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02 de Janeiro de 2017 às 12:30

2017 devia ser melhor que 2016

O ano de 2017 está cheio de perigos na cena internacional, e a incerteza é a regra dentro da Europa e nas suas fronteiras. Ciente deste facto, o Governo vai já ensaiando o discurso de que, se alguma coisa vier a acontecer, a culpa será do exterior, das crises, dos populismos, do terrorismo, ou de qualquer outra razão que não a sua própria atuação. É triste, é preocupante, mas infelizmente não é novo.

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Por inacreditável que pareça, quase 6 anos depois do pedido de resgate feito pelo anterior executivo socialista, continuamos a ouvir a maioria de esquerda, e os seus reflexos no espaço mediático, defender que a culpa da falência do Estado foi do exterior, foi da crise financeira, e sobretudo foi da aplicação do programa de ajustamento que o país teve de aceitar em contrapartida do dinheiro que mais ninguém nos emprestava. Para lá da retórica política, acriticamente ecoada por demasiadas vozes no espaço público, fica a profunda preocupação sobre o que tal significa: se não reconhecem os erros cometidos, não evitarão a sua repetição.

No final do mandato do Governo PSD/CDS, Portugal tinha recuperado o seu ativo mais precioso: a confiança de agentes internos e externos e o reconhecimento e apreço dos nossos parceiros europeus. As profundas divisões que se vão alargando na Europa levam ao arreigar de preconceitos e a divisão entre o Norte e o Sul acentua-se. A Europa precisa de um caso de sucesso entre os países do Sul, e Portugal esteve na melhor posição para assumir esse papel e seria por essa via o maior beneficiado. Por muito que a maioria alimente os preconceitos e a divisão entre Norte e Sul, culpando a Alemanha pelas responsabilidades que lhe cabem, mas também por aquelas que devíamos ser nós a assumir, a verdade é o que é: interessa à Alemanha que Portugal tenha sucesso, mas interessa muito mais a Portugal.

Os elogios dos parceiros europeus a Portugal tiveram tradução muito concreta na nossa realidade: os juros da dívida pública baixaram, o investimento estrangeiro aumentou, a atividade económica acelerou. São estes resultados negativos para os portugueses? Não. Então porquê a diabolização dos elogios ao nosso país?

Sabendo todos que são muitos os perigos do enquadramento externo, não seria de esperar que o Governo de Portugal fizesse o necessário para colocar o país em melhor posição de enfrentar desenvolvimentos adversos? Não deveria o Governo aproveitar a política do Banco Central Europeu, a condescendência da Comissão Europeia, os preços baixos do petróleo, para reforçar a posição de Portugal nos mercados, para substituir dívida mais cara por dívida mais barata, para fazer da confiança e credibilidade a bandeira do nosso país no exterior? Não deveria o Governo prosseguir as políticas necessárias ao crescimento económico, à criação de riqueza que depois deveria ser distribuída pelos portugueses? Não deveria o Governo ter aproveitado as condições de mercado, que já foram bem mais favoráveis, para reforçar a sustentabilidade da dívida?

Mas o que faz o Governo e a maioria que o suporta? Com as suas opções políticas, reduziu o crescimento económico, e as previsões mais recentes do Banco de Portugal prevêem que até 2019 o crescimento anual seja sempre inferior ao verificado em 2015. Com as suas opções políticas, aumentou a despesa pública e os impostos para a financiar, por ter distribuído riqueza que não criou nem proporcionou condições para o crescimento futuro. Com as suas opções políticas, colocou o investimento público no nível mais baixo desde a década de 1950, colocou os serviços públicos em situações críticas nunca vistas antes. Com as suas opções políticas, colocou as taxas de juro da dívida pública portuguesa em níveis relativos que só encontram paralelo no final de 2010.

A estratégia orçamental do Governo em 2016 irá continuar em 2017. O cumprimento das metas do défice consegue-se à custa de receitas extraordinárias, logo irrepetíveis, e de contenção artificial na despesa. Certamente que também em 2017 haverá planos B e C, como houve este ano, mas sem a transparência que um verdadeiro escrutínio democrático exigiria. Onde irão recair desta vez? Um novo perdão fiscal não será possível, a reavaliação dos ativos das empresas (tão conveniente para as grandes empresas do sector da energia) traduzir-se-á numa receita de IRC menor no futuro. Todos os contribuintes devem ficar preocupados, não faltarão as intenções de "ir buscar dinheiro a quem o acumulou", e nem será preciso "perder a vergonha", porque manifestamente isso é algo que a maioria já perdeu há muito, se é que alguma vez a teve. As "cativações", designação pela qual passaram a ser referidos os cortes cegos, repetem-se no próximo ano e os seus efeitos, que já são visíveis agora na educação, na saúde, nos serviços prisionais e um pouco por toda a administração pública, vão continuar. Acresce a decisão, puramente eleitoralista, de proceder a aumentos extraordinários de pensões e integração de funcionários nos quadros da administração pública, por altura das eleições autárquicas, elevando o patamar de despesa para 2018.

Até quando será sustentável esta estratégia? A cada ano que começa, a despesa está mais elevada, os impostos são mais e mais pesados, e o crescimento económico continua a não ser suficiente para sustentar este caminho.

Os mercados estão atentos. Ouvem a Comissão Europeia e o seu apoio, mas ouvem também os analistas que alertam para os riscos e fragilidades, têm em conta a provável inversão da política do BCE, mais cedo que tarde, e não arriscam a comprar a nossa dívida. Ao mesmo tempo, os parceiros do Governo insistem na reestruturação da dívida e são secundados por vozes do núcleo duro do Governo. Que devem pensar os investidores? Que ao mesmo tempo que Portugal lhes pede que confiem na sua divida pública, vai avisando que talvez não recebam de volta o dinheiro nas condições prometidas. Alguém se pode surpreender com o facto de as taxas de juro da dívida pública portuguesa estarem cada vez mais altas? Só mesmo quem ache que quem investe milhões e tem alternativas não sabe o que anda a fazer e ignora os avisos que lhes vão sendo dirigidos.

O Governo já vai ensaiando o discurso. Apregoa que tudo está a correr pelo melhor, mas lá vai dizendo que há coisas que não dependem de nós, que há riscos do exterior. O Ministro Vieira da Silva veio dizer "se houver um estremeção nos juros da dívida, dependemos sobretudo mais dos poderes europeus que dos nossos". Pois, já percebemos que se alguma coisa acontecer, quando acontecer, não será responsabilidade deste Governo e desta maioria…

É verdade que uma pequena economia aberta, endividada e com fragilidades estruturais, integrada no mercado único europeu, está mais exposta a choques externos. Mas para que querem os Portugueses um Governo, senão para os defender destes riscos e proteger o país? Um Governo responsável estaria a aproveitar as boas condições que herdou da governação anterior para promover o crescimento, reduzir o custo da dívida pública e reforçar a confiança que os Portugueses tanto lutaram para reconquistar.

A bem de todos nós, esperemos que nada de mais grave aconteça, mas se vier a acontecer, mesmo que a causa imediata seja exterior, é bom que a maioria perceba desde já que sabemos todos bem quem tem a responsabilidade porque podia e devia ter feito diferente.
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