Opinião
O baile armado
O Orçamento do Estado é o contrário do que devia ser um documento que regulamenta como se gastam os dinheiros da nação.
"Um bom gestor garante que as coisas fiquem bem feitas; um líder consegue que se façam as coisas certas."
Peter Drucker
O baile armado
O Orçamento do Estado é o contrário do que devia ser um documento que regulamenta como se gastam os dinheiros da nação. Devia ser transparente e é opaco - pelos vistos, há verbas escondidas, e não são pequenas, para serem usadas e outros indicadores, como a verba para despesas imprevistas, a célebre "almofada", que não se vislumbram. A Unidade Técnica de Apoio Orçamental do Parlamento encontrou 255 milhões camuflados e considera poder existir uma suborçamentação naquele valor das receitas na proposta de Orçamento do Estado apresentada por Centeno. O ministro das Finanças jura que esta análise está incorrecta, mas não falta quem ache que Mário Centeno criou um baú que permite ter uma confortável margem de manobra por parte do Executivo de António Costa para as negociações do OE 2020, com os partidos pró-geringonça. Adicionalmente, já se percebeu que o Orçamento do Estado para 2020 prevê maiores cativações do que as efectuadas em 2019. Com vários partidos a anunciar que se vão abster ou votar contra, a maioria necessária para fazer aprovar o Orçamento vai estar dependente de muita negociação e de cedências aos partidos pró-geringonça. As negociações vão ser duras e a imprevisível deputada do Livre pode ter um grande protagonismo, de que gosta, em todo o processo. Em qualquer dos casos, mesmo depois de aprovado na generalidade, se isso acontecer por obra do Livre ou dos deputados da Madeira, há muito para renegociar nas votações na especialidade - em que a opacidade é ainda maior. E não há-de ser por acaso que, na proposta de Orçamento para 2020, há muitos pontos em branco propositadamente deixados para essa negociação na especialidade. Na realidade, o baile está armado em São Bento. Para já, o PS é o único a dizer que sim a Centeno, mas há uma fila de espera de pedidos e um baú para dar umas esmolas. E, por cima disto tudo, temos também a certeza de que esta será a maior carga fiscal de sempre. Os próximos dias vão ser animados, cheios de danças e contradanças.
• A deputada Joacine Katar Moreira quis impedir a Assembleia da República de utilizar uma fotografia em que aparece na Comissão de Ambiente do Parlamento • segundo o presidente do Tribunal Constitucional, Manuel Costa Andrade, as verbas previstas para criar a nova Entidade da Transparência, que vai fiscalizar os políticos, não chegam para assegurar o seu funcionamento e não há a "mínima preparação" para instalar este novo organismo • o preço das casas na periferia de Lisboa aumentou mais de 20% no terceiro trimestre de 2019 • cerca de 1.400 condutores já atingiram o limite de infracções e arriscam ficar sem carta de condução, triplicando o número dos que estavam nessa situação em 2018 • as queixas relacionadas com os atrasos na atribuição de pensões aumentaram cerca de oito vezes em apenas três anos e atingiram 1.600 no ano passado • a taxa de desemprego subiu para 6,7% em Novembro, o valor mais alto no espaço de um ano • na época do Natal, entre 1 de Dezembro e 2 de Janeiro, foram feitos pagamentos via multibanco a uma média de 242 milhões de euros por dia; em 2019, os portugueses gastaram em média 35,5 milhões de euros por dia a comer fora de casa • a maioria das câmaras municipais do Norte do país não conseguiu atingir 50% de receitas próprias • pela primeira vez, em 16 anos, venderam-se mais carros a gasolina; em 2019, morreram 57 pessoas em acidentes com tractores e registaram-se mais de cinco mil acidentes rodoviários entre o Natal e a passagem de ano que causaram 17 mortes • o Fisco cobrou imposto automóvel em excesso a cerca de 130 mil carros importados.
Dixit
"Era giro que, ao entregar o Orçamento ao presidente da AR, Centeno fosse parado numa daquelas operações stop organizadas pela Autoridade Tributária e lhe esquadrinhassema pen à procura de receitas ocultas."
José Diogo Quintela
Gestão política
Luís Reis, um dos nomes fortes da gestão histórica da Sonae, tem vindo a aumentar a sua actividade mediática, quer através de colunas de opinião, quer envolvendo-se mais directamente em política, como no caso das eleições internas do PSD, em que aparece a apoiar um dos candidatos contra Rio. Aqui estão cerca de seis dezenas dos artigos que Luís Reis publicou entre Setembro de 2012 e Outubro de 2019 e que reflectem a sua observação da realidade económica e política portuguesa nesse período. Nos seus textos, Luís Reis passa em revista a actuação dos governos de Passos Coelho e de António Costa e a acção dos ministros das finanças, nomeadamente de Vítor Gaspar e de Mário Centeno. Luís Reis aborda os problemas que, na sua perspectiva, melhor caracterizam as dificuldades da nossa sociedade e da nossa economia. Além da sua actividade enquanto gestor, Luís Reis tem uma extensa carreira académica e participações em associações empresariais portuguesas e internacionais. Nas suas intervenções, que aqui se recolhem, tem insistido na necessidade de uma oposição mais activa que faça propostas novas, aponte reformas, defenda a modernidade. A última frase do livro, escrita depois das eleições de Outubro passado, diz tudo: "Lamento o pessimismo com que encaro os próximos quatro anos, mas navegar com Costa à vista é receita segura para naufrágio!"
