Opinião
Esperança de vida para além da economia
O debate político-eleitoral nos países que têm eleições democráticas tem-se centrado na economia nas últimas décadas.
Os candidatos prometem criar milhares de empregos, baixar os impostos, fomentar o crescimento económico.
Em muitas eleições não é a oposição que ganha as eleições, é o partido do governo que as perde por não ter cumprido essas mesmas promessas.
Apesar de ter tido uma performance excepcional na economia, inclusive equilibrando o orçamento, o candidato de Clinton à sua sucessão, Al Gore, perdeu para George W Bush que prometeu o crescimento económico através da liberalização do sistema financeiro. Foi o que se viu e que ainda continua.
É notável a quantidade de analistas nos medias mundiais que, nos últimos dias, explicam as razões do tsunami que a revolta popular provocou no Brasil, acontecimento que não previram.
Há poucos dias, durante a sua visita a Lisboa, a presidente Dilma Rousseff não apresentou nenhum sinal de inquietação quanto à situação interna no Brasil. Dilma gozava de índices record de popularidade.
Eu próprio, quando instado a explicar porquê os repetidos escândalos de corrupção não tinham consequência, respondia que o combate a este flagelo dependia da vontade popular, a qual no Brasil ainda apresentava um enorme grau de tolerância nesta matéria.
Grande engano da minha parte, possivelmente justificado pela distância do contacto com o país real.
Desde a minha juventude considerei que o povo brasileiro reunia condições para liderar a alteração de paradigmas sociais a nível mundial.
A mistura de origens étnicas, a ausência de intolerância religiosa ou racial (não confundir a discriminação económica com racismo, num país que somente aboliu a escravatura no limiar do século XX). O desenvolvimento educacional e cultural proporcionam as condições para a criação de uma sociedade melhor.
Os eventos dos últimos dias anunciam um progresso civilizacional profundo, onde os valores da ética e da igualdade prevalecem.
É um avanço extraordinário que augura uma evolução complexa e tumultuosa, como são historicamente as grandes transformações sociais e políticas.
A decantada criação de uma nova classe média, uma originalidade económica introduzida por Lula da Silva, foi financiada pelo grande surto de valorização dos "commodities" nas quais o Brasil é muito rico, na agricultura e nos minérios. Esta valorização foi produto do grande desenvolvimento económico em consequência da globalização. Como é óbvio, a opção pelo social sacrificou os investimentos na infra-estrutura.
Com o arrefecimento da economia global todos os pressupostos económicos entraram em questionamento, e os especialistas dos governos e dos organismos oficiais não conseguem sair do seu labirinto.
Trata-se de um sinal de grande mudança quando um movimento desta magnitude, e que ameaça alastrar pelo mundo, tenha começado pela indignação contra o investimento no futebol no país que é a sua casa mãe, tendo sido o Brasil campeão mundial cinco vezes.
Empresário
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