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Quando a turbulência se transforma no novo normal
Tendo como ponto de partida o mundo VUCA – o acrónimo em inglês para volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade – a AESE Business School reuniu um conjunto variado de oradores para discutir os desafios e oportunidades que se colocam às empresas que, se quiserem sobreviver e crescer, terão de se adaptar a este nem sempre admirável mundo novo. Contextualizar os elementos presentes no acrónimo criado pelas forças militares americanas nos anos de 1990 e transpô-los para o quotidiano organizacional é o objectivo deste artigo
O acrónimo VUCA – criado no final dos anos 90 pelas forças militares americanas para caracterizar o mundo de então e que significa "Volatility, Uncertainty, Complexity e Ambiguity"- comparativamente à realidade que vivemos hoje, deveria ser precedido pelo prefixo "super". É que se no final do século os Estados Unidos (e o resto do planeta) tinham algumas razões para definir o universo em que se moviam com estas substantivas palavras – e com motivos adicionais depois do 11 de Setembro – hoje em dia afirmar que vivemos numa era volátil, incerta, complexa e ambígua é quase o mesmo do que declarar que a Terra é redonda. Assim, duas novas letras foram adicionadas ao acrónimo em causa – utilizado não só em termos geoestratégicos, mas também no que respeita à gestão organizacional – e, cada vez mais, também às nossas vidas – por Eric McNulty, Director de Pesquisa e Programas Profissionais na National Preparedness Leadership Initiative, um programa conjunto da Harvard School of Public Health e da Harvard’s Kennedy School of Government.
McNulty é também orador, escritor, professor e consultor e foi um dos convidados para o Encontro de Alumni 2016 da AESE – Business School, subordinado ao tema "Liderar na (in)certeza", que ocorreu em Lisboa, no passado dia 8 de Julho. Com um conjunto ecléctico de oradores, nacionais e internacionais, e tendo em conta o universo VUCA em que nos movemos, a AESE debateu os reptos colocados aos dirigentes empresariais na procura das estratégias mais adequadas para se gerir e liderar nesta era de turbulência significativa. De acordo com António Pinto de Abreu, o novo Presidente do Agrupamento dos Alumni da AESE e tendo em conta a diversidade no painel dos convidados, a ideia foi que os mesmos ajudassem a pensar no que se pode esperar – tanto no plano dos desafios como no das oportunidades – "das tecnologias e da alteração que elas vão induzir na forma e rapidez da tomada de decisões, da literacia de que nos teremos de dotar para poder tirar partido delas, das novas formas de organização do trabalho, dos padrões de consumo que se nos vão deparar, do tipo de activos base que devemos cuidar de ter nas empresas, da análise de riscos que teremos de fazer, das restrições que surgirão ou não a nível da disponibilidade da energia, do impacto das alterações climáticas", entre outros temas conexos.
Apesar de a intervenção de McNulty não ter sido dedicada exclusivamente ao mundo VUCA – ou VUCAST (as duas letras que, entretanto, lhe acrescentou e às quais chegaremos) – mas antes à forma como nele se deve liderar, a sua apresentação na AESE intitulou-se "A Call for ARTful Leadership: Coping with a Turbulent World", o que também demonstra a inclinação confessada deste professor de Harvard no que respeita aos acrónimos.
Assim, e nesta newsletter, e para além do presente artigo de contextualização sobre o que significa viver em "modo VUCAST", o leitor poderá ler, de seguida, o que é necessário para se liderar neste mundo de turbulência constante e acelerada, através desta ARTful Leadership, a qual abraça, por excelência, três princípios fundamentais: a capacidade adaptativa, a resiliência e a confiança.
Mas e para já segue-se a análise, com base nos escritos de McNulty, do significado de cada um destes acrónimos, em conjunto com uma breve resenha histórica de como de "VUCA", o ambiente em que nos movemos ganhou dois novos elementos que o transformaram em "VUCAST". E também o que significam estes componentes em termos geopolíticos e quais os seus principais impactos para a gestão e liderança organizacionais.
A globalização da espiral de turbulência
Depois do 11 de Setembro, e do mais ousado ataque perpetrado àquela que na altura era a primeira potência mundial, o terrorismo passou, em particular nos últimos meses, a fazer parte do quotidiano de muitos ocidentais, de tal forma que parece estar a tornar-se num tresloucado "novo normal".
Mas o professor de Harvard utiliza também a história mais ou menos recente para ilustrar não só terrorismo físico que parece agora espreitar em qualquer lado, mas também o ataque à confiança em diversas instituições, o que contribui igualmente e de forma muito significativa para o clima de instabilidade que todos parecemos sentir. Este golpe na confiança é bem ilustrado por exemplos como o Wikileaks ou o mais recente caso dos Panama Papers ou, se quisermos regressar a alguns anos atrás, pela crise dosubprime que abalou toda a banca – aumentando o défice de confiança de que a mesma já gozava – dado os seus efeitos perniciosos que contagiaram todo o globo.
Adicionalmente, somos testemunhas de outro tipo de fenómenos – como as migrações em massa ou a crise sem fim à vista dos refugiados – ou ainda os eventos climáticos extremos que ameaçam não só comunidades inteiras, como o futuro do próprio planeta, os quais nos obrigaram a reformular a nossa perspectiva no que respeita à realidade em que, e subitamente, passámos a viver. Se olharmos para trás e pensarmos em como a "ordem" mundial se alterou em tão poucos anos, quase que nos é difícil imaginar o "acompanhamento em directo" de todas estas mudanças das quais somos testemunhas. Afinal, o mundo ocidental, com alguns eventos menos comuns pelo meio, é certo, oferecia-nos uma certa dose de conforto, de segurança, de valores seguros que, em pouquíssimo tempo, deixaram pura e simplesmente e de existir.
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