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09 de Fevereiro de 2020 às 19:45

Pôr água na fervura

A questão é simples: ou encontramos as fórmulas de convivência e compatibilização dos interesses ou andamos irresponsavelmente para o fim do mundo tal como o conhecemos.

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Aos 86 anos posso afirmar, com alguma segurança, que depois da 2.ª Guerra Mundial, que incluiu o lançamento no Japão da primeira e única bomba atómica, o mundo, em todos os seus quadrantes, nunca assistiu a tanta agitação e confusão perigosas.

Hoje funcionam defensores extremados de pontos de vista opostos, como, por exemplo, os que afirmam que nunca houve tanta prosperidade dos povos como daqueles que afirmam a existência de uma enorme fossa entre os poucos mais ricos e os milhões de pobres.

Temos o debate do clima, em que na prática os descrentes vinham levando vantagem até que apareceu uma mulher de 16 anos para reequilibrar a opinião pública. Atualmente, governos e o setor privado assumem responsabilidades na procura da contenção do aquecimento global.

Ninguém personaliza melhor todas estas contradições do que Donald Trump, o Presidente dos Estados Unidos, que inverteu todos os critérios sobre as qualidades de um homem público, legitimando a mentira, o interesse pessoal e o narcisismo como atributos consagrados pelo eleitorado, enquanto introduz soluções que estimulam a economia a curto prazo.

O Presidente dos Estados Unidos inverteu todos os critérios sobre as qualidades de um homem público.

A Europa perdeu a Grã-Bretanha, um dos seus principais parceiros, conduzida por um intelectual pândego que tem como afinidade com Trump o penteado.

A Alemanha, motor da economia europeia mas um pigmeu político, disputa com França a liderança de um projeto que se apresenta descosido.

O Brasil, diante do fracasso do processo democrático e mergulhado na corrupção e insegurança, entrega-se nos braços da extrema-direita. Enquanto a Venezuela, desesperada por motivos parecidos, mantém no poder um tirano de extrema-esquerda, perdendo virtualmente milhões de cidadãos que fogem desesperados pelas matas dos países vizinhos.

Enquanto isso, as novas tecnologias vão tomando conta da produção e do comércio através de organizações como a Amazon, que já contribuiu nos Estados Unidos para o fechamento de 30% das lojas nos antigos bastiões das compras das famílias que são os shopping centers.

A gigantesca mobilidade das populações permite que as epidemias também sejam viajantes, ainda que sem documentação.

Os conflitos em lume brando no Médio Oriente continuam, com geometria variável.

Penso que a única maneira de trazer a serenidade e equilíbrio é que realmente sejam negociados entre as nações e as instituições acordos de limites tanto para os conflitos como para o progresso.

A bomba atómica só foi lançada uma vez porque a humanidade compreendeu que mais que um processo de destruição, se tratava de um processo de autodestruição.

As atuais simulações de negociações entre os países ocidentais e orientais, tais como a Coreia do Norte e o Irão, são exercícios de exibicionismo político para consumo interno de cada um dos participantes, mas tem o mérito na prática de deitar água na fervura.

As Nações Unidas, que nunca voltaram a ter um líder como Dag Hammarskjöld, têm hoje um homem, António Guterres, que é especialmente dotado para coordenar um processo de pacificação dos confrontos e de limitação dos perigos que ameaçam a humanidade no seu todo, tais como o aquecimento global e a robotização que põem em risco indiscriminadamente muitos empregos em todo mundo.

Temos de aproveitar a experiência das estruturas internacionais existentes, evitando a criação de novas burocracias.

Não é a proposta ingénua do economista francês Piketty de oferecer um ordenado em vez de um emprego a todos que não explica de onde virá o dinheiro para isso e o que fazer para colmatar o desespero gerado pelo ócio.

A questão é simples: ou encontramos as fórmulas de convivência e compatibilização dos interesses ou andamos irresponsavelmente para o fim do mundo tal como o conhecemos.

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