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A demissão do Governo

Será assim de esperar que nas próximas eleições legislativas o PS inclua na sua plataforma o respeito intransigente por finanças públicas sãs e pela equidade nos aumentos salariais entre classes de funcionários públicos, sem quaisquer privilégios especiais para professores ou juízes.

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Na semana passada o Governo anunciou que se demitiria no dia 15 de maio, no caso de uma certa lei ser aprovada no Parlamento. Os detalhes da lei não era do conhecimento público quando o Governo anunciou a sua decisão.

 

A decisão do Governo parece-me boa. Num artigo que escrevi aqui no Jornal de Negócios em outubro do ano passado argumentei que o orçamento deste ano era inofensivo e portanto me parecia até adequado antecipar as eleições legislativas. O primeiro-ministro parece concordar comigo ao colocar a hipótese da demissão do Governo para debate público.

 

O último ano desta legislatura está a ser particularmente penoso para o Governo. O orçamento não traz medidas relevantes, a consolidação orçamental em termos estruturais é inexistente, e o governo não tem qualquer ideia reformista em nenhuma área da governação. Tudo é casuístico e ad-hoc. Um exemplo acabado de um governo de intendência. Para quê cumprir calendário até outubro?

 

As eleições em outubro, o seu tempo normal, só irão produzir um novo Governo mais tarde e só haverá orçamento de 2020 durante esse ano. Tudo se atrasa desnecessariamente. Se o Governo estivesse a concluir reformas seria útil a legislatura completa. Mas o Governo não se mostra motivado para as atividades normais da governação. Embora esteja satisfeito por estar em funções.

 

A demissão do Governo, por iniciativa própria, permitiria a antecipação das eleições para julho. Uma vantagem clara este ano que poderia facilitar as negociações de formação do próximo Governo e antecipar a aprovação do orçamento de estado de 2020. A próxima legislatura, se fosse estável, teria uma duração um pouco maior de quase quatro anos e meio dando mais tempo a um governo que tivesse um espírito reformista.

 

Acresce que a pressão crescente dos grupos de interesse até às eleições diminuiria certamente se o governo passasse a ser um mero governo de gestão até às eleições. O que seria um benefício financeiro com alguma materialidade. E menos risco de que os estrategas de comunicação do Governo proponham mais medidas caras e com eficácia eleitoral.

 

No plano das ideias a causa que justifica a demissão do Governo também é boa. O Governo do PS em 2019 não tolera a aprovação de medidas pelo Parlamento que coloquem em risco as finanças públicas. O PS regressa a Berlin Ocidental depois de ter aproveitado a queda do muro para viajar para leste.

 

O principal benefício da justificação da demissão, não querer dar razão às reivindicações dos sindicatos dos professores, é mostrar que o PS está agora ancorado no respeito pelas metas orçamentais como critério de gestão das finanças públicas. Claro que é curioso que os aumentos discricionários dos juízes não justifiquem nenhuma demissão, nem a redução das horas de trabalho na função pública para 35 horas semanais, nem a redução do IVA para os restaurantes, nem a gritante injustiça de aumentar os funcionários públicos a um ritmo muito mais elevado do que os demais portugueses.

 

Mais vale tarde do que nunca, porém, e é com agrado que vejo a dupla decisão do Governo: demitir-se e lutar até às últimas consequências pelo cumprimento de metas orçamentais no curto e no médio prazo. Tendo a coragem de dizer não às reivindicações dos sindicatos dos professores.

 

Será assim de esperar que nas próximas eleições legislativas o PS inclua na sua plataforma o respeito intransigente por finanças públicas sãs e pela equidade nos aumentos salariais entre classes de funcionários públicos, sem quaisquer privilégios especiais para professores ou juízes.

 

Se assim for, as eleições deste ano serão muito diferentes das de 2015. O discurso dos principais partidos será moderado e mostrará pontos de consenso na maioria dos assuntos da governação que tenham a ver com os níveis de despesa pública.

 

Venho assim juntar a minha voz àqueles que concordam com a proposta de demissão do Governo, e antecipação das eleições para julho deste ano. Por mim poderia ter sido logo em janeiro e motivos para isso teriam sido fáceis de arranjar.

 

Professor na Universidade Católica Portuguesa
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