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E se todas as semanas tivessem só quatro dias?
Em prol de uma maior qualidade de vida e de uma melhor performance empresarial, são várias as empresas e organismos que têm implementado a semana mais curta de trabalho. Pela nossa saúde, temos de trabalhar menos; pela saúde das empresas, temos de produzir mais. Mas a verdade é que encontrar a fórmula certa para estimular a produtividade continua a ser um verdadeiro “cabo dos trabalhos”
Seja ou não workaholic, chefe ou subordinado, preguiçoso ou obstinado, decerto que dá as boas-vindas a uma semana mais curta de trabalho. Com um feriado à sexta-feira, a perspectiva de se trabalhar apenas quatro dias na semana funciona quase como uma espécie de elixir para o entusiasmo, com resultados visivelmente positivos na forma de encararmos as nossas tarefas, bem como níveis gerais de produtividade, em queda acelerada nos últimos anos.
Encontrar a fórmula mais adequada para estimular a vontade de trabalhar e, por consequência, atingir os resultados que estabelecemos para nós mesmos ou que nos são impostos, consiste e desde há muito tempo, numa busca de uma espécie de um "santo graal da produtividade". Todos os anos somos confrontados com novos estudos, experiências e projectos-piloto que tentam identificar o número de horas por excelência que melhor se traduzam na "produtividade perfeita". E são vários os países, com o exemplo recente da Suécia, e também empresas, sobre as quais escreveremos adiante, que estão a testar novos modelos laborais que tentam reproduzir e comprovar a ideia de que a menos horas de trabalho poderão corresponder maiores índices de produtividade.
Num altura em que todos somos médicos ou bombeiros, e que aceitamos, sem remédio, a ditadura dos smartphones, estar disponível 24 horas por dia é, na generalidade dos casos, apanágio dos "bons trabalhadores", disponibilidade essa premiada (ou não) por muitos empregadores, mas com custos comprovados tanto para a nossa saúde, como para os bolsos das próprias empresas. Perdidas as contas de quantos estudos já se fizeram sobre os prejuízos do excesso de trabalho, e sobre a sociedade que o venera, centremo-nos apenas numa meta-análise (o que significa uma espécie de ‘estudo sobre estudos’) realizada pela Universidade de Stanford, com base em 228 pesquisas efectuadas sobre o tema, e que nos diz, entre várias outras coisas, que as exigências "anormais" no ambiente laboral aumentam as probabilidades de contrairmos certo tipo de doenças em 35% e, sem comentários possíveis, o risco de mortes "prematuras" em 20%.
Daí que as jornadas laborais mais curtas – e que variam entre um número inferior ao "normal" de horas diárias de trabalho ou de dias da semana devotadas ao mesmo – continuem a fazer parte da equação daqueles que as defendem, em prol de uma maior qualidade de vida e de uma melhor performance empresarial.
O VER tem acompanhado este tema e, numa semana em que se trabalha apenas quatro dias, foi à procura de exemplos de sucesso de empresas e organismos que têm implementado a semana mais curta de trabalho, e não só como uma tentativa de resposta aos desafios do presente mas, e em particular, como uma potencial urgência para o futuro próximo, no qual se teme o aumento o desemprego devido à automatização de muitas tarefas e à catástrofe, apontada por muitos, de que os robots irão roubar os postos de trabalho dos humanos.
Cinco dias de trabalho está "fora de moda"?
A semana de trabalho de 5 dias, adoptada nos finais do século XIX e inícios do século XX, mais por questões religiosas e, mais tarde, porque o próprio desenvolvimento da industrialização permitiu que as fábricas e as máquinas no geral continuassem a operar sem a necessidade de terem, constante e continuamente, trabalhadores para garantir a produção está, para muitos, completamente desactualