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Luís Marques Mendes 26 de Agosto de 2018 às 21:24

Notas da semana de Marques Mendes

As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre os resgates da Grécia e de Portugal; A rentrée do PS; Joana Marques Vidal; Greve na CGD; Angola e A semana negra de Trump.

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OS RESGATES DA GRÉCIA E DE PORTUGAL

 

  1.      A Grécia teve esta semana a sua saída limpa. É inevitável, por isso mesmo, comparar os resgates de Portugal e da Grécia.
  •        A Grécia teve três resgates, durante 8 anos, envolvendo financiamentos de 288 mil milhões de euros. Portugal foi bem diferente – um único resgate, três anos de intervenção e apenas 78 mil  milhões de euros.
  •        Em termos de resultados, no momento da saída, as diferenças são também mais favoráveis a Portugal, designadamente em matéria de dimensão da dívida pública; de juros da dívida; de contracção da economia; de desemprego; e de exportações.
  •        Apesar de doloroso, o resgate português foi menos pesado que o grego; no final, os resultados em Portugal eram bem melhores que na Grécia.
  1.      É a esta luz que se devem analisar as polémicas declarações de Centeno.
  •        Não acho que Centeno deva ser censurado pelo que disse sobre a Grécia. Disse o óbvio e disse o que a cartilha do Eurogrupo manda dizer: que todos aprenderam com o que se passou; que a Grécia pagou caro os seus eros do passado; que a economia se modernizou e que a Grécia reconquistou o controlo do seu destino.
  •        Censurável é sim o que Mário Centeno disse há três anos em Portugal. Na altura criticou a saída limpa do país, apesar de o nosso resgate ter sido muito mais bem sucedido que o regate grego.
  •        Ou seja, Mário Centeno teve dois pesos e duas medidas. Em Portugal, criticou a saída portuguesa para agradar à geringonça. Em Bruxelas, elogiou a saída grega para agradar aos alemães, que são quem lhe pode garantir uma boa carreira internacional. Uma coisa é certa: apesar da sua competência, este Ministro tem uma relação difícil com a verdade e com a coerência..

 

A RENTRÉE DO PS

 

  1.      António Costa fez abertamente um discurso de campanha eleitoral. Um discurso com 4 partes:

a)     Primeira parte: a apresentação da obra feita (na economia, no emprego, na saúde e na educação). É um discurso bem feito e bem fundamentado. Tem apenas um senão: não é honesto comparar este mandato com o mandato anterior. Antes havia a troika, agora não há troika.

b)     Segunda parte: o discurso sobre o próximo orçamento. Não tem novidades face ao que já se sabia mas é igualmente um discurso bem feito. Gera esperança e expectativa positiva. E confirma o que tenho dito – será um OE altamente eleitoralista. É normal. Não conheço nenhum governo que não tenha feito o mesmo em ano de eleições.

c)      Terceira parte: é um discurso com dois recados aos parceiros de Governo: não chumbem o OE porque o país precisa de estabilidade; não peçam de mais, porque não vamos fazer uma gestão orçamental irresponsável. É um discurso inteligente, porque dá do PS a imagem de um partido moderado, responsável e de boas contas. O ideal para conquistar votos ao centro. O PSD que se cuide.

d)     Quarta parte: é o discurso do apelo à maioria. Muitos dirão que António Costa não pede a maioria absoluta. Sejamos claros: não a pede formalmente, expressamente, abertamente. Mas pede-a implicitamente, indirectamente, nas entrelinhas. A nova forma encontrada para pedir a maioria é esta: é preciso dar mais força ao PS. Dar mais força ao PS para garantir a estabilidade. Dar mais força ao PS para assegurar o desenvolvimento. O que é isto se não pedir a maioria? Para bom entendedor meia palavra basta!

 

  1.      Aqui chegados, há dois partidos especialmente preocupados: o PSD e o BE.
  •        Primeiro, o PSD – Objectivamente um PSD parado, inactivo, em férias, sem ter iniciativa e sem fazer oposição é o maior aliado de uma maioria do PS. É que, pelo nosso sistema eleitoral, quanto maior for a distância do PSD para o PS, mais fácil se torna obter uma maioria absoluta. E se o PSD fica abaixo dos 30% o caminho do PS para a maioria fica altamente facilitado. Para já, o PS deve agradecer ao PSD!
  •        Segundo, o BESe não tiver maioria absoluta, António Costa preferirá estar à vontade para negociar apoios pontuais não com os dois parceiros actuais mas com um ou com o outro. E, neste quadro, ao contrário do que se pensa, António Costa preferirá mais depressa o PCP que o BE. Há uma relação de muito maior confiança entre António Costa e Jerónimo de Sousa do que entre Costa a os dirigentes do Bloco.

