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29 de Julho de 2015 às 00:01

Xangai, a bolsa e o partido 

Vislumbra-se um padrão nas convulsões financeiras na China e aumenta a suspeita de que a margem de manobra para gestão de crises seja cada vez mais estreita.

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À valorização em cerca de 125% da bolsa de Xangai, replicada em Shenzhen, entre Outubro e Junho, embalada por recurso ao crédito com incentivo oficial, seguiram-se quebras que obrigaram à intervenção governamental.  

 

Para mais de 90 milhões de investidores (maioritariamente nascidos após 1980), as perdas desfazem a miragem de investimento em bolsa com lucro exponencial a reflectir o bom desempenho da economia alimentada pela propaganda oficial.

 

O contágio

 

A escassa relevância das bolsas domésticas para o financiamento das empresas chinesas ou a reduzida percentagem do investimento bolsista nos activos financeiros das famílias (20%, segundo inquérito da "Charles Schwab" de S. Francisco) não eliminam riscos de contágio.

 

Soluções de recurso impostas pelo regulador - interdição de ofertas públicas de venda, compras excepcionais de corretoras e fundos de investimento, proibição de vendas a descoberto e recompra empresarial de acções - não iludem um problema de fundo.

 

As 21 firmas de corretagem, tal como investidores individuais, dependem em proporções variáveis do sistema bancário informal que representará cerca de 18% do total do crédito e uma conjuntura que force a alocação brusca dos recursos disponíveis aumenta o risco de comprometer o sector imobiliário.

 

O Verão de 2013

 

Qualquer reajuste implica riscos, tal como ocorreu em Junho de 2013 quando o Banco Central ao reduzir a oferta de liquidez no mercado interbancário para forçar cortes no crédito, sobretudo ao sector informal financeiro  - nominalmente regulado pelas administrações locais e regionais e equivalente a cerca de 10% do PIB -, provocou uma brusca alta das taxas "overnight" e a sete dias.

 

A crise de 2013 foi um dos sinais da extrema dificuldade em gerir o alto nível de endividamento gerado pelas políticas de expansão de crédito seguidas na sequência da crise internacional de 2008 e do esforço do Partido Comunista para manter um nível de crescimento na ordem dos 7%.

 

Três anos depois de assumir a chefia do partido e do Estado, Xi Jinpiang, e seu primeiro-ministro, Li Leqiang, estão longe de debelar a dívida de empresas e particulares que ascendia em Junho a 207% do PIB.

 

A dívida do governo central será de 64% do PIB, mas as dívidas das administrações locais, possivelmente superiores a 30% do PIB, estão a ser absorvidas pela banca que regista 140 mil milhões de yuans (cerca de 20,76 mil milhões de euros) de crédito malparado.

 

O jogo do empurra prossegue.    

 

O padrão e as servidões

 

A bolha imobiliária depois de colapsos pontuais em 2011 - designadamente em Ordos, na Mongólia Interior, e em Wenzhou, na província costeira de Zhejiang, no sudeste - que puseram em causa a angariação de receitas pelos governos locais através de leilões de concessões de terra para construção e desencadearam falências em cadeia, subsiste como risco maior.

 

Sucessivas ameaças de implosão provocadas por excesso de endividamento têm vindo a ser ultrapassadas aliviando um sector da economia em detrimento de outro.

 

Aumentar o risco da explosão da bolha especulativa do imobiliário ou do crédito malparado provoca uma escalada  de danos dificilmente controlável.

 

Os altos e baixos de Xangai e Shenzhen e a inconsequente intervenção governamental para controlar as disfunções do capitalismo de Estado comunista num descalabro bolsista  são sinal de um dilema de fundo.

 

É difícil passar de uma economia exportadora com escassa incorporação tecnológica, baixos custos de produção e insustentáveis danos ambientais para um modelo que privilegie o mercado interno.

 

Expandir as forças produtivas - gentes, ideias, e, necessariamente, conflitos de interesses - e livrar-se do despotismo da classe no poder no sistema do partido-estado comunista é, conforme assevera a doutrina marxista, ainda mais tortuoso.

 

Jornalista

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