Opinião
Coletividades de cultura, recreio e desporto: o lado menos visível da economia social
As coletividades de cultura, recreio e desporto, a par dos montepios e depois das cooperativas e das associações de classe, foram as primeiras formas de associativismo decorrente do iluminismo e da revolução industrial. Temos notícia de agrupamentos musicais ainda no século XVIII.
Na ditadura salazarista, foram estas entidades que fizeram "a concorrência ao modelo cultural salazarista. (…) De facto, as coletividades independentes representaram um polo fundamental de oposição ao modelo oficial devido à sua capacidade em gerar alternativas culturais de alcance político, fossem elas geograficamente localizadas ou de projeção nacional. Assim o entendia o próprio regime, que lhes moveu uma perseguição persistente e que tentou, pela omissão, discriminação, repressão ou concorrência, cercear um movimento adverso à sua ambição de tudo enquadrar e controlar na esfera pública"(1).
Na nova ordem sociopolítica saída do 25 de Abril de 1974, com a recuperação da democracia, verificou-se um aumento em número destas entidades por todo o território nacional.
Dada a história e o papel desempenhado por estas entidades, os constituintes trouxeram as "coletividades de cultura e recreio" e "coletividades desportivas" a colaborar com o Estado, no sentido de que todos tenham acesso à cultura, ao recreio e ao desporto (artigos 70.º, 73.º e 79.º da Constituição da República Portuguesa).
Estas disposições constitucionais não tiveram desenvolvimento legislativo no que respeita às coletividades de cultura, recreio e desporto.
A Lei de Bases da Economia Social (LBES) considera como entidades da economia social "as associações com fins altruísticos que atuem no âmbito cultural, recreativo, do desporto e do desenvolvimento local".
Por aqui se fica o edifício legislativo quanto às coletividades de cultura e recreio, com exceção da iniciativa parlamentar: Lei n.º 34/2003 de 22 de Agosto - Reconhecimento e valorização do movimento associativo popular e Lei n.º 20/2004 de 5 de Junho - Estatuto do Dirigente Associativo Voluntário, apesar de a LBES determinar a revisão dos regimes jurídicos aplicáveis às entidades da economia social, num prazo que terminou em dezembro de 2013.
O manto sobre esta realidade social continua a ser uma evidência, não obstante o órgão de cúpula deste tipo de associativismo, a Confederação Portuguesa das Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto, ser uma das entidades constituintes do Conselho Nacional da Economia Social, do Conselho Nacional do Desporto e, mais recentemente, do Conselho Económico e Social. Por sua vez, as Contas Satélite das Instituições sem fim lucrativo (2011) e da Economia Social (2013), elaboradas por CASES/INE, vieram mostrar que cerca de 50% das entidades da economia social são associações de cultura, recreio e desporto, ultrapassando 30 mil entidades.
Estas entidades continuam, nos lugares mais recônditos, a colaborar com o Estado, a fazer teatro, a iniciar e fazer música, a formar desportistas, em diversas modalidades, a defender a nossa cultura, ou simplesmente como local de encontro.
(1)Melo, Daniel de (1999). O Associativismo Popular na Resistência Cultural ao Salazarismo: A Federação Portuguesa das Coletividades de Cultura e Recreio. Penélope 21, pp. 95-130.
Encontro 10 anos Ecosol-CES
Nos dias 22 e 23 de maio, tem lugar na Sala Keynes da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra o encontro "Construir juntos a Economia Solidária", para comemoração dos 10 anos do Grupo de Estudos sobre Economia Solidária do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (Ecosol-CES). Neste evento vão participar académicos, ativistas e instituições da economia social e solidária com o objetivo de celebrar o aniversário do grupo, mas também de reflectir sobre o associativismo e a economia solidária em Portugal. A inscrição é gratuita, mas obrigatória.
Portugal Economia Social
Realiza-se nos dias 23 e 24 de maio, no Centro de Congressos de Lisboa, o Portugal Economia Social - 3.º Encontro de Empreendedorismo e Inovação na Economia Social.
Trata-se de uma iniciativa da Fundação AIP, com o alto patrocínio da Presidência da República e o apoio de diversas entidades, entre as quais a Associação Mutualista Montepio Geral. Este evento pretende mostrar e estimular o potencial da economia social e visa fortalecer e qualificar a economia social pela via do desenvolvimento sustentável, da coesão económica e do estabelecimento de redes e parcerias.
Dirigente Associativo Voluntário. Assessor da Direção da CPCCRD
Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico