Opinião
Motivar com objetivos impossíveis
Escreveu Camões que: "Coisas impossíveis, é melhor esquecê-las que desejá-las." Faz sentido.
E, no entanto, no mundo dos negócios, vários executivos de elevado perfil começaram a apregoar o contrário: que a melhor maneira de escapar ao normal é através da definição de objetivos impossíveis, extraordinários.
Um desses executivos foi Jack Welch, o mítico CEO da GE. Que Welch foi, ele próprio, um extraordinário gestor, parece fora de questão. Que as coisas, em geral, provaram as suas razões, também. Charles Duhigg, do The New York Times, conta a história da adoção de objetivos "stretching" no seu novo livro "Smarter, Faster, Better". A inspiração terá vindo do desenvolvimento do "shinkansen", o comboio-bala japonês, inicialmente um projeto impossível. Welch aplicou a mesma receita na GE com resultados particularmente interessantes e inovadores na GE Aviation. Na Southwest Airlines, a mesma lógica foi adotada num momento de vida ou de morte para a então pequena companhia aérea. De novo com resultados impressionantes. Mais recentemente, Steve Jobs fez da Apple um terreno de concretização de impossibilidades: o seu campo de distorção da realidade ajudava a tornar o impossível possível.
A definição de objetivos impossíveis, todavia, colide com décadas de investigação sobre definição de objetivos: porque haveriam as pessoas de se esforçar para alcançar algo que não é alcançável? Trata-se de um boa pergunta. Quando recorrer a objetivos impossíveis? O trabalho de Sitkin e seus colegas mostra que este tipo de objetivos tem tipicamente aplicação numa gama muito estreita de casos: quando a organização dispõe de recursos para gastar com inovação e quando tem um passado recente de sucesso. Nem todos os casos de sucesso, todavia, se compaginam com esta explicação teórica, mas compreende-se o argumento: pôr as pessoas atrás do impossível exige boas doses de autoconfiança e recursos para experimentar formas muito diferentes de fazer as coisas.
Em muitas ocasiões, a busca do impossível, porém, não conduz a lado nenhum: a Nokia, já acossada pelos seus rivais, ter-se-á entregue às promessas das missões impossíveis - que nesse caso fizeram jus ao nome. Ou seja, em vez de querer mudar tudo de uma vez, parece mais avisado mudar sempre, mas pouco de cada vez. Camões não foi um guru da gestão, mas defende um bom ponto.
Para continuar a explorar o tema:
Duhigg, C. (2016). "Smarter, Faster, Better". London: Penguin.
Sitkin, S.B., See, K.E., Miller, C.C., Lawless, M.W. & Carton, A.M. (2011). "The paradox of stretch goals: Organizations in pursuit of the seemingly impossible." Academy of Management Review, 36(3), 544-566.
Professor na Nova School of Business and Economics
Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico