Opinião
"Revolutionary School (II)"
No campo dos princípios, já quase tudo foi dito acerca do tema dos colégios privados e da sua subsidiação pública.
No blogue Causa Nossa (29 de Maio), Vital Moreira desmonta exemplarmente o embuste da luta pela "liberdade de ensino", evidenciando a falácia política e ideológica da causa colegial. De uma vez por todas, não está em causa a liberdade de ensinar e aprender nem a de criar e frequentar escolas privadas. Do mesmo modo que é irrefutável a obrigação do Estado de criar e desenvolver a rede de ensino público, recorrendo subsidiariamente ao privado quando as circunstâncias, especialmente geográficas, o justifiquem. Há, porém, verdades escondidas, algumas delas inconfessáveis, que importa iluminar.
Que fenómeno estranho terá conduzido a que, dos 79 colégios privados em regime de associação, só dois se situem a sul do Tejo (ambos em Beja)? E que bizarra conjugação de factores ou de influências estará por trás da existência de nove colégios subsidiados só na cidade de Coimbra e outros tantos na de Leiria (contra somente dois em Lisboa e no Porto)? É certo que o critério da proximidade geográfica não deve ser o único a ditar o recurso a escolas privadas. O regime de internato, a existência qualificada de valências específicas, o ensino especial ou as experiências pedagógicas inovadoras devem igualmente ser tidas em conta sempre que o privado demonstre sustentadamente as suas aptidões diferenciadoras. Quais os colégios que se encontram neste grupo?
E depois há o segredo mais bem guardado - a maioria dos pais que opta por instituições privadas não o faz por critérios de qualidade de ensino, pelas instalações escolares ou pelo número de crucifixos nos corredores. Fá-lo porque recusa o conceito, democrático e republicano, de escola inclusiva e, sobretudo, porque receia o que de pior os estabelecimentos públicos evidenciam - a indisciplina.
Recordo um trecho de um artigo intitulado Revolutionary School (Jornal de Negócios, Maio de 2009), relatando, em discurso indirecto, a experiência de uma professora do ensino público: "B. está cansada. Cansada de uma escola onde pululam gangues e a insegurança se entranha na pele e nos comportamentos de todos - estudantes, professores e funcionários. Cansada de gastar o seu tempo a proteger os alunos 'normais' das investidas dos desordeiros, quando não de famílias inteiras de malfeitores. Cansada de assistir à capitulação do sistema perante a indisciplina e a sistemática desautorização dos professores. Cansada do desinteresse dos pais perante a sorte dos filhos. Cansada de guerra."
E ainda, da mesma peça: "Entendo e apoio os princípios da universalidade e da integração, mas não aceito que impere a lei da canalha. As escolas não podem ser jaulas nem quartéis, mas têm a obrigação de fazer respeitar a disciplina e a ordem, sob pena de fracassarem na sua missão. Não é admissível que uma turma inteira veja os seus trabalhos escolares permanentemente prejudicados pela atitude selvagem de um(a) jovem obrigado(a) a ir a uma escola que odeia (e que provavelmente nunca completará), à excepção dos intervalos onde se diverte a aterrorizar os colegas." O drama é que B. não é uma excepção.
Figura do mês: Maria Manuel Leitão Marques
O Simplex está de volta, pela mesma mão dos que, em 2006, o haviam lançado - António Costa e Maria Manuel Leitão Marques. O novo pacote compõe-se de 255 medidas de simplificação administrativa, algumas das quais facilitarão em muito a vida dos cidadãos e das empresas. Depois do deserto de ideias e de iniciativas da governação anterior, é de saudar este novo ímpeto na senda da modernização do Estado e dos seus procedimentos burocráticos. Este é um dos domínios onde mais há a esperar do actual Governo. Com duas excepções, curtas mas honrosas - protagonizadas por Isabel Corte Real, no tempo de Cavaco Silva, e por Diogo Vasconcelos, no de Durão Barroso -, a direita nunca se preocupou com a modernização dos serviços públicos. Coerente com os seus propósitos, o consulado Passos Coelho ignorou-a porque simplesmente entendia não valer a pena melhorar o que, no fundo, se desprezava - o Estado. Cabe agora à senhora Simplex recuperar o tempo perdido e prosseguir o que em tempos nos colocou na lista dos países mais inovadores.
Número do mês: 62 mil milhões de dólares
Foi o valor oferecido pela alemã Bayer para a aquisição da maioria do capital da norte-americana Monsanto, a maior fabricante mundial de sementes geneticamente modificadas e produtos químicos para a agricultura e outros fins. Apesar do prémio de 37% sobre o valor bolsista, os accionistas da Monsanto terão declinado a oferta, por a considerarem insuficiente.
Surja ou não uma nova oferta da Bayer, a guerra surda entre a Europa e os Estados Unidos pelo domínio de uma das mais lucrativas indústrias do planeta vai conhecer novos episódios. Alguns deles desenrolam-se de forma quase imperceptível aos olhos do cidadão comum. A recente polémica sobre o uso do glifosato nos pesticidas agrícolas não é, segundo fontes especializadas, uma questão meramente química, mas sim uma batalha de patentes. A do glifosato expirou e o seu criador, a Monsanto, estará por trás do movimento proibicionista, habilmente promovido nos corredores de Bruxelas, enquanto se prepara para lançar um novo produto patenteado. Simples, não?
Economista; Professor do ISEG/ULisboa