  

JOANA MARQUES VIDAL – FICA OU SAI?

 

  1.      Em Setembro, Presidente da República e Governo vão tomar uma decisão que pode ser profundamente consensual ou altamente polémica: a recondução ou a substituição de Joana Marques Vidal. Do ponto de vista do país, há todas as razões para reconduzir a actual PGR:

a)     Primeiro: teve um mandato altamente positivo. Foi um mandato difícil (investigações a Sócrates, na Banca, no futebol, a magistrados judiciais e do próprio Ministério Público); mas foi um mandato altamente positivo. Pela primeira vez, ficou a ideia de que a justiça é mesmo igual para todos. Que não poupa ninguém, incluindo os mais influentes e poderosos. Que nada fica por investigar. Neste quadro, reconduzir é a solução. Substituir é uma decisão estranha e suspeita. Cheira a esturro.

b)     Segundo: é a primeira vez, nos últimos anos, que um PGR chega ao fim do mandato em alta. Cunha Rodrigues foi um bom Procurador mas acabou desgastado; Souto de Moura, a mesma coisa; Pinto Monteiro deixou muito a desejar. Com Joana Marques Vidal é o contrário. Tem mais prestígio no fim do mandato do que no seu início. Substituí-la é muito suspeito.

c)      Terceiro: as investigações a José Sócrates e a Manuel Vicente. Foram os dois grandes casos do mandato da actual PGR. No primeiro caso, porque não é todos os dias que se investiga e acusa de corrupção um PM. No segundo, porque o caso Manuel Vicente deu azo a problemas políticos sérios entre Angola e Portugal. Neste quadro, substituir Joana Marques Vidal tem uma leitura perigosa: primeiro, a leitura de que o poder político estava desconfortável com estas investigações; depois, ainda pior, a leitura de que Portugal cedeu às pressões de Angola. É que em política o que parece é. Ora, isto fragiliza o Ministério Público e fragiliza a imagem de Portugal. Será que o poder político em Portugal quer cometer o suicídio de permitir esta suspeita?

 

  1.      Também do ponto de vista do Governo, o bom senso recomenda a recondução:
  •        Quer se queira, quer não, o PS, em matéria de independência da justiça, não tem grande curriculum. É certo que essa suspeita não se aplica a António Costa. Mas é, ainda hoje, a suspeita que recai sobre o PS. A substituição da actual PGR agrava essa suspeita em vez de a afastar.
  1.      Finalmente, caso se decida pela substituição de Joana Marques Vidal, o sucessor ou a sucessora no cargo fica logo com um estigma. Perguntar-se-á: foi escolhido porquê? Foi escolhido para defender quem? Isto é fatal. Será que o poder político (Governo e Presidente) quer assumir todos estes riscos?

 

A GREVE NA CGD

 

  1.      Há mais de seis anos que não havia uma greve na CGD. Sucedeu esta semana, contra a ideia da Caixa de pretender rever o acordo da empresa.
  1.      Importa dizer que ambas as partes – Administração da Caixa e sindicatos – estão a cumprir o seu papel:

a)     A Administração está a fazer o que responsavelmente tem de ser feito: cumprir o plano de restruturação que foi aprovado por Bruxelas e que não é responsabilidade desta Administração; harmonizar as regalias laborais dentro da Caixa como as que já se praticam na Banca em geral; substituir alguns excessos do passado, como as progressões por antiguidade pelas progressões por mérito;

b)     Os sindicatos estão também a fazer o seu papel – é normal que os sindicatos protestem quando há mudanças deste género. É dos manuais. Mesmo assim, o sucesso da paralisação é relativo (36% de adesão à greve).

