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10 de Janeiro de 2017 às 19:49

Governadores e políticos

Não consta que os atuais banqueiros do euro, dólar, ou iene se tenham de preocupar com as reservas de ouro. Mas, o tempo que lhes é tolerado para responder aos acontecimentos políticos, sociais e económicos estreitou-se.

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À luz da História, os banqueiros centrais e os seus bancos, quer através das crises de dívida soberana (taxas de juros insustentáveis), de dívida externa (insuficiência de moeda estrangeira), ou das propriamente bancárias (corrida a depósitos por falta de confiança e/ou restrições significativas de crédito) serão sempre responsabilizados pelos erros dos regimes políticos: se não tinham a independência destes, deviam ter; se a têm, estão a utilizar mal os instrumentos que lhes foram concedidos.

 

Nos anos 20 do século passado, os poderosos banqueiros dos bancos centrais Montagu Norman (Inglaterra), Hjalmar Schacht (Alemanha), Benjamin Strong (EUA), e Émile Moreau (França) tiveram de enfrentar a inesperada tempestade das duas guerras mundiais, mas com uma inimaginável prerrogativa: podiam ter dois meses de férias e faziam deslocações de um mês para resolver um assunto urgente, sem que daí viesse mal ao mundo, como bem descreve Liaquat Ahamed no seu livro "Lords of Finance", publicado no ano maldito (2008) deste século.

 

O monopólio de emissão de moeda e regulação do preço do crédito (taxas de juro) eram, como sempre, as suas prioridades. Não se podiam esquecer também da sua função de regular a taxa de câmbio. Viviam obcecados com as reservas de ouro para explicarem o valor das suas moedas. Em Portugal, o Antigo Regime relembrou-nos sempre da fortaleza dos cofres cheios de ouro.

 

Não consta que os atuais banqueiros do euro, dólar, ou iene se tenham de preocupar com as reservas de ouro. Mas, o tempo que lhes é tolerado para responder aos acontecimentos políticos, sociais e económicos estreitou-se: tem de ser quase instantâneo. Qualquer decisão sobre taxas de juro e volume de moeda disponível para a economia é justificação para as mais inúmeras variações da economia, e para alimentar o confronto político.

 

Na região do euro, as taxas de juro estão aos níveis mais baixos, e mesmo assim a procura mantém-se baixa. Restam-nos os campos da produtividade, que exige reformas estruturais, e as políticas orçamentais. Estas têm de ser restritivas para alguns, em face dos elevados níveis de dívida pública. Estes fatores agregados originam uma tensão no sistema político, que vai produzindo soluções constitucionais (como é o caso português e/ou grego), mas que não pode por razões políticas se traduzir em soluções sustentáveis para a produtividade e para as políticas orçamentais.

 

Paralelamente, a meta de inflação (tão necessária) na Zona Euro tem efeitos contraditórios. Para a zona do euro, dólar e iene, como bem defende Blanchard por razões diferentes, a taxa de inflação tem de ser elevada: no caso do dólar para ser um seguro contra a recessão, no euro para restabelecer a competitividade dos países do Sul, e no caso do iene para que se possa digerir a dívida pública.

 

Em termos práticos, uma simples inflação de 2% na Zona Euro vai exigir uma deflação nos países do Sul, a não ser que os países com excedentes aceitem uma mais elevada taxa de inflação, o que pode criar adicional tensão nos respetivos regimes políticos.

 

A Europa está assim a viver a sua Torre de Babel, em que os ministros da Europa, da Produtividade e os das Finanças de cada país não se entendem interna e externamente. Até lá, vamos apontando a mira para os poderosos banqueiros centrais e aos seus bancos. Alivia a tensão política, mas distrai-nos do essencial das políticas públicas que têm de ser corrigidas.

 

Gestor

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico 

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