Opinião
Como fazer uma previsão de vendas
Muitas vezes, uma falha nas previsões "mata" as "startups". Os promotores ficam a pensar que não vai ser necessário mais capital, quando na verdade isso não acontecerá na maior parte dos casos.
Construir uma previsão de vendas é talvez uns dos exercícios mais abstractos numa empresa. Como é habitual dizer-se "o excel aguenta tudo", ou seja, qualquer previsão de vendas é possível, no entanto quase sempre as mesmas falham na realidade. Seja para reportar ao seu chefe ou para apresentar a um potencial investidor, uma previsão de vendas serve muitas vezes para estimar as receitas que se conseguem alcançar num determinado período de tempo, por forma a identificar a viabilidade do negócio face aos custos que este tem. Serve igualmente para prever se é possível amortizar alguns dos investimentos necessários para expandir o negócio.
A grande questão é como calcular essa previsão de vendas da forma mais realista possível. Para além das duas formas de cálculo que vamos ver neste artigo, temos ainda os factores externos, ou seja os factores económicos, novos concorrentes, etc.
Vamos então exemplificar duas formas de calcular uma previsão de vendas: a de "cima para baixo", e a de "baixo para cima". Comecemos pela primeira para determinar, através de um simples exemplo, qual a previsão que o João faria para o seu negócio de venda de sapatos em Portugal pela internet:
. Existem cerca de 10 milhões de pessoas em Portugal;
. 1% dessas pessoas compram sapatos pela internet em Portugal, ou seja 100.000 pessoas;
. Pretendemos chegar a 10% desse mercado, ou seja 10.000 pessoas;
. Estimamos que cada comprador gaste em média 120€ em sapatos por ano, o que resulta em 1,2 milhões de euros em vendas anuais;
Como exemplo de previsão de vendas de cima para baixo, é fácil alcançar um número, mas este é talvez um dos mais enganadoras, pois mesmo que pense que 0,1% do mercado é pouco (10% de 1%, ou seja as 10.000 pessoas), pode estar enganado, pois tudo depende do esforço e capacidade comercial/marketing disponível para realmente atingir esse 0,1%. Verá que não é assim tão fácil, nem tão barato, por isso se é uma startup e começa a fazer previsões de cima para baixo diria que a probabilidade de errar é de 99%.
Vamos ver o mesmo exemplo ao contrário, ou seja, de baixo para cima e comparar os resultados:
Porque o seu site de venda de sapatos não é conhecido, pois acaba de inaugurar a sua empresa, terá de associar um esforço para comunica-lo ao cidadão. Vamos imaginar que esse esforço traduz-se numa campanha telefónica através de uma base de dados de clientes que tem por hábito comprar produtos por internet.
. Como promotor do seu negócio provavelmente será você sozinho a fazer as chamadas pois não tem capital para pagar a alguém para as fazer por si. Assim sendo determina que consegue realizar 30 chamadas por dia;
. Considerando que o ano tem 240 dias de trabalho efectivo, temos 7.200 chamadas/pessoas com quem falou num ano;
. Assumindo que consegue conquistar, em vendas, 5% do total de pessoas contactadas, significa que conseguiu 360 clientes num ano;
. Tendo por base o mesmo valor médio do exemplo anterior, temos 120€ em sapatos por ano multiplicados por 360 clientes, ou seja 43.200€ em vendas anuais.
Ainda temos aqui algumas variáveis que estamos a assumir, como a percentagem de sucesso nas chamadas (5%), o valor médio de venda, etc, mas o que pretendemos ilustrar é que o modelo de baixo para cima é bem mais realista pois está associado à sua capacidade de penetração no mercado, o que será o factor critico quando o seu negócio não é largamente conhecido.
Podemos determinar que afinal o João conseguiu identificar uma diferença enorme entre as duas previsões de vendas. A de cima para baixo que apresenta 1,2 milhões de euros em vendas, e a de baixo para cima com 43.200€ em vendas, ambas no período de um ano.
Não querendo ser pessimista, o João poderia vir a iludir-se quanto às perspectivas de crescimento do seu negócio recorrendo à primeira previsão de vendas. Sendo mais realista o mesmo deverá pensar que no primeiro ano só deverá contar com uma receita de 43.200€. Partindo desse pressuposto poderá identificar se consegue manter o negócio vivo no primeiro ano de actividade sem injecções suplementares de capital, o que provavelmente não será possível, pois este valor é de vendas e não de lucro, ou seja iria obter uma liquidez muito baixa para fazer face às suas despesas, pelo que lhe levaria a uma necessidade de capital extra no primeiro ano. Afinal aquilo que parecia muito promissor para o João transformou-se numa dificuldade na superação do seu primeiro ano de negócio. É muitas vezes esta falha de previsões que "mata" as startups, pois os seus promotores ficam a pensar que não vai ser necessário mais capital, quando na verdade isso não acontecerá na maior parte dos casos.
2. Tenha em atenção os factores externos do mercado. Nunca saberá se não vai existir um novo concorrente ou, mesmo, uma crise económica que vai atrasar o seu crescimento.
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*Fundador da Zonadvanced e Bluegrana Capital Corporation