 

  1.      Em qualquer caso, parece-me que há um razoável ambiente negocial:

a)     Primeiro, os sindicatos, lá no fundo, sabem que estas são mudanças inevitáveis. Não o dizem, mas percebem-no. É da lei da vida e da evolução da economia e das empresas.

b)     Depois, a Caixa, querendo rever o acordo que existe, fez propostas equilibradas. Segundo essas propostas, os trabalhadores da Caixa continuarão a ter melhores condições do que as praticadas na Banca em geral: as condições de reforma são melhores; as condições de assistência na doença e dos serviços sociais são melhores; o regime de diuturnidades é igualmente melhor.

c)      Em conclusão: não me parece haver grande drama. E isso é bom. A Caixa bateu no fundo. Ou recupera agora ou não terá uma nova oportunidade da parte de Bruxelas. E, felizmente, os resultados vão na boa direcção. Mérito do Estado, da Administração e dos trabalhadores.

ANGOLA – UM ANO DEPOIS DAS ELEIÇÕES

 

  1.      Fez esta semana um ano que ocorreram as eleições presidenciais em Angola. Muito boa gente previu na altura que as mudanças seriam meramente cosméticas. Pois bem. O que está a suceder em Angola é uma verdadeira revolução. Pacifica e tranquila mas uma revolução.
  •        Revolução na liberdade de informação e de imprensa. Revolução no combate à corrupção. Revolução na liberalização económica.
  •        O Presidente João Lourenço conseguiu num ano o que parecia impossível: popularidade no plano interno; credibilidade no plano internacional. A popularidade dá-lhe poder. A credibilidade está a permitir quebrar o isolamento de Angola na comunidade internacional.

 

  1.      O que se segue, agora, nos próximos doze meses, é igualmente decisivo:

a)     Primeiro: em Setembro, vai acabar a liderança bicéfala que existe em Angola. O Presidente João Lourenço vai passar a ser também o Presidente do MPLA. É o fim definitivo da era José Eduardo dos Santos. Politicamente, chama-se a isto "matar o pai" e exercer o poder em plenitude.

b)     Segundo: a seguir, vai fazer uma remodelação do Governo. É inevitável. É o exercício do poder com maior profundidade e já sem limitações partidárias.

c)      Finalmente: um acordo com o FMI para restruturar financeiramente o país. Aqui está o grande calcanhar de Aquiles de Angola. É que a economia angolana está muito debilitada. E sem a economia a recuperar não há coesão social nem estabilidade política duradoura.

 

  1.      E tudo isto é importante para Portugal. Não que Portugal tenha que imiscuir-se na política interna de Angola. Mas sim porque a relação de Portugal com Angola só tem a ganhar com uma Angola mais democrática, mais desenvolvida e mais estável.

  

A SEMANA NEGRA DE TRUMP

 

  1.      Esta foi provavelmente a semana horribilis para Trump desde que está na Casa Branca. Pelo que sucedeu, por aquilo que pode vir a suceder e pela reacção do próprio Trump.
  •        O que sucedeu foi a condenação do seu Director de Campanha (Paul Manafort) e a confissão judicial do seu ex-advogado (Michael Cohen), envolvendo directamente o nome do Presidente em negociações que podem ser crime;
  •        O que pode vir a suceder é que um e outro – sobretudo o seu ex-advogado – para evitarem condenações pesadas em tribunal, podem fazer novas confissões à justiça sobre o Presidente e o seu passado.
  •        A reacção do Presidente fez-se em dois momentos defensivos: no ataque ao PGR (Jeff Sessions), invectivando-o a demitir o Procurador Especial encarregado das questões da Rússia; e em entrevista televisiva, numa reacção preocupada. Pela primeira vez, falou da hipótese de destituição, o que é um enorme sinal de fragilidade.
  1.      Mesmo assim, não creio que mude nada de essencial no eleitorado que apoiou Trump nem que haja quaisquer condições para um processo de impeachment.
  •        Em circunstâncias normais, um Presidente assim estaria politicamente morto;
  •        Com Trump, o seu eleitorado poderá sentir algo incómodo, mas não tem alternativa;
  •        Por outro lado, com os republicanos a dominarem as duas Câmaras, um processo de destituição é hoje praticamente impossível.
  1.      Ou seja: a imagem de Trump sofreu mais um abalo. Mas só duas coisas podem abalar mesmo a força do Presidente:
  •        Ou o surgimento de um facto novo e especialmente grave;
  •        Ou uma derrota dos republicanos nas próximas eleições de Novembro, até porque estas serão um referendo a Trump.
  •        Isso, sim, seria um abalo sério para o Presidente. E pode mesmo suceder que os democratas vençam a Câmara dos Representantes.
  •        A partir daí outro galo cantaria.

 

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