Opinião
O pecado capital do banqueiro
A justiça demorou a acusar Ricardo Salgado pelo desastre do BES e do GES, mas o retrato que a acusação faz do antigo dono disto tudo é arrasador. Entre os 65 crimes, o antigo banqueiro, que foi durante anos o homem mais poderoso de Portugal, é indiciado por liderar uma associação criminosa.
Quase seis anos após a resolução do Banco Espírito Santo e da queda do império GES, Ricardo Salgado e mais 17 outras pessoas são acusadas pelo Ministério Público. Entre os 65 crimes apontados ao antigo dono disto tudo (DDT) está o de associação criminosa. A julgar pelo que está a acontecer a outro processo desta dimensão e no qual o banqueiro também é acusado, o processo Marquês, vão ser longos anos em que os visados neste processo vão ter de lidar com a justiça. Com 76 anos, Ricardo Espírito Santo Salgado, que durante mais de uma década foi o homem mais poderoso de Portugal, arrisca a passar o resto da vida nas barras dos tribunais. Para alguém que uma vez citou um ditado chinês perante uma comissão parlamentar de inquérito: "O leopardo quando morre deixa a sua pele. E um homem deixa a sua reputação", não vai ter grande coisa para deixar depois de tantos milhões que ganhou e de muitos mais que desbaratou.
É um triste fado português que as pessoas que tiveram mais poder e mais influência na primeira década deste milénio se encontrem em conflitos com a justiça. Esses são os anos em que a ilusão do dinheiro fácil, enquanto a economia real já se debatia com muitos estrangulamentos e o PIB tendia a estagnar, possibilitou muitos golpes e um enriquecimento de pequenos grupos. Esse tempo é a antecâmara do resgate externo do país e também do desmoronamento do maior império financeiro português, que como se sabe agora tinha pés de barro.
Cabe à justiça seguir o curso deste processo, mas o que está na acusação revela um esquema de obtenção de rendas e de maquilhagem de contas para manter o fluxo do dinheiro que garantia a continuação do poder de Ricardo Salgado no grupo e neste país. Para um banqueiro, herdeiro de uma dinastia financeira, Ricardo Salgado cometeu um pecado capital: vendeu a clientes gato por lebre para salvar a pele.
Não é preciso ter grande memória para saber que até ao descalabro, quer nos governos liderados pelo PS ou pelo PSD, Ricardo Salgado conseguia colocar ministros e secretários de Estado em lugares determinantes.
Mas Ricardo Salgado só conseguiu manter o poder durante tanto tempo, porque contou com a colaboração complacente das autoridades de supervisão que deveriam ter chumbado operações que destruíram o banco, o Grupo Espírito Santo e a PT. Quando o banqueiro foi apanhado na operação Monte Branco, não devia ter condições para continuar a gerir os destinos do maior grupo financeiro nacional.
Os milhares de lesados do BES que confiaram no nome de um banco centenário e no prestígio de um nome que em Portugal era sinónimo de banca têm razões de queixa da atuação do Banco de Portugal, porque permitiu que nos balcões de uma instituição na qual confiavam fossem vendidos produtos tóxicos.
Mas no fundo todos somos lesados do BES, quer pelos custos que pagamos pelos buracos herdados, quer pelo efeito negativo que este golpe teve na economia portuguesa.
Saldo positivo: Sérgio Conceição
O FC Porto é um justo campeão nacional de futebol num campeonato atípico. O maior artífice desta conquista é Sérgio Conceição, que soma mais um título, numa época em que no Dragão muitos chegaram a deitar a toalha ao chão após perder a Taça da Liga e da derrota perante o Sporting de Braga. O jogo da segunda volta contra o Benfica foi a chave da reviravolta. Sérgio Conceição teve o mérito de nunca desistir e manter a equipa unida no objetivo. Uma lição de vida.
Saldo negativo: revisão do défice
O ministro das Finanças já confirmou a revisão em alta da meta do défice orçamental para 7% do PIB. João Leão admite fazer um novo Orçamento suplementar, se for necessário, porque a evolução económica está a arrasar as receitas do Estado e a fazer disparar as despesas. O tsunami provocado pela pandemia não dá sinais de alívio, a economia está em coma, os milhões de Bruxelas demoram, o desemprego aumenta. Demoram os sinais para uma desejada retoma económica.
Zeca Baleiro e as canções portuguesas: algo completamente diferente
O músico brasileiro Zeca Baleiro lançou um álbum com canções portuguesas, de Sérgio Godinho, Jorge Palma, Zeca Afonso, Fausto, Vitorino, António Variações, Rui Veloso, Pedro Abrunhosa, Ornatos Violeta, entre outros. "Canções de Além Mar" é uma ponte de dois países que, apesar de partilharem a mesma língua, estão cada vez mais de costas voltadas a nível cultural. Mas independentemente destes laços transatlânticos, vale a pena ouvir as canções pela sua qualidade. Boa música portuguesa, com um sotaque mais doce.