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Pressão das tecnologias, ansiedade do ‘tapering’ e Powell "na chapa" quebram Wall Street

As principais bolsas do outro lado do Atlântico encerraram no vermelho, com as tecnológicas uma vez mais a afundarem, numa altura em que cresce a ansiedade quanto ao timing da retirada de estímulos à economia por parte do banco central. O facto de a ética da Fed estar a ser escrutinada e de haver o espectro de um "shutdown" dos serviços públicos do país contribuiu para a tendência.

Reuters
28 de Setembro de 2021 às 21:23
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O índice industrial Dow Jones fechou a ceder 1,63%, para 34.299,99 pontos e o Standard & Poor’s 500 recuou 2,04%, para 4.352,64 pontos, naquele que foi o maior selloff desde maio.

 

Já o tecnológico Nasdaq Composite mergulhou 2,83% para se fixar nos 14.546,68 pontos.

 

As tecnológicas voltaram a estar entre as cotadas com pior desempenho, devido ao facto de os juros da dívida a 10 anos estarem a negociar nos EUA em máximos de finais de junho, acima de 1,53%, em antecipação de uma política monetária mais apertada por parte da Fed.

 

Isto depois de na semana passada o banco central ter anunciado que deverá começar a retirar os estímulos (‘tapering’) à economia a partir de novembro e ter sinalizado que as taxas de juro poderão ser aumentadas mais cedo do que o previsto. Mas o timing do ‘tapering’ ainda não é concreto, o que ajuda à ansiedade nos mercados.

 

Se os juros da dívida continuarem a agravar-se, isso poderá pesar ainda mais nas ações do setor tecnológico, cujos dividendos têm uma baixa rendibilidade.

 

Um dia difícil

 

Os mercados acionistas tiveram um dia difícil esta terça-feira, tanto na Europa como nos EUA, numa altura em que os investidores se mostram mais avessos ao risco, sublinha Craig Erlam, analista senior de mercado na Oanda, numa nota de análise a que o Negócios teve acesso.

 

"Houve tanto para assimilar ao longo da última semana, a começar pelas comparações da Evergrande com o Lehman e a terminar no ‘tudo está bem por agora’, que os investidores parecem estar cada vez mais preocupados com o que está para vir. Na verdade, pouca coisa mudou nestes últimos dias, mas talvez as atitudes tenham mudado", frisa o analista da Oanda.

 

E prossegue: "Na semana passada, a mensagem dos bancos centrais [BCE e Fed] era de que a inflação era (sobretudo) transitória e que a fase da necessidade de estímulos de emergência estava quase a ficar para trás. A retoma está a desacelerar, mas a perspetiva é de que volte a ganhar fôlego, tal como acontecerá com as pressões sobre os preços. Embora essa mensagem não pareça ter mudado esta semana, os investidores não parecem muito confortáveis".

 

"Talvez a justificação de aproveitar as quedas para comprar [o chamado ‘buy the dip’] esteja a perder força num mundo onde os bancos centrais estão a planear retirar os estímulos devido à subida da inflação e não devido a uma robusteza económica. Ou talvez um ‘inverno do descontentamento’ esteja a tornar-se uma realidade mais preocupante, numa altura em que a escassez de energia está a desencadear vastos aumentos dos preços", considera Craig Erlam.

 

"Ou será que a interminável lista de fatores de risco está finalmente a começar a pesar no sentimento, com os investidores a sentirem tanta incerteza como os bancos centrais acerca do que virá por aí nos próximos 12 meses? O que quer que seja que esteja a acontecer nos mercados, não parece que vá dissipar-se em breve", antevê. 

 

Yellen adverte para "shutdown"

 

Os intervenientes de mercado estiveram também atentos às declarações do presidente da Fed, Jerome Powell, e da secretária norte-americana do Tesouro, Janet Yellen, que hoje estiveram perante a comissão bancária do Senado.

 

Yellen advertiu que o governo federal poderá ficar sem dinheiro a partir de 18 de outubro se o Congresso não agir no sentido de aumentar o teto de endividamento dos EUA, depois de uma proposta nesse sentido ter sido chumbada ontem no Senado.

