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Luís Marques Mendes 11 de Dezembro de 2022 às 21:43

CDS, PSD e PS: "Três partidos que deviam ter mais cuidado com as escolhas que fazem"

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre a prestação da seleção nacional no mundial do Qatar, as cheias em lisboa, a lei da eutanásia e a investigação por corrupção no Ministério da Defesa.

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A SELEÇÃO E O MUNDIAL

 

  1. Primeiro apontamento: o balanço. Há 4 anos, no Mundial da Rússia, "caindo" nos oitavos de final, Portugal teve uma atuação medíocre. Desta vez não é medíocre. Mas não fica na história. Fica a sensação de que "caímos" mal. De que, perante um adversário acessível, só jogámos 45 minutos. Não jogámos a primeira parte. Numa palavra: uma grane desilusão. Podíamos e devíamos ter feito melhor!

  1. Segundo apontamento: a prestação de Fernando Santos. O nosso selecionador é um mal-amado. Os portugueses não apreciam Fernando Santos como treinador. Mas ele esteve globalmente bem neste Mundial. No caso Ronaldo, o selecionador foi corajoso e responsável. Nas conferências de imprensa mostrou ser direto, pedagógico e frontal. No plano do jogo, suceda o que suceder, Fernando Santos já tem um lugar de destaque no futebol nacional: campeão europeu e vencedor da Liga das Nações.

 

  1. Terceiro apontamento: Fernando Santos vai sair ou continuar como selecionador? É um dilema sério. Se Fernando Santos sair agora, pode ficar a sensação de que sai por causa da pressão de Ronaldo. Se ficar, vai ter dois anos de calvário. Primeiro, em "guerra civil" com Ronaldo. Acabou a paz entre ambos. Depois, em "conflito" com a opinião pública.

 

  1. Quarto apontamento: o caso Ronaldo e a facilidade com que no futebol se passa de "bestial a besta". É verdade que Ronaldo cometeu um erro grave no Portugal-Coreia. E é claro que Ronaldo não está a saber lidar com o fim da sua carreira. Mesmo assim, é muito injusta a forma como tem sido tratado nos últimos dias. É de enorme ingratidão. Cristiano Ronaldo deu a Portugal, anos a fio, muitas vitórias, muitas alegrias e muito prestígio. É um caso único e irrepetível. Importa ter respeito e gratidão pelo homem e pelo atleta.

 

AS CHEIAS EM LISBOA

 

  1. Primeiro, uma má notícia. A Proteção Civil falhou. Não avisou devidamente a população do risco de cheias ou da iminência de inundações. Nem avisou por SMS, nem por outra forma visível e eficaz.

Morreu, infelizmente, uma pessoa. Podiam ter morrido mais. As autoridades encarregadas da prevenção, da antecipação das crises e de informação à população, não cumpriram a sua missão.

 

  1. Depois, uma constatação. Há dezenas de anos que os especialistas exigem túneis para drenagem de água em Lisboa. Há dezenas de anos que se fazem estudos, diagnósticos e promessas para evitar cheias como estas. Por que é que estas obras nunca avançaram? Porque não dão votos. Ninguém as vê. São obras subterrâneas. Ainda por cima, a sua execução causa enormes incómodos, ao abrir e esventrar várias ruas e avenidas. Esta é a imagem da cultura política nacional: o que é estrutural adia-se. O que se faz é apenas o que dá votos.

 

  1. Finalmente, a boa notícia. As cheias ocorreram esta semana, mas a obra de construção destes dois túneis de drenagem já estava decidida por Carlos Moedas há alguns meses. É uma obra de 250 milhões de euros, já está lançada e estará concluída em 2025. Ainda bem que alguém vê para além da espuma dos dias.

 

 

EUTANÁSIA: REFERENDO OU VETO?

 

  1. Esta lei devia ser referendada? Há anos que penso claramente que sim.
  • Primeiro, a questão da eutanásia, como a questão do aborto, é uma questão de consciência individual de cada um. Logo, deve ser cada um a decidir.
  • Segundo, esta questão, não sendo eminentemente uma questão política ou ideológica, suscita divisões em toda a sociedade, da direita à esquerda. Mais uma razão para consultar o povo.
  • Terceiro, sendo matéria tão fraturante, não devia ser aprovada por uma maioria conjuntural. Não havendo referendo, é muito provável que uma próxima maioria, oposta à atual, decida revogar a lei agora aprovada. Com referendo tudo seria diferente. Como se vê no aborto.
  • Finalmente, é aprovada uma lei em relação à qual os líderes do PS e do PSD têm dúvidas. Se os líderes dos dois maiores partidos têm dúvidas, essa devia ser mais uma razão para dar a palavra aos portugueses.

 

  1. O PSD não andou bem neste processo. Um referendo, para ser credível, propõe-se no início de um processo legislativo. Não no seu fim.
  • O PSD devia ter proposto o referendo desde o início deste processo, em 2019/2020, em coerência com o que também defendeu sobre o aborto no tempo da liderança de MRS. Os princípios são os mesmos.
  • O PSD devia ter avançado com o referendo, em obediência à recomendação aprovada no seu Congresso, no início de 2020. Era a vontade do partido.
  • O PSD não devia ter deixado para o Chega a iniciativa do referendo. Deixar ao Chega esta iniciativa era matar à partida a ideia de referendo.
  • Finalmente: propor o referendo, no fim do processo legislativo, não é credível. Soa a manobra tática. A culpa não é de Montenegro, que chegou há pouco à liderança. E até sempre defendeu o referendo. Mas o PSD, enquanto partido, não sai bem nesta fotografia.

