Opinião
A venda menos má do BES menos mau
Depois da resolução do Banco Espírito Santo, nos media convencionámos chamar o Novo Banco de "BES bom" e o resto, as cinzas, de "BES mau". A classificação, como percebemos hoje, era errada. O Novo Banco era o "BES menos mau".
1. Depois da resolução do Banco Espírito Santo, nos media convencionámos chamar o Novo Banco de "BES bom" e o resto, as cinzas, de "BES mau". A classificação, como percebemos hoje, era errada. O Novo Banco era o "BES menos mau". A carteira de crédito herdada do BES saiu ainda pior do que se previu na resolução e a indefinição constante, inerente a um banco de transição, roubou credibilidade e, com ela, bons clientes e bons profissionais. Dentro do Novo Banco o chamado "side bank" concentrou a parte má do que chamávamos de "BES bom". Dificilmente uma coisa "menos má" pode gerar uma venda boa - e a venda do Novo Banco, ainda longe de estar garantida pelo menos nos termos em que foi anunciada, não é excepção.
2. A venda não é boa porque aumenta a já grande exposição dos contribuintes ao Novo Banco. Nos primeiros 3,9 mil milhões que emprestou em 2014 ao Fundo de Resolução, o Estado já perdeu cerca de metade quando o Governo estendeu a maturidade do empréstimo e baixou as taxas de juro. A venda do banco por zero euros nada abate à dívida remanescente. Pior: expõe o Fundo de Resolução até mais 3,9 mil milhões de euros em perdas. Será, novamente, o Estado a endividar-se para emprestar ao Fundo - se a garantia for accionada até ao limite não é difícil imaginar mais um perdão de dívida lá à frente. O maior contribuinte para o Fundo é a Caixa: outra fonte, indirecta, de exposição pública.
3. A venda não é boa porque surpreende, por outro lado, os credores institucionais e estrangeiros do banco - isto já depois da surpresa no final de 2015 para alguns credores do Novo Banco. Não admira que a emissão de dívida subordinada da Caixa tenha sido feita antes: o juro a pagar teria sido ainda maior do que 11%. A operação de troca de dívida acontece porque nem o Lone Star quer pôr mais capital, nem o Estado quer arriscar mais dinheiro público - arranja-se esta ideia de partilha do fardo com os privados, que é do agrado de Bruxelas e de Frankfurt. Mas os privados desconfiam que um negócio desta importância não vai abaixo por 500 milhões e sabem que o poder negocial do Estado é baixo - a adesão está longe de ser garantida e nesse caso deverá ser o Estado, uma vez mais, a tapar o que falta. Resta saber porquê correr o risco de danificar ainda mais a imagem externa portuguesa por 500 milhões de euros.
4. Tendo em conta o perfil agressivo do único comprador que realmente se chegou à frente (um fundo abutre que faz o lucro na compra), a situação financeira do banco de transição e a ameaça de liquidação, são injustas as críticas à equipa negocial do Banco de Portugal liderada por Sérgio Monteiro. A proposta do Lone Star a 4 de Janeiro era bastante pior do aquilo que temos hoje - incluía, por exemplo, uma garantia directa sobre perdas de um conjunto de activos avaliados em oito mil milhões de euros - e foi negociada em todos os pontos. À esquerda acenam com uma alternativa inviável em Bruxelas (a nacionalização que o PS chegou a agitar entusiasticamente) e à direita criticam sem explicar como se podia fazer melhor nestas circunstâncias.
5. Não se deve confundir "possível" com "bom". As explicações do primeiro-ministro foram tipicamente solarengas e prolongam a mentira de que o contribuinte sai ileso - uma garantia infundada desde o início, quando foi dada pelo anterior Governo. Há problemas com o modelo de banco de transição de que fomos cobaia, mas dificilmente o colapso de um banco com a relevância do BES não teria custos desta grandeza para o erário público.
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