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Como a fortuna oculta do dono da Archegos evaporou em dias

Do seu pedestal em Midtown Manhattan, mesmo em frente ao Carnegie Hall, Bill Hwang construía silenciosamente uma das maiores fortunas do mundo.

Emile Wamsteker/Bloomberg
04 de Abril de 2021 às 14:00
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Mesmo em Wall Street, eram poucos os que prestavam atenção ao investidor até que, de repente, todos deram por ele.

Hwang e a sua empresa de investimentos privada, a Archegos Capital Management, estão agora no centro de uma das maiores chamadas de margem de todos os tempos: um fiasco multibilionário que envolve apostas de mercado secretas que foram perigosamente alavancadas e desfeitas num piscar de olhos. A margem é um valor exigido como garantia para operações alavancadas. Quando esse valor atinge um limite, ocorre a chamada para cobrir o risco.

A ascensão mais recente de Hwang pode ser calculada a partir de ações vendidas por bancos nos últimos dias - ViacomCBS, Discovery, GSX Techedu e Baidu - que haviam disparado este ano, às vezes confundindo operadores que não conseguiam entender o motivo.

Uma parte do portefólio de Hwang, que foi negociado em bloco desde a semana passada pelo Goldman Sachs, Morgan Stanley e Wells Fargo, valia quase 40 mil milhões de dólares na semana passada. Os banqueiros avaliam que o capital líquido da Archegos - basicamente o património de Hwang - atingiu cerca de 10 mil milhões. E, com as vendas contínuas, as estimativas das posições totais da empresa continuam a subir: dezenas de milhares de milhões, 50 mil milhões e até mais de 100 mil milhões.

Essa fortuna evaporou em poucos dias.

"Nunca vi nada parecido: a forma silenciosa, concentrada e rápida como desapareceu", disse Mike Novogratz, investidor e ex-sócio do Goldman Sachs, que negoceia desde 1994. "Esta deve ser uma das maiores perdas de património pessoal da história."

No final da segunda-feira em Nova Iorque, a Archegos quebrou dias de silêncio sobre o ocorrido.

"Este é um momento desafiador para o family office da Archegos Capital Management, para os nossos parceiros e funcionários", disse Karen Kessler, porta-voz da empresa, num comunicado por email.
"Todos os planos estão a ser discutidos enquanto o Sr. Hwang e a equipa determinam o melhor caminho a seguir."

A cascata de perdas em trading ecoou de Nova Iorque a Tóquio, e deixa uma série de perguntas sem resposta, incluindo a grande questão: como é que alguém pode assumir riscos tão grandes, facilitados por tantos bancos, debaixo do nariz de reguladores do mundo inteiro?

Uma parte da resposta é que Hwang se estabeleceu como um family office com supervisão limitada e, depois, usou derivados financeiros para acumular grandes participações em empresas sem nunca ter de divulgá-las. Outra parte é que bancos globais o aceitaram como um cliente lucrativo, apesar do histórico de negociações com informações privilegiadas e tentativa de manipulação de mercado que o afastou da indústria de hedge funds há uma década.

Discípulo de Julian Robertson, veterano dos hedge funds, Sung Kook "Bill" Hwang fechou a Tiger Asia Management e a Tiger Asia Partners depois de conseguir arquivar um processo civil na SEC em 2012, que acusou as empresas de negociação com informações privilegiadas, ou insider trading, e manipulação de ações de bancos chineses. Hwang e as empresas pagaram 44 milhões de dólares, e ele concordou em ser excluído do setor de consultoria de investimentos.

Logo depois Hwang abriu a Archegos - que em grego significa "aquele que lidera" - e estruturou a empresa como um family office.

Family offices que gerem exclusivamente a fortuna de um indivíduo estão geralmente isentos de registo como consultores de investimento na SEC dos EUA. Portanto, não precisam de divulgar os seus proprietários, executivos ou o quanto gerem - regras criadas para proteger pessoas de fora que investem num fundo. Essa abordagem faz sentido para pequenos family offices, mas, se atingirem o tamanho de um grande hedge fund, ainda podem representar riscos, desta vez para investidores no mercado mais amplo.

"Isso mais uma vez levanta questões sobre a regulação dos family offices", disse Tyler Gellasch, ex-consultor da SEC que agora dirige a associação Healthy Markets. "A questão é: se somos apenas amigos e família, porque é que nos devemos importar? A resposta é que podem ter um impacto significativo no mercado, e o regime regulatório da SEC, mesmo depois da Lei Dodd-Frank, não reflete isso claramente", disse.

Cliente valioso

A Archegos estabeleceu parcerias de trading com empresas como o Nomura, Morgan Stanley, Deutsche Bank e Credit Suisse. Depois do caso da SEC, o Goldman recusou-se a fazer negócios com Hwang por um período por motivos de conformidade, mas cedeu quando rivais lucraram atendendo às necessidades do investidor.

O Morgan Stanley e o Goldman Sachs, por exemplo, estão listados como os maiores detentores de ações da GSX Techedu, uma empresa chinesa de tutoria online que tem sido repetidamente alvo de vendedores a descoberto. Os bancos podem possuir ações por uma série de razões, como para hedge de exposições de swap a negociações com clientes.

‘Investidores insatisfeitos’

O Goldman aumentou a sua posição em 54% em janeiro, de acordo com documentos regulatórios. No geral, os bancos informaram possuir pelo menos 68% das ações em circulação da GSX, de acordo com uma análise da Bloomberg dos documentos. Os bancos detinham pelo menos 40% da IQIYI Inc, uma empresa chinesa de entretenimento de vídeo, e 29% da ViacomCBS, todas com altas apostas da Archegos.

"Tenho a certeza de que há uma série de investidores realmente insatisfeitos, que compraram esses nomes nas últimas semanas" e agora se arrependem, disse Doug Cifu, CEO da empresa de negociação eletrónica Virtu Financial, em entrevista à Bloomberg TV. Cifu acredita que os reguladores examinarão se "deve haver mais transparência e divulgação por parte de um family office".

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