 

  1. O que vai fazer o PR? Promulgar, vetar ou enviar ao TC? O que vai fazer não sei. O que deve fazer não tenho uma dúvida: enviar a lei ao TC.
  • Primeiro, porque uma lei desta delicadeza não pode ser promulgada sem um aval constitucional; segundo, porque, tendo o TC levantado já dificuldades constitucionais, é essencial que confirme se as questões anteriormente levantadas estão ou não definitivamente ultrapassadas.

 

CORRUPÇÃO NO MINISTÉRIO DA DEFESA?

 

  1. Mais uma investigação por corrupção, desta vez no Ministério da Defesa. A justiça fará, como sempre, o seu papel de investigação. Politicamente há uma questão séria a refletir e uma pergunta a fazer:
  • A questão séria é a promiscuidade política. O ex-diretor geral agora detido é militante do CDS, foi nomeado inicialmente por um Governo liderado pelo PSD e foi renomeado para outras funções pelo atual Governo PS. Três partidos do arco da governação que foram dando cobertura a este homem. Três partidos que deviam ter mais cuidado com as escolhas que fazem. Assim, não se previne a corrupção.
  • A pergunta a fazer é ao ex-Ministro da Defesa João Cravinho. Por que é que João Cravinho nomeou este homem para uma empresa do Estado já depois de se saber que tinha tido falhas graves na gestão de dinheiros públicos? Já depois de ter sido condenado pelo Tribunal de Contas? Já depois de ter a oposição do seu Secretário de Estado Jorge Seguro Sanches? Fica a sensação de que o Secretário de Estado foi um bom exemplo na defesa do interesse público e que o Ministro agiu com muita imprudência. É importante explicar.

 

  1. Tudo isto sucedeu na semana em que a Fundação Francisco Manuel dos Santos apresentou um estudo sobre a ética na política e o combate à corrupção. Um trabalho notável, dirigido por dois especialistas: Luís de Sousa e Susana Coroado.

Todos os partidos e o Governo deviam ler este estudo. A começar pelo Ministro Cravinho. Segundo o estudo, os políticos são permissivos à corrupção; os cidadãos, esses, são intolerantes. Esta perceção pública é brutal para a credibilidade dos políticos e para a confiança das pessoas nas instituições.

 

 

 

UM MAGISTRADO NA PRISÃO?

 

  1. Está prestes a acontecer algo de praticamente inédito em Portugal: um magistrado do MP cumprir uma pena de prisão por corrupção. É certo que ainda há um recurso no STJ para decidir, mas esse é o cenário mais provável.

Há duas formas de olhar para este caso: há uma forma negativa, destacando-se o facto de também haver corrupção no MP, justamente a entidade que tem por dever combatê-la; mas há uma outra forma, essa positiva: a justiça toca a todos, ninguém está acima da lei, incluindo os magistrados, e o MP teve a coragem de lutar para que um dos seus vá parar à cadeia e pagar pelo que fez.

 

  1. Eu acho que esta segunda hipóteses é que faz sentido e deve ser valorizada. Casos de corrupção, ainda que pontuais ou isolados, pode haver em todos os sectores da sociedade e em todas as instâncias do Estado. Não há sociedades ideais ou Estados perfeitos. Importante é termos todos a garantia de que, mesmo nas instituições mais improváveis, a corrupção é investigada, é combatida e é punida.

 

  1. Agindo como agiu, investigando e agora afastando Orlando Figueira do MP, a instituição agiu bem, cumprindo com seriedade a sua função. O MP não sai afetado deste processo.

 

A ECONOMIA EUROPEIA

 

  1. À medida que o fim do ano se aproxima, reforça-se a interrogação: vamos ou não entrar em recessão económica? Ora, a verdade é esta: há um país na UE que já entrou em recessão (a Estónia); há um terço que deve entrar em recessão já no quarto trimestre deste ano; e a UE no seu conjunto estará em breve em recessão ou estagnação.

 

  1. Esta é a conclusão inevitável dos resultados do crescimento do PIB no 3º trimestre deste ano. Assim:
  • Há 14 países com crescimento positivo, ainda que ligeiro: Irlanda, Chipre, Malta, Roménia, Luxemburgo, Polónia, Bulgária, Suécia, Dinamarca, Itália, Lituânia, Alemanha, Portugal e Eslováquia. Salvam-se de qualquer recessão, pelo menos, este ano.
  • Há 4 países em processo de estagnação: Bélgica, Espanha, França e Áustria. O risco de recessão em 2023 é grande.
  • Há um país já em recessão (a Estónia) e outros 8 que já tiveram crescimento negativo no 3º trimestre: Chéquia, Países Baixos, Finlândia, Croácia, Hungria, Grécia, Eslovénia e Letónia.

No caso destes oito países, verificando-se o próximo trimestre com crescimento negativo, a consequência é passarem a estar tecnicamente em recessão. Aí teremos um terço da EU em recessão técnica.

 

  1. Esta é a realidade mais negativa. A menos negativa é outra: comparado com a brutal recessão pandémica que tivemos em 2020, a eventual recessão de 2023 nunca terá a mesma dimensão e gravidade. E, se compararmos com o tempo da troika, estamos hoje, felizmente, mais protegidos: quer em termos de desemprego, de défice público ou de trajetória da dívida em função do PIB.
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