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19 de Março de 2014 às 18:48

O Boeing perdido

Qualquer que tenha sido o destino do voo MH370 é desde já claro que as insuficiências em matéria de segurança aérea e a desconfiança estratégica entre os países do Sudeste Asiático e os seus grandes vizinhos a Oriente e Ocidente é uma das pechas maiores do sistema estatal internacional.

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O desaparecimento do Boeing 777-200 das linhas aéreas da Malásia revela o estado caótico dos sistemas de vigilância e defesa aérea e a desconfiança generalizada entre os estados que partilham uma das principais rotas comerciais do planeta.

 

As autoridades da Malásia forneceram informações tardias e erradas sobre a rota do avião, fazendo perder tempo em buscas no Mar do Sul da China antes de confirmarem dia 15, uma semana após o desaparecimento, que o aparelho se desviara da rota Kuala Lumpur-Pequim, retrocedendo para ocidente e cruzando a península malaia.

 

Kuala Lumpur não justificou também por que razão a sua força aérea não interveio depois de radares militares terem detectado às 02:15 (hora local) um voo não-identificado sobre zonas densamente povoadas do estado de Penang e através do estratégico estreito de Malaca.

 

Informação contraditória

 

Terça-feira, dez dias após o desaparecimento, o governo malaio ainda fornecia dados contraditórios sobre a hora a que o sistema digital de comunicação do aparelho com radares (ACARS) teria sido desligado.

 

Se, no domingo, o ministro da Defesa Hishammuddin Hussein afirmava que essa acção deliberada ocorrera às 01:07 (hora local), 26 minutos depois do avião descolar, segunda-feira o chefe-executivo da "Malaysia Airlines", Ahmad Yahya, vinha dizer que tal, afinal, poderia ter ocorrido entre as 01:07 e 01:37.

 

De acordo com as autoridades malaias, a derradeira comunicação de voz, por parte do co-piloto, teve lugar às 01:19, dois minutos antes de o transponder deixar de funcionar, numa altura em que o Boeing 777-200 estava prestes a passar para a supervisão de controladores aéreos vietnamitas.  

 

Banguecoque só terça-feira confirmou que um radar militar em Surat Thani (sul da Tailândia) assinalou um voo civil não-identificado sobre Penang e a informação colhida por controladores aéreos vietnamitas e indonésios, civis e castrenses, não foi tornada pública.

 

Nova Delhi, por sua vez, escusou-se a confirmar se os seus sistemas de radar civis e militares nos arquipélagos de Nicobar e Andamão estavam operacionais na madrugada de 8 de Março quando o Boeing 777-200 desapareceu.

 

A Birmânia (Myanmar) apesar de aceder a um pedido de Kuala Lumpur para buscas nas suas águas territoriais nas Ilhas de Coco, Golfos de Bengala e Martaban admitiu ter capacidades de vigilância aérea limitadas, enquanto a China que tem presença militar no leste do Índico não adianta dados sobre eventuais registos de radares militares na zona.

 

À semelhança dos demais estados envolvidos na busca, Pequim tem evitado facultar dados que revelem a sua real capacidade de vigilância área.

 

Fotos de satélite mostrando três objectos não-identificados, eventualmente destroços metálicos, colhidas na manhã de 9 de Março no Mar do Sul da China e divulgadas dia 12 pelo "Departamento Administrativo para a Ciência, Tecnologia e Indústria de Defesa" foram propositadamente adulteradas degradando a definição e qualidade e acabaram por ser consideradas irrelevantes, segundo terá alegadamente informado no dia seguinte a embaixada da República Popular da China na Malásia.

 

Cooperação duvidosa

 

A presença entre os 227 passageiros de dois iranianos portadores de passaportes italianos e austríacos roubados na Tailândia chamou, por seu turno, a atenção para a escassa vistoria da documentação em voos locais e internacionais no Sudeste da Ásia, uma das regiões do planeta onde é vasto o mercado de falsificação de documentos pessoais.      

 

A intervenção de agências policiais, de segurança e espionagem, norte-americanas, francesas, australianas, indianas, indonésias, a par do interesse de Pequim, com 153 cidadãos a bordo, em elucidar o acontecido, tem propiciado informação até ao momento pouco esclarecedora sobre eventuais ligações criminosas ou terroristas dos 12 tripulantes e pessoal de terra envolvido na assistência ao aparelho.

 

Nenhuma suspeita foi publicitada sobre as pessoas que oficialmente se encontravam a bordo, apesar de esta semana as autoridades malaias referirem considerar a possibilidade de suicídio do piloto e/ou co-piloto, e as garantias de inexistência de pistas, aventadas por Pequim em relação aos passageiros chineses, por exemplo, acerca de eventual acto terrorista ou criminoso são demasiado peremptórias.

 

Qualquer que tenha sido o destino do voo MH370, perdido em acidente ou por acto malévolo, é desde já claro que as insuficiências em matéria de segurança aérea e a desconfiança estratégica, inviabilizando a partilha de informação essencial em situações de emergência, entre os países do Sudeste Asiático e os seus grandes vizinhos a Oriente e Ocidente é uma das pechas maiores do sistema estatal internacional.  

 

 

Jornalista

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