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21 de Novembro de 2017 às 20:25

A engenheira, pilha-galinhas e outros mais 

"Há vida além do Estado", assevera, ponderoso, o editorial do Jornal de Angola ao louvar a "veia empresarial" de Isabel dos Santos pela inauguração de uma fábrica cervejeira um dia depois da sua exoneração da Sonangol.

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Um "novo ciclo político", visando "a normalização da vida de todos nós", constata o recém-nomeado director do jornal estatal, obrigara, na quinta-feira, ao afastamento da filha do ex-Presidente numa "medida de gestão, pura e dura", sem qualquer conotação política.

 

A saúde da "galinha de ovos de ouro" estava em causa devido ao estatuto de "pessoa politicamente exposta" da filha do ex-Presidente, revela o director Victor Silva, adiantando que, naturalmente, carece de fundamento "a onda de ruído" sobre um conflito entre João Lourenço e Eduardo dos Santos.

 

A lógica do novel discurso oficial de Luanda, moralizante e implacável para quem pilha preciosas galinhas poedeiras, é em tudo semelhante à dos generais de Harare que se afadigaram para conseguir que Mugabe renunciasse à presidência.

 

Zangam-se os camaradas em Angola e no Zimbabué, rompem-se juras de fidelidade e conivências de antanho, mas tenta-se preservar a arquitectura institucional que legitima os regimes autocráticos e as cleptocracias.

 

Prosperar na continuidade, rectificando erros e punindo abusos, é objectivo declarado.

 

Os desvarios de Grace, aproveitando-se do alegado definhamento da lucidez do nonagenário esposo, foram contraponto utilíssimo para justificar a conversão ao diálogo e boa gestão dos bens públicos de lideranças civis e militares.

 

A começar por Emmerson Mnangagwa, vice-presidente de cadastro sanguinário, a ZANU escusa-se a assumir responsabilidades pelas fraudes eleitorais de 2008, os massacres da minoria Ndele na década de 80 e 27 anos de ruinoso desgoverno de Robert Mugabe.  

 

Lourenço, por sua vez, quebrou qualquer eventual pacto de segurança e imunidade que tivesse ajuramentado com a família de Eduardo dos Santos ao lançar uma purga para colocar pessoas da sua confiança nas instituições oficiais, condicionando, por tabela, toda a oligarquia negocista arrimada ao aparelho de Estado.

 

As alterações de pessoal, que implicam chantagear e obrigar ao silêncio Eduardo dos Santos até à sua substituição por motivos de saúde na presidência do MPLA, têm evitado, até agora, a abertura de inquéritos que levem a acusações criminais contra familiares do anterior chefe de Estado.

 

A generalizada corrupção dos círculos do poder joga contra procedimentos judiciais que ameacem escapar ao controlo de João Lourenço, mas a dinâmica de conflito político e de jogos de interesses apresenta o risco de dar ímpeto a movimentações alheias ao Estado.

 

O temor do retorno às violências da guerra que só terminaram em 2002 foi um dos factores limitativos da contestação ao poder, mas a juvenilização da população (metade dos angolanos têm menos de 15 anos) engrossa as fileiras dos desmemoriados da guerra insatisfeitos com a cleptocracia do petróleo.

 

A demissão de Mugabe, as agruras da insaciável e omnívora parentela de Zédu, traçam já o cenário do Congresso do ANC no próximo mês em que Nikosazana Dlamini Zuma, ex-esposa e protegida do Presidente, vai enfrentar a contestação dos militantes em guerra contra Jacob Zuma.

 

Na África do Sul, o Presidente, suspeito de envolvimento em dezenas de casos de corrupção, não poderá contar, ao contrário do que sucede em Angola e Zimbabué, com favores dos tribunais e a manipulação do poder judicial.

 

Se Zuma perder a guerra pela presidência do ANC, o partido apostará no seu afastamento da chefia do Estado antes de terminar o mandato em 2019, conforme aconteceu com Thabo Mbeki em 2008, e não terá qualquer imunidade constitucional comparável à concedida a Eduardo dos Santos.

 

Os mais recentes abusos e desvarios autocráticos na África Austral, com paralelos na Guiné Equatorial, Togo, Gabão, Uganda e Congo, confundem-se e expõem-se no seu esplendor em acasos infinitos como o registado em Harare, a 28 de Janeiro de 2000, quando Mugabe ganhou a lotaria que um banco participado pelo Estado instituiu em abono dos clientes. 

 

Foi grande a comoção do mestre de cerimónias ao ler o nome do premiado no sorteio, registou, então, o comunicado do "Zimbabwe Banking Corporation".

 

Passados mais de dezassete anos são já outros a pilhar, a viciar as regras do jogo, dos sorteios e do poder.           

 

Jornalista

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