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Igualdade de género: Os tectos de vidro da gestão de topo

É na administração de empresas que os avanços no domínio da igualdade de género têm sido mais lentos.

16 de Março de 2016 às 10:15
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As gravatas ainda dominam os conselhos de administração e os lugares de topo das empresas e organizações. Hermínia Ibarra, professora da escola de negócios Insead, diz que, em média, entram nas empresas 50% de mulheres mas, nos níveis intermédios, a participação cai para 30%, na gestão de topo fica apenas 15% e na presidência as mulheres ocupam apenas 4% dos cargos.

Em Portugal, "o número de mulheres na administração de empresas em Portugal, apesar de ter vindo a crescer nos últimos anos, é ainda muitíssimo reduzido e abaixo da média da União Europeia. E mais reduzido ainda é o número de mulheres presidentes dos conselhos de administração" diz Maria Antónia Torres, membro do board e líder da diversidade na PwC Portugal. Salienta que mesmo ao nível da gestão de topo, quando se analisa a estrutura das equipas, cerca de 42% são totalmente compostas por homens e muitas das equipas tem apenas uma mulher.

Este é "um dos domínios onde os avanços têm sido particularmente lentos e tímidos" refere Sara Falcão Casaca, professora do ISEG e investigadora na área do Género, Trabalho e Organizações. Refere que na "administração pública, no sector empresarial do Estado, a presença de mulheres em lugares de primeira linha é inferior a 30%. No sector privado, a sua representação é ainda menor nas grandes empresas".

Nas PME e micro-empresas, até pelo seu cariz familiar, existe uma maior presença de mulheres nas administrações mas nem sempre se traduz em liderança como assinala Sara Falcão Casaca "há mais mulheres à frente das micro e pequenas empresas - pelo menos, formalmente, pois as dinâmicas de poder associadas ao género estão presentes nas empresas de cariz familiar (como é o caso de muitas micro empresas) e, muitas vezes, não são elas que detêm o poder de decisão".

Uma análise ao poder nas 18 empresas do PSI-20 reflecte estas tendências. Só 12,3% dos 235 administradores são mulheres. Se olharmos para o universo dos executivos baixa para 10% dos 90 dos gestores. Só a Sonae Capital tem uma CEO mulher, Cláudia Azevedo, que também é administradora não executiva na Nos. Nove das 29 mulheres que ocupam cargos nas administrações das empresas são accionistas ou descendentes de accionistas: Altri, GalpEnergia, Nos, Sonae Capital, Mota-Engil e Corticeira Amorim.

Meritocracia ou paridade

Segundo Sara Falcão Trigoso "no caso da igualdade salarial e da liderança, o progresso tem sido muito lento… preocupantemente vagaroso e tímido". Por isso existe legislação para uma maior igualdade de género na administração das empresas em vários países.

Em Portugal, por exemplo, as entidades reguladoras vão ser obrigadas a garantir que 33% dos membros dos seus conselhos de administração são de género diferente e os próximos presidentes deverão ser mulheres, com excepção da Anacom que é presidida por Fátima Barros.

"Uma grande maioria das mulheres vê desvantagens concretas na discriminação positiva, sobretudo quando imposta por legislação, como sejam as muito discutidas quotas de participação nos conselhos de administração das empresas cotadas" refere Maria Antónia Torres. Mas aponta o facto de, como mostram vários estudos, "a este ritmo, a igualdade de género em termos da gestão de topo das organizações demorará umas quantas dezenas de anos".

Madalena Cascais Tomé, CEO da SIBS, não concorda com a paridade obrigatória e considera que pode "agudizar a discriminação" e "gerar algum desconforto nas gestoras e executivas da nossa geração, cujo mérito e profissionalismo são inquestionáveis". Mas o choque da realidade como a lenta evolução que se tem verificado na presença feminina nas administrações e como CEO das organizações, leva-a a defender acções mais assertivas, "que permitam que as mulheres se afirmem pela sua capacidade de liderança, pelos seus conhecimentos, pela sua experiência, reconhecendo que há diferenças, e que nem sempre é fácil ser o elemento diferente".

Para Sara Falcão Casaca "a meritocracia é um mito alimentado pelas visões mais liberais, como se os lugares que ocupamos na sociedade não fossem influenciados pelas condições de partida, objectivas (materiais) e subjectivas (o género, por exemplo)". Aduz que "as desigualdades de género persistem, resistem… invisibilizando muitas mulheres de grande mérito". Por isso se há distorções ao direito à igualdade de oportunidades e de uma sociedade paritária, "é preciso corrigir esses enviesamentos e acelerar o sentido da mudança… precisamente para que o mérito possa ter lugar". 


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