Imagens marginais
Américo Filipe e Teresa Almeida e Silva apresentaram esta semana, na Galeria Monumental, uma nova etapa do seu projecto comum "Estrada Marginal", que mostra pintura e vídeo de Américo Filipe e pinturas de Teresa Almeida e Silva. (Campo dos Mártires da Pátria 101). Na Módulo - Centro Difusor de Arte, inaugura sábado "A Cor da Sombra", de Joana Hintze (Calçada dos Mestres 34). Outros destaques: "Os Dias das Pequenas Coisas" de Sarah Affonso, no Museu Nacional de Arte Contemporânea, no Chiado, e "Sombras e Outras Cores" de Manuel Baptista, no Museu Arpad Szenes-Vieira da Silva. Entretanto, até sábado, ainda podem ver algumas das exposições marcantes das últimas semanas: obras de Sérgio Pombo, feitas entre 1973 e 2017, na Fundação Carmona e Costa; "Parasita", de Rita Ferreira, na Travessa da Ermida; "Formas Antigas, Novas Circunstâncias", de André Guedes, na Galeria Vera Cortês; "O Narcisismo das Pequenas Diferenças", de Pauliana Valente Pimentel, no Arquivo Municipal de Lisboa - Arquivo Fotográfico; "Jorinde e Joringel", de Daniela Krtsch e "Double Poetics", de Joana Gomes, na Galeria Belo Galsterer.
Arco da velha
A nova Feira Popular de Lisboa, anunciada por Fernando Medina há quatro anos, ainda não saiu do papel, nem tem data prevista de inauguração, mas já se sabe que custará 70 milhões.
Um trio inesperado
Não me canso de dizer que o trio é uma das minhas formações preferidas no jazz. O trio clássico inclui geralmente piano, baixo e bateria, mas, no caso do disco de que hoje falo, há uma curiosa situação: um dos músicos toca piano, trompete e teclados e ainda tem umas participações vocais. O músico em questão é Nicholas Payton, aqui acompanhado por Kenny Washington na bateria e por Peter Washington no baixo. "Relaxin’ With Nick" é um duplo CD gravado nos dias 30 e 31 de Maio e 1 de Junho de 2019, no palco do Smoke - Jazz and Supper Club, de Nova Iorque. Ao todo, são quinze temas, divididos pelos dois discos deste duplo CD, disponível no Spotify. Um dos temas incontornáveis é "Jazz Is A Four Letter Word", a meio do primeiro disco. Payton começa com acordes do seu Fender Rhodes, acompanhado pelo baixista, enquanto explica que a música foi inspirada por um livro em que Max Roach estava a trabalhar na altura em que morreu. Payton, que fala e canta neste tema, passa do Fender Rhodes para o piano e depois para o trompete, num diálogo arrebatador com os outros dois músicos. Arrisco dizer que este é o tema mais emblemático de um disco, em que também se destacam "1983", "I Hear A Rhapsody" ou "Five".
Um clássico
Os "buffets" de almoço são geralmente uma aposta arriscada - coisas requentadas, sobras diversas, muitas vezes com um aspecto algo enxovalhado. Uma boa excepção a esta regra é o "buffet" do histórico São Bernardo, hoje em dia na Junqueira, desde que saiu da Lapa. Além do "take-away" que deu nome à casa, o São Bernardo tem no segundo andar uma zona de restaurante que, ao almoço, funciona em "buffet" e que à noite pode ser reservado para grupos ou eventos. Mas vamos ao que interessa: este "buffet" é um clássico, não sofre das maleitas da maioria, é diversificado, inclui sopa, entrada, prato de carne ou peixe, bebidas (vinho da casa branco ou tinto, água, sumo do dia ou limonada), sobremesa e café. O preço é de 17,50, as mesas são confortáveis. Não é fácil encontrar clientela abaixo dos 40 e a orientação da cozinha é a gastronomia portuguesa. Num destes dias, havia umas tenras tiras finas de choco frito acabado de fazer, uma belas empadinhas de frango e um saboroso frango com alecrim e mel. Nos acompanhamentos, destacavam-se umas migas de couve, arroz árabe e batatinhas no forno, além de boa variedade de saladas. Nas sobremesas, há sempre fruta laminada e doces: no caso, um bolo de chocolate e uma tarte de frutos silvestres. A qualidade da confecção é muito boa, a qualidade da matéria-prima é constante. No São Bernardo não há lugar para más surpresas e, no fim do almoço, pode sempre escolher um dos pratos cozinhados e embalados para levar para casa.