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01 de Fevereiro de 2018 às 19:58

Entre "The Post" e o mundo actual

Houve um tempo em que o jornalismo era considerado o "quarto poder". Era temido e era um contraponto ao que se escondia por detrás das cortinas dos salões da Corte.

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Muitos filmes poderosos mostraram-nos o bom e o mau do jornalismo, da investigação credível à manipulação. Houve "Todos os Homens do Presidente" de Alan J. Pakula sobre a investigação do escândalo Watergate e "Citizen Kane", onde Orson Welles faz de William Randolph Hearst, o magnata capaz de construir ou destruir a reputação de qualquer pessoa, fosse ela inocente ou culpada. O estilhaçar do mundo comunicacional, com a entrada em força das redes sociais, que permitiu a criação de uma guerra civil constante em torno de tudo e de nada, mostra que esse velho mundo acabou. O Facebook, como Google, é uma empresa que refina, agrega e vende a informação pessoal e a "data" dos seus utilizadores a anunciantes. Isto permite acumular um valor de receitas assinalável, um "ganso gordinho". Por isso Mark Zuckerberg não quer impor limites à "liberdade" desta última fronteira digital, onde todos podem ser pistoleiros e poucos poderão ser xerifes.

 

"The Post" é uma relativa desilusão, apesar de aquecer o coração daqueles que vêem ali um reflexo dos "anos de ouro" do jornalismo. Nesse aspecto Steven Spielberg é um mestre: ele sabe colocar uma lágrima no canto do olho de todos, seja como "E.T." ou "The Post". Este é um filme sobre a história da publicação de alguns relatórios internos do Pentágono que revelavam o conhecimento de vários presidentes dos EUA (incluindo John F. Kennedy) de que a Guerra do Vietname estava perdida desde o início, o que, não impediu, em nome da luta contra o comunismo, ali perdessem a vida 58 mil soldados norte-americanos e cerca de 1,5 milhões de vietnamitas (a maioria civis). "The Post" tem diversas lacunas: Meryl Streep é muito pouco convincente como Katharine Graham, a oscilante dona do "Washington Post". E os dilemas fundamentais (o conflito entre o jornalismo e a História, onde encontramos Abe Rosenthal, Bem Bradlee e Robert McNamara em lados opostos da barricada, e a guerrilha entre a segurança nacional e a mentira pública) são retratados superficialmente. E tudo se reconduz a uma luta entre jornalistas bons e políticos maus, que acaba com a vitória dos primeiros devido à acção de Katherine, como se esta fosse uma deusa. Mas talvez seja esta superficialidade que faz com que as pessoas se comovam com "The Post".

 

É desta forma que o filme representa estes dias, onde tudo é espuma, onde nada é tratado de forma sóbria, coerente e minimamente objectiva. Nesse tempo a guerra era entre o poder político que queria evitar a difusão de informações e a imprensa, que quer fazer o contrário. Mas hoje, na realidade, as questões são outras e não se centram no que o poder político não deseja ver publicado. Hoje o problema tem a ver com as mentiras que o poder (num sentido alargado) difunde. A economia da verdade, tratada por gurus da comunicação, tornou-se um factor central de discussão nos sistemas democráticos. Numa época de debilidade da comunicação social, "The Post" levanta novas questões. Muitas delas com reflexo no que sucede em Portugal por estes dias.

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