Opinião
Roubam e não fazem nada
Quando se aproximar a condenação por maioria de dois terços no Senado de Dilma Rousseff caberá à Presidente optar entre a renúncia ou beber o cálice até ao fim.
A data-limite para o julgamento (180 dias a contar da provável aceitação da denúncia pelo Senado em Maio) ronda as eleições municipais de Outubro, e a votação dos deputados pela abertura do processo deu sinal de que o PT enfrenta perda acentuada de apoios.
Sete partidos da coligação governamental, a começar pelo PMDB, passaram à oposição e, tirando dez votos comunistas e 60 do PT, a Presidente só obteve mais 43 apoiantes entre os deputados das restantes 23 formações.
Por estado, só uma maioria de deputados do Amapá, Ceará e Bahia votou contra a destituição.
Dilma nem sequer conseguiu apoio maioritário entre deputados dos demais 12 estados em que venceu na segunda volta das presidenciais de 2014.
A maioria dos candidatos às votações de Outubro, preliminar da negociação de coligações para as presidenciais de 2018, quis dissociar-se de um Governo esgotado.
Lula, por sua vez, é dos políticos mais expostos aos imponderáveis das investigações e processos judiciais e por escasso prejuízo que isso possa trazer entre militantes e votantes do PT, sobram, contudo, dificuldades acrescidas nas negociações com outros partidos.
Outro risco da corrosão de Lula e do PT passa pelo confronto com a imagem impoluta de Marina Silva que já deu provas em eleições presidenciais de ser capaz de congregar o voto evangélico e o protesto ambientalista.
Dilma terá, assim, de aceitar o martírio, clamando contra golpistas e traidores, para galvanizar o PT obrigado a uma oposição irredutível a qualquer iniciativa do governo de Michel Temer.
O presidencialismo de coligação desfez-se ante a fragmentação partidária, indefinição ideológica e viciação do sistema político por altos níveis de corrupção que se alargou a novos círculos com a chegada do PT à esfera do poder no final de 2002, ano em que conseguiu o maior número de sempre de mandatos na Câmara (91 entre 513 deputados).
A degradação das expectativas económicas torna difícil a Temer abrir caminho a uma estabilização institucional e à recuperação económica à imagem de Itamar Franco (com o contributo de Fernando Henrique Cardoso e o Plano Real), após a renúncia de Collor de Mello no final de 1992.
A degradação da ordem institucional, incluindo a politização das instâncias judiciais, tem potenciado a mobilização de apoiantes e opositores do PT, mas, essencialmente, entre as camadas mais instruídas e de maiores rendimentos da população.
As sondagens detectam uma crescente desilusão e temor entre as classes de menores rendimentos e escolaridade (representando mais de 50% do eleitorado), que vêm perdendo poder de compra, sentem o aumento do desemprego (superior a 8%) e temem cortes nas políticas redistributivas.
Aqui ecoa mais forte a ideia de que a política é o roubo.
Nem sequer sobra complacência para a vetusta tradição que teve no governador paulista Ademar de Barros um dos seus expoentes.
Dos anos 1930 até à ditadura militar pôr termo à sua carreira política em 1966, Ademar vicejou de escândalo em escândalo sob o lema: "Eu roubo, mas eu faço!"
Agora, os escândalos proliferam, mas é o que se vê.
Jornalista