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15 de Setembro de 2014 às 00:01

Os líderes como energizadores

Líderes sem energia interior não podem usar um recurso psicológico que não têm para contagiar os outros. Donde a questão: o que me motiva/energiza, de modo a que eu mesmo possa energizar os outros?

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1. No livro Catástrofe, Max Hastings conta a seguinte história. Um dia, em agosto de 1914, na frente ocidental da I Guerra Mundial, em França, o major de cavalaria britânico Tom Bridges encontrou dois batalhões ingleses desmobilizados e prontos a entregarem-se aos alemães. Os seus comandantes tinham inclusive redigido uma carta que haviam de entregar aos seus futuros captores. Furioso, Bridges conseguiu recuperar a carta. A seguir tratava-se de remobilizar um grupo de homens que já havia desistido de lutar. O desafio não se afigurava fácil, dadas as agruras a que eram submetidos os soldados na frente ocidental, tratados como carne para canhão. Aqueles homens, decidiu, precisavam de uma banda. Nenhum regimento decente poderia deixar de ter uma banda. Na ausência de uma banda a sério, Bridges fez uso dos seus dotes de bricoleur e dirigiu-se à loja de brinquedos da cidade onde comprou instrumentos infantis: uma flauta e um tambor, com os quais ele e o seu corneteiro tocaram duas marchas militares tradicionais. Os homens reagiram da forma esperada: começaram por se rir mas acabaram seguindo o comandante.

 

O episódio é revelador da importância da criatividade no uso e reinvenção de recursos. É claro que o ideal seria dispor dos recursos necessários para fazer o trabalho da melhor maneira. Mas já se sabe que entre o ideal e o possível vai uma diferença por vezes assinalável. O dilema do major Bridges não difere do de muitos gestores: como pôr as "tropas" a marchar com instrumentos de brincar?

 

 

2.  Mas o episódio revela outra faceta: que o papel dos líderes consiste em energizar as suas equipas. A noção de energia psicológica nas organizações foi explorada pelo falecido Sumantra Ghoshal, um dos vultos da teoria da gestão em finais do século XX. Ghoshal descreveu a motivação como uma forma de energização: pessoas motivadas são aquelas que querem fazer as coisas, que colocam a sua energia psicológica ao serviço da organização. Desde então muitos outros investigadores têm explorado o tema, revelando as suas múltiplas facetas. O seu trabalho permitiu chegar a várias conclusões, de que se destacam três. Antes de mais os líderes têm de gerir a forma como usam a sua própria energia. A falta de "carregamento" (i.e. descanso) pode ter efeitos nefastos. Por outro lado, a energia depende criticamente da qualidade dos relacionamentos: bons relacionamentos humanos são uma fonte de energia. Ou seja: a energia é contagiosa. Cabe por isso a quem lidera criar as interações certas. Finalmente, se os líderes retiram energia ao sistema estão a fazer mal o seu papel, pois que lhes cabe a tarefa de energizar e não a de des-energizar. Muitos sistemas organizacionais são energicamente carentes, inertes, vazios de propósito e de entusiasmo.     

 

Como ilustrado pelo caso do major Bridges, o mais importante para enriquecer o estado motivacional de um sistema é a condição motivacional dos líderes. Líderes sem energia interior não podem usar um recurso psicológico que não têm para contagiar os outros. Donde a questão: o que me motiva/energiza, de modo a que eu mesmo possa energizar os outros?          

 

 

Para continuar a explorar o tema:

 

Quinn, R.W., Spreitzer, G.M. & Lam, C.F. (2012). Building a sustainable model of human energy in organizations: Exploring the critical role of resources. Academy of Management Annals, 6(1), 337-396.

 

Professor na Nova School of Business and Economics

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.

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