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A REN está a planear realizar duas novas ligações elétricas a Espanha e uma ligação de gás com Espanha, França e Alemanha, destinada ao transporte de hidrogénio verde.
A transição para energia mais sustentável e renovável é uma mudança estrutural na cadeia de valor da energia. Implica mudanças tecnológicas, de atores, com os agentes tradicionais, as chamadas utilities, estão a ser complementados por novos agentes que entram, como o consumidor. "Este deixou de ser um agente passivo para passar a ser ativo neste processo democratização, que passa a estar mais informado e a poder atuar também no próprio sistema", disse João Faria Conceição, administrador executivo da REN.
Recorrendo à linguagem dos engenheiros, descreveu este processo como "um processo transiente", caracterizado por instabilidade, que "não converge para a solução inicialmente prevista, mas sim para um equilíbrio desejado de maior sustentabilidade, em diferentes níveis." Em Portugal, este percurso tem vindo a ser traçado ao longo do tempo. Trata-se de um processo longo e complexo, no qual ainda há muitas medidas e ações por implementar. Entre janeiro e setembro deste ano, 73% da energia elétrica consumida em Portugal teve origem em fontes renováveis. No entanto, João Faria Conceição sublinhou que, nesse período, a componente hídrica teve um peso significativo em comparação com anos anteriores.
A eficiência energética é a forma de energia mais barata. É a energia que poupamos.
Lembrou ainda que o Reino Unido foi o primeiro país do G7 a anunciar o abandono do carvão na produção de eletricidade. Portugal, por sua vez, encerrou a sua última central a carvão em 2021.
Objetivo 51%
Uma das metas definidas pela Europa para 2030 é o objetivo dos 51%, que abrange toda a energia consumida, incluindo a eletricidade, a energia primária, os combustíveis e outras fontes de energia. João Faria Conceição destacou o grande potencial da eficiência energética, que, para "muitos especialistas, é a forma de energia mais barata. É a energia que poupamos".
O administrador executivo da REN sublinhou a necessidade de acelerar a descarbonização nos transportes e em alguns setores industriais, que dificilmente serão completamente eletrificados. "São medidas que devem ser acauteladas para garantir o cumprimento das metas definidas pela Europa. Estamos bem posicionados para atingir este objetivo, desde que mantenhamos uma política estruturada e estável", afirmou.
A REN, segundo João Faria Conceição, desempenha um papel fundamental na transição energética, operando as redes de transporte de eletricidade e gás natural, bem como a rede de distribuição no norte do país, através da Portgás. "Somos um facilitador da transição energética, porque, sem as redes, não existem infraestruturas capazes de ligar a produção ao consumo", explicou.
Os desafios dos licenciamentos e da regulação
Na opinião do administrador da REN, um dos principais desafios está nos licenciamentos. Reconhece a existência de diferentes perspetivas, a de quem promove projetos considerados importantes e quer vê-los concretizados, e a necessidade de garantir uma lógica de ordenamento do território. "Não é viável cortar o território nacional com infraestruturas de transporte ou distribuição de eletricidade, gás ou outras formas de energia", enfatizou.
Sem sustentabilidade económica, os investidores não avançam, os projetos não se realizam e a transição energética atrasa-se.João Faria Conceição
Administrador Executivo da REN
Contudo, alertou que os licenciamentos não devem ser tratados de forma demasiado restritiva, sob pena de comprometerem o processo de transição energética. "A palavra-chave é equilíbrio entre as diferentes partes", afirmou. A transição energética, segundo João Faria Conceição, deve ser economicamente sustentável, cabendo à regulação um papel crucial. "A regulação deve proporcionar sinais de estabilidade e justiça para todas as partes envolvidas. Não se trata apenas de facilitar a vida aos promotores de projetos, mas também de reconhecer que a transição energética implica custos inevitáveis. Caso contrário, já estaria concluída."
João Faria Conceição lembrou ainda que se trata de um setor intensivo em capital e de investimentos a médio e longo prazo. "Sem sustentabilidade económica, os investidores não avançam, os projetos não se realizam e a transição energética atrasa-se", concluiu.
Os investimentos da REN
A REN planeia realizar investimentos em infraestruturas, incluindo duas novas ligações elétricas a Espanha e uma ligação de gás com Espanha, França e Alemanha para o transporte de hidrogénio verde. As atividades da REN, com exceção dos negócios no Chile, são concessionadas, o que implica uma articulação estreita com a política energética de Portugal.
No plano de investimentos até 2027, estão previstos valores entre 1.500 e 1.700 milhões de euros, dos quais dois terços serão destinados ao setor da eletricidade.
Estes investimentos visam criar condições para a ligação de novas fontes de energias renováveis e responder ao surgimento de novos consumidores, sendo Sines um exemplo relevante. "Temos de dar resposta a curto prazo, que é 2026, mas, para nós, é já praticamente amanhã", afirmou João Faria Conceição.
Cerca de um quarto do investimento será canalizado para o setor do gás, com foco nos novos gases renováveis, como o biometano e o hidrogénio verde. João Faria Conceição destacou que este é um exemplo claro de como a resposta deve acompanhar as necessidades, sublinhando que "não vamos antecipar-nos, mas também não podemos atrasar-nos face às exigências do mercado". Entre os investimentos previstos destacam-se duas novas ligações a Espanha. A primeira, uma interligação elétrica Minho-Galiza, está prevista para 2025 e será acrescentada às nove interligações já existentes entre Portugal e Espanha, que, juntas, somarão uma capacidade total de 3.000 megawatts. Tendo em conta que o consumo máximo de eletricidade em Portugal se situa entre 9.000 e 10.000 megawatts, João Faria Conceição reforçou a importância desta infraestrutura, afirmando que "cerca de um terço do nosso consumo pode ser assegurado pelas trocas com Espanha, o único país com o qual temos fronteira. É uma segurança de abastecimento". A segunda ligação será dedicada ao gás e está prevista para 2030, enquadrando-se num projeto mais amplo de interligação entre Portugal, Espanha, França e Alemanha, destinado à exportação de hidrogénio verde produzido nos diferentes países. O principal objetivo deste projeto é abastecer a indústria alemã, que deverá ser o maior consumidor de hidrogénio na Europa. Esta iniciativa, "de grande relevância estratégica, poderá beneficiar de financiamento europeu, contribuindo para acelerar a transição energética e para reforçar o papel de Portugal como um ator chave na produção e exportação de hidrogénio verde", conclui João Faria Conceição.