando se está numa posição de gestão. Mas, gerir não significa estar sempre certo. Trata-se de ouvir todas as pessoas à sua volta, tomar decisões, e seguir em frente tendo tomado todas essas opiniões em consideração.

Em última análise, a gestão é algo que pode ser aprendido. A educação executiva ajuda efectivamente a elevar o nível de competência dos profissionais que assumem posições de gestão. Na Porto Business School, todos os anos formamos centenas de profissionais que são suficientemente sensatos para reconhecer que precisam de competências adicionais em gestão. Ao fazê-lo, ajudamo-los, e às suas organizações, a evitar o Princípio de Peter.

Mas, para além do Princípio de Peter, há possivelmente outro factor em jogo: o chamado efeito Dunning-Kruger, ou seja, a noção de que as pessoas incompetentes tendem a não saber que são incompetentes e a sobrestimar a sua capacidade. Este enviesamento foi observado pela primeira vez por David Dunning e Justin Kruger da Universidade de Cornell, em 1999. Houve vários estudos sobre o que as pessoas acreditam sobre a sua própria competência. Os resultados são alarmantes. Por exemplo, um estudo de empresas de alta tecnologia descobriu que cerca de 1/3 dos engenheiros de software classificaram as suas competências como estando entre os primeiros 5% dos trabalhadores das suas empresas. Num outro exemplo, a Bain & Company pesquisou 362 empresas, e descobriu que 80% acreditavam que proporcionavam uma “experiência superior” aos clientes. Mas quando perguntaram aos seus clientes, estes acreditavam que apenas 8% estavam realmente a proporcionar uma experiência superior.

Assim, muitas pessoas tendem a acreditar demasiado em si próprias. Elas sofrem de “superioridade ilusória”. De facto, podem nem sequer saber que são incompetentes porque lhes falta o conhecimento necessário para compreenderem que lhes falta competência. A cultura ocidental moderna tem-nos encorajado a acreditar em nós próprios, a ter confiança nas nossas próprias capacidades. Isto significa depositar muita fé nas coisas em que acreditamos e, muitas vezes, à custa da fé em outras pessoas. Se tivéssemos mais fé nos outros, iríamos procurar o seu conselho, e eles poderiam ajudar-nos a descobrir os erros que temos. Mas não somos bons a dar ou receber feedback, nem a procurar feedback em primeiro lugar. Portanto, se os nossos erros são invisíveis para nós, mais cedo ou mais tarde enfrentaremos uma crise e estaremos em apuros.

Na gestão, bem como noutras relações interpessoais, devemos evitar uma superioridade ilusória e procurar feedback. Devemos enfatizar o auto-aperfeiçoamento em oposição à auto-afirmação. E, tal como Sócrates, assumir “Só sei que nada sei”. 

Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico

 

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