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07 de Setembro de 2020 às 18:53

Fizemos de conta, mas não fizemos

A herança do passado vai revelar-se pesada. Um ajustamento orçamental que assentou na rigidificação da despesa, na simples contenção -sem reformas - de parte da despesa corrente e do corte histórico no investimento público, é um desafio enorme para a gestão actual das contas públicas.

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A FRASE...

"Para quê preocupar-me com o Inverno? Comida não nos falta... - respondeu a Cigarra."

 

Esopo, recontada por Jean de La Fontaine, Século XVII

 

A ANÁLISE...

 

Independentemente da pandemia, o Orçamento do Estado para 2021 terá de ser entregue até ao próximo 15 de Outubro na Assembleia da República. A situação espelha, em parte, a anormalidade da situação: é neste momento muito difícil estimar como terminará a execução do Orçamento do corrente ano, função da acrescida incerteza económica e seus impactos em rubricas importantes da receita e da despesa. Também o cenário macroeconómico para 2021 é particularmente difícil de estabelecer, nomeadamente porque há ainda muita incerteza sobre a evolução da situação sanitária e o modo como esta afectará a actividade económica no próximo ano e as consequentes repercussões no exercício orçamental.

 

O que parece idêntico aos últimos anos é a dança irresponsável de pedidos e trocas que os putativos apoiantes do Governo na aprovação deste exercício já foram dando a conhecer. Este comportamento não é de estranhar e insere-se na lógica política da sua actuação.  O que já é algo insólito, apesar de tudo, é que haja tão poucas referências ao inusitado que é fazer um exercício destes sob tamanho grau de incerteza quanto ao futuro próximo. E ainda mais, não se explicar que, face a muitos dos nossos parceiros europeus, temos muito menos margem de manobra financeira e que isso poderá, inclusive, vir a condicionar o modo como vamos encarar o combate à doença. Pelo menos até certo ponto. Finalmente, admito que continue a não se querer reconhecer que as nossas dificuldades nos próximos meses não resultarão apenas da enorme dívida acumulada pelo Estado mas também da fraca qualidade do tão aplaudido ajuste orçamental dos últimos anos.

 

A herança do passado vai revelar-se pesada. Um ajustamento orçamental que assentou na rigidificação da despesa, na simples contenção -sem reformas - de parte da despesa corrente e do corte histórico no investimento público, é um desafio enorme para a gestão actual das contas públicas. A receita, por outro lado, sofre com a queda abrupta do produto e a sua incerta recuperação.  Infelizmente penso que é agora que vai ficar patente (mas provavelmente não admitido pela maioria) que ter fingido ser formiga, quando, de facto, se foi cigarra, gerou muitos louvores mas não foi solução.

 

Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico

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