 

Os republicanos do Senado bloquearam a proposta que já tinha sido aprovada na Câmara dos Representantes e que visava financiar o governo federal e suspender o teto da dívida. Com a proposta pretendia-se evitar assim um "shutdown" do governo federal e um potencial incumprimento no reembolso da dívida dos EUA.

 

Este chumbo deu-se depois de os republicanos terem insistido para que os democratas apresentassem uma proposta isolada sobre a questão do limite ao endividamento, o que deixa agora o Congresso sem um plano claro para manter o governo em funcionamento a partir de 30 de setembro.

 

O dia 30 de setembro é a data em que o financiamento atual do governo expira, devendo supostamente entrar em vigor no dia seguinte o orçamento de 2022. Assim, os congressistas norte-americanos terão de aprovar uma proposta de lei até quinta-feira para se evitar uma paralisação dos serviços públicos federais a partir de meados de outubro (quando "acaba" o dinheiro disponível), e será preciso suspender ou aumentar o limite de endividamento do país nas próximas semanas para impedir um "default", sublinhava ontem a CNBC.

 

A CNN aponta para a possibilidade de os democratas decidirem retirar, da proposta de financiamento federal, o tema da suspensão do teto de endividamento, tentando, em vez disso, fazer aprovar – como já aconteceu outras vezes – o  projeto provisório que permite que as agências federais dos EUA possam continuar a ser financiadas. Esta medida legislativa é conhecida como resolução de continuidade. Enquanto não há acordo final para o orçamento federal, o "shutdown" é assim evitado através desta solução de financiamento de curto prazo ["stopgap spending bill"].

 

A stopgap bill que a Câmara dos Representantes aprovou na semana passada permitiria financiar e manter o governo "aberto" até ao próximo dia 3 de dezembro. Além disso, a medida incluía uma suspensão do teto da dívida até 16 de dezembro de 2022. O relógio está a contar para se resolver a questão do limite de endividamento e o Congresso poderá só ter até meados de outubro – altura em que o governo federal deixará de conseguir pagar as suas contas, como afirmou hoje Yellen.

 

Os dissabores de Powell

 

Já Powell enfrentou perguntas inflamadas por parte de alguns senadores que criticaram as orientações do banco central em matéria de negociação de ativos, bem como a regulação financeira e os esforços de diversidade.

 

A senadora democrata Elizabeth Warren foi uma das mais ferozes críticas, considerando Powell "perigoso" e dizendo que não o apoiará num segundo mandato à frente do banco central.

 

"As suas ações tornaram o nosso sistema bancário menos seguro e isso faz de si um homem perigoso para se ter a liderar a Fed. E é por isso que me oporei à sua recondução", afirmou, citada pela Bloomberg.

 

"Um presidente republicano da Fed, que tem votado regularmente a favor de desregulamentar Wall Street, não pode encaminhar novamente a nossa economia para um precipício financeiro. Não me parece que seja um risco que valha a pena correr", salientou Warren.

 

O mandato de Powell expira no final de janeiro e a Bloomberg tem reportado que o staff da Casa Branca está a pensar recomendar ao presidente Joe Biden que o mantenha no cargo. Yellen, no mês passado, tinha já demonstrado o seu apoio a Powell – o que é tido como uma recomendação de peso, já que ela própria foi presidente da Fed.

 

Falando perante a comissão bancária da câmara alta do Congresso – no dia a seguir a dois presidentes de Fed regionais terem anunciado a sua saída, após terem sido escrutinados pelos seus investimentos –, Powell hoje defendeu o banco central e predispos-se a proceder às melhorias necessárias nas políticas da Reserva Federal.

 

Powell, que em inícios deste mês ordenou uma reavaliação do código ético da Fed, acrescentou que o banco central está também a analisar as transações realizadas por presidentes de Fed regionais para ter a certeza de que estão dentro da legalidade e em cumprimento com as atuais orientações éticas.

 

Isto depois de, no início da audição de hoje, o senador democrata Sherrod Brown ter dito que pretende apresentar legislação no sentido de impedir que responsáveis da Reserva Federal detenham ações de empresas.

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