Opinião
"You want to be Esmigalhated in Sintra?" (II)
A solução não a tenho, obviamente, como não a tinha em 2014, mas o cerne do problema parece-me evidente: enquanto se permitir o acesso automóvel à vila, a romaria acabará invariavelmente em pesadelo.
Uma hora e meia. É uma hora e meia o tempo que tem levado a percorrer de automóvel, nestes dias de Verão, a distância entre S. Pedro de Sintra e a vila de Sintra, a tal que é Património do Mundo. Há precisamente dois anos, quando escrevi "You want to be Esmigalhated in Sintra?", era uma hora e meia, também. Como era igualmente provável encontrar turistas atraídos ao jardim de Byron esmigalhados contra as paredes, carrinho de bebé enfiado na valeta por falta de passeios, em fila indiana engolindo animadamente o fumo dos escapes dos autocarros que, uns atrás dos outros, peregrinam, irredutíveis, para o centro histórico. E, como no "episódio" anterior a correrem o risco real (já presenciei!) de serem atropelados.
Como continua a ser uma aventura encontrar uma caravana em sentido contrário junto da Quinta da Regaleira, ou um engarrafamento no percurso de retorno porque uma camioneta não passa entre carros mal estacionados (e o reboque está impossibilitado de chegar pela mesma razão, para não falar num carro de bombeiros ou de uma ambulância!).
A solução não a tenho, obviamente, como não a tinha em 2014, mas o cerne do problema parece-me evidente: enquanto se permitir o acesso automóvel à vila, a romaria acabará invariavelmente em pesadelo. Mas, pelos vistos, é o que se continua a pretender, ao ponto de - novidade desta sequela - se instalarem semáforos frente ao Palácio! Semáforos que piscam animadamente a cor-de-laranja, aparentemente porque não é possível controlar essa coisa tão incómoda como são os turistas apeados.
Fizeram-se, entretanto, algumas coisas mais inteligentes do que essa, é justo dizê-lo. Na entrada do Ramalhão, junto da bomba da BP, há um cartaz a sinalizar dois parques, e uma indicação pintada na estrada aponta na sua direção - que segui, encontrando primeiro um junto do edifício da CMS na Portela, e o segundo frente à estação dos comboios, também da Portela - de onde é possível apanhar transporte para a vila. Infelizmente, no domingo em que os vi estavam praticamente vazios, porque os presumíveis "inquilinos" tinham seguido a seta que indica Centro Histórico, e iam passar o dia presos no trânsito.
É óbvio que os responsáveis pelo trânsito em Sintra não têm nem culpa da ignorância, nem da falta de civismo dos portugueses, mas decidi fazer uma pesquisa no Google, com a frase "Estacionamento em Sintra", em busca de indicações que pudessem ajudar um visitante a perceber, de antemão, onde estacionar. Cheguei, finalmente, ao site "Sintra, capital do romantismo," aparentemente da CMS, e aí, com choque confesso, entendi porque estão condenados ao fracasso os polícias destacados (são mais), os picoletos para impedir estacionamento (em mais sítios e mais numerosos), as fitas vermelhas, e todas as outras medidas que se têm tentado implementar. É que em lugar de se anunciar que não há estacionamento no centro histórico, dissuadindo o tráfego, declara-se: "Agora é mais simples estacionar em Sintra". Isso mesmo. Para se passar a discorrer sobre os benefícios do novo sistema de pagamento móvel na - exatamente - "zona da vila de Sintra" que, imagine-se, permite que "pague e/ou prolongue o seu estacionamento remotamente, sem se preocupar com o tempo que vai demorar". Para além do crime de incentivar mais trânsito, ainda se subverte o conceito que, julgava eu, presidia à origem dos parquímetros: limitar a permanência, em lugares desejados por muitos. Faz pena.
Jornalista
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