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Neptunpearl: As ostras do Sado que os chefs de cozinha amam

Depois de décadas sem produção, as ostras estão de volta ao Sado. O trabalho de Célia Rodrigues, fundadora da Neptunpearl, contribuiu para as pôr nas bocas do mundo.

26 de Setembro de 2019 às 16:30
Rui Minderico
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Dizer simplesmente que Célia Rodrigues é uma empresária produtora de ostras da região é claramente redutor. Esta engenheira de formação é uma embaixadora da promoção deste molusco no mercado português e lá fora também. "Aumentar o consumo em Portugal de ostras, algas e plantas halófitas, diversificando a oferta e diminuindo a pressão sobre os produtos do mar mais consumidos" surge logo no arranque da apresentação da Neptunpearl na sua página de Facebook.

Criada há sete anos, esta empresa de apenas cinco funcionários, incluindo a própria fundadora, produz cerca de 26 toneladas de ostras por ano, distribuídas diretamente ao cliente final. Além da restauração e dos particulares, a Neptunpearl também exporta, através de uma parceria com uma empresa belga que depois distribui em países como Espanha ou a Noruega.
É Célia Rodrigues quem, juntamente com duas funcionárias da Neptunpearl, assegura boa parte do processo de acompanhamento da cultura das ostras.
É Célia Rodrigues quem, juntamente com duas funcionárias da Neptunpearl, assegura boa parte do processo de acompanhamento da cultura das ostras. Rui Minderico
O negócio, está bom de ver pelos números, é de nicho e concentra-se sobretudo em Portugal: "O mercado nacional pesa 85%", diz Célia Rodrigues. Se normalmente em Portugal se produz cerca de cem ostras por metro cúbico, na Neptunpearl a produção ronda as 25 por metro cúbico, sendo o resultado um produto mais diferenciado.

"Só distribuímos dois dias por semana por sermos uma pequena empresa. Dizem muitas vezes que isso não dá dinheiro, que o que dá dinheiro é exportar a grosso, mas foi isso que me permitiu ter clientes certos e saber que pago os salários ao final do mês", explica a responsável, enquanto guia o Jornal de Negócios por um dos locais de exploração da Neptunpearl. Entre hotéis e restaurantes, o elenco de clientes é de luxo e inclui o Ritz, o Feitoria, o Altis Avenida, a Penha Longa, a Taberna da Rua das Flores, o Sea Me, o Clube de Vela e chefs como Marlene Vieira, Paulo Morais e Leonardo Pereira.

Chefs impulsionam negócio

A evolução do negócio da Neptunpearl espelha bem a realidade dos dias de hoje, em que são vários os chefs em todo o mundo - hoje autênticas popstars - que procuram não só produtos locais como uma relação direta com os produtores.
Uma das suas áreas de exploração está na Gâmbia, uma das freguesias de Setúbal.
Uma das suas áreas de exploração está na Gâmbia, uma das freguesias de Setúbal. Rui Minderico
Célia Rodrigues dá um exemplo: "Ao sexto ano apareceu um chef maravilhoso português que trabalhava no Noma, só com plantas silvestres, o Leonardo Pereira. Andei à procura do que ele precisava e descobri que tinha. E assim surgiram as outras plantas." Assim, e para além da salicórnia, a mais famosa das halófitas (plantas salgadas), hoje vende salgadeiras, suaedas, sacrocornias, e beldroegas do mar, que podem ser utilizadas quer na culinária como com fins medicinais. Há ainda as macroalgas que começaram por ser solicitadas pelos restaurantes como elemento decorativo, mas que entretanto passaram para dentro dos pratos.

O grosso do negócio, em termos de faturação, são as ostras. Célia Rodrigues afirma que "quanto às ostras, quase que me podia ‘divorciar’ porque o que eu queria - que era o renascimento da produção - está feito. Em Nova Iorque, vamos a um restaurante que tem ostras do mundo inteiro e também têm as nossas. E isso é muito bom."

O ressuscitar das ostras

Nos anos 70 a produção de ostras desapareceu, nomeadamente fruto da industrialização e contaminação das águas por metais pesados, e as salinas desapareceram e apostou-se na piscicultura, por ser mais rentável. Há aproximadamente onze anos, a atividade ostrícola regressou e atualmente há cerca de 14 empresas a produzir ostras no Sado. Foi em antigos campos de produção de sal que Célia se instalou para produzir as suas ostras. Tem concessionados 26 hectares para exploração. Dos cinco trabalhadores da Neptunpearl, três são mulheres. Os dois homens estão sobretudo na distribuição e são as mulheres quem está nas tarefas mais "duras", brinca Célia.


85%
Mercado nacional
O grosso das vendas da Neptun destina-se ao mercado português.

26
Toneladas
É quanto a empresa produz de ostras por ano, com distribuição direta ao cliente final.

115
Faturação
A Neptunpearl faturou 115 mil euros em 2018 e prevê uma subida este ano.


Em vez do financiamento bancário, Célia optou por encontrar um parceiro para sustentar e expandir o negócio. João Costa, que detém 70% do capital da Neptunpearl, tem também a Quiosque Lisboa, que explora vários quiosques da capital . De resto, a própria Neptun começou pela prestação de consultoria à produção aquícola. O trabalho de proteção e desenvolvimento das espécies do estuário do Sado mantém-se, nomeadamente em parceria com as universidades.


Perguntas a Célia Rodrigues
Fundadora da Neptunpearl

"A ostra é comparável ao leite materno"

Célia Rodrigues diz que sempre se sentiu "completamente aquática". A defesa de uma aquacultura e piscicultura sustentáveis estão, por isso, sempre presentes no seu discurso.

Porque é que as ostras não são tão populares em Portugal como outro marisco?
As ostras são património histórico português. No entanto, é um alimento cru, deve comer-se cru e nós não tínhamos, de facto, grandes hábitos de consumo em cru. Só há poucos anos, com a entrada do sushi, é que as coisas começaram a mudar. O consumo da ostra tem vindo a aumentar muito em Portugal, o que em parte tem também que ver com o crescimento do turismo. E a verdade é que a produção ostrícola é altamente sustentável. Não é preciso fornecer nada aos animais para que eles cresçam. Depois isto é uma maternidade natural. A biodiversidade é gigante e tudo o que aqui existe pode ser aproveitado para consumo humano.

Dez ostras têm a mesma proteína que um bife e são muito mais saudáveis.

Mas o elevado preço das ostras não é também um entrave ao consumo?
A ostra não é valorizada. É um produto de luxo, comparável ao leite materno. Tem os mesmos nutrientes que o leite materno. Tem minerais, tem todo o complexo de vitaminas B. Dez ostras têm a mesma proteína que um bife e são muito mais saudáveis. Na minha empresa, que é das mais caras do mercado, uma ostra custa entre 50 e 60 cêntimos. Não é um produto de luxo.

Como é que a maior procura de ostras se tem refletido na produção e vendas?
Os últimos dados que saíram, de 2017, dão conta de uma produção, a nível nacional, de 12.549 toneladas, mais 11,5% do que em 2016, e que geraram 83,2 milhões de euros, mais 10,6% do que em 2016.

E a evolução do negócio da Neptunpearl em concreto?
Foi sempre crescente, desde o primeiro dia. Nunca tive um mês pior que o outro. Este ano está a verificar-se um aumento muito maior. O que eu faturei em todo o ano passado corresponde ao que eu já faturei este ano até agora. No ano passado, foram 115 mil euros.

Faz também sessões de degustação de ostras, nomeadamente para turistas. Há margem para crescer no turismo nestas áreas?
Pode-se desenvolver a economia através de atividades sustentáveis aliadas ao turismo, porque há muito por fazer. Dou um exemplo: Setúbal tinha muitas salinas e uma forma própria de fazer sal. Hoje produzir sal grosso não é rentável. Mas pode sê-lo através da flor de sal e de tipos de turismo, como os banhos em salinas.
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