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03 de Junho de 2021 às 17:09

Sentimento social dominante

Seja no apoio a decisões políticas, na pressão à economia, na construção de audiências ou na evolução dos hábitos de consumo, ganha quem entender mais depressa qual o momento e conteúdo adequados.

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Nas eleições gerais no Reino Unido, em 1992, todas as sondagens realizadas antes e no dia da votação davam a vitória ao Partido Trabalhista, e, no entanto, o Partido Conservador ganhou. No rescaldo deste fiasco, as empresas de sondagens justificaram o erro com uma sobreposição imprevisível de fatores: mudança tardia da intenção de voto; os eleitores do Partido Conservador tiveram menos inclinação para participar em sondagens; e “vergonha” de assumirem votar num partido que atravessara um período de elevada impopularidade.

Com esta aprendizagem, as empresas de sondagens reviram a sua metodologia. Uma das soluções foi questionar o eleitor qual o partido em que haviam votado nas eleições anteriores, por existir, neste caso, menos relutância em assumir o voto. As sondagens passaram a ser publicadas com e sem esta ponderação. Por outro lado, concluíram que as sondagens automáticas e online eram as mais fiáveis. Contudo, em 2015 esta situação repetiu-se, uma vez mais a favor do Partido Conservador, a quem davam uma vitória escassa e que alcançou a maioria.

Nesses casos não foi possível saber se e qual a importância que as sondagens tiveram na mudança da intenção de voto, mas é evidente a sua influência na comunicação política. Longe vai o tempo em que se podia definir uma estratégia eleitoral, um calendário de comunicação e esperar os resultados, independentemente da opinião pública. A capacidade de prever o comportamento do eleitorado é um instrumento político importante, e que pode ser explorado ao limite de ajustar a resposta às suas expectativas, de dizer a cada um aquilo que quer ouvir.

As redes sociais são o principal veículo de auscultação de comportamentos sociais, e permitem experimentar diferentes abordagens em grupos-alvo restritos. Mas este poder de influência não está circunscrito à política. Aliás, os seus efeitos podem ser mais abrangentes noutras áreas, como aconteceu recentemente com as criptomoedas. Este exemplo seria melhor se as criptomoedas não fossem um ativo volátil, por outro lado é apropriado precisamente pelo facto de as criptomoedas serem mais suscetíveis a comportamentos sociais erráticos.

Como é sabido, um tweet de Elon Musk a anunciar que a Tesla teria adquirido 1,5 mil milhões de dólares em bitcoin fez disparar a sua valorização em mais de 400%, para valores sem precedentes. Poucos meses mais tarde, o anúncio de que a Tesla não aceitaria bitcoin como forma de pagamento fez baixar esse crescimento para menos de metade. Em simultâneo, a menção num tweet de outra criptomoeda, dogecoin, e quando foi anfitrião do Saturday Night Live na NBC, fez disparar a sua valorização em mais de 1000%. Não é difícil perceber os ganhos que o próprio terá tido com este exercício de influência.

A valorização de uma criptomoeda está relacionada com a “massa” financeira que a suporta, ou seja, com a “quantidade” de dinheiro fiduciário que compreende a sua transacionalidade futura, o que a torna muito apetecível nestas circunstâncias como instrumento especulativo. As redes sociais, com destaque para o Youtube e Twitter, abundam em influenciadores nesta área, que produzem conteúdos de tendências, muitas vezes com exposição dos seus próprios portefólios. O mesmo efeito foi tentado no início do ano com a antecipação de uma queda acentuada das bolsas, e que alguns analistas disseram ser a tentativa de criar uma queda especulativa, isto apesar do risco que existe de facto, decorrente da inflação.

No entretenimento, a opinião do público determina os conteúdos que são produzidos, não apenas nos produtos televisivos a desenvolver, mas nos atuais. Alguns destes programas avaliam a recetividade de cada episódio, atratividade dos protagonistas, e ajustam a narrativa à tendência. As próprias revistas escolhem o tema de capa consoante a venda das edições anteriores. Até aqui não há novidade. Ajustar o produto à procura, conhecer o mercado, antecipar o interesse do consumidor, são ferramentas conhecidas do marketing.

António Damásio defende que todas as decisões humanas estão enraizadas numa emoção. Timothy Wilson, estudioso do autoconhecimento, argumenta que os processos mentais de decisão acontecem no subconsciente, ou seja, estimulados por fatores que não são possíveis de controlar. A sua aplicação na publicidade consiste na capacidade de criar padrões de associação, com uma componente emocional e em ambientes de baixa atenção. O consumidor está pronto a consumir, o seu comportamento está latente e aguarda um estímulo.

Pelo contrário, os sentimentos sociais caracterizam um momento. Neste período particular da história da humanidade, não é suficiente perceber qual é o sentimento social dominante, que varia entre cansaço, ansiedade e incerteza, mas como este sentimento pode influenciar os comportamentos individuais. Seja no apoio a decisões políticas, na pressão à economia, na construção de audiências ou na evolução dos hábitos de consumo, ganha quem entender mais depressa qual o momento e conteúdo adequados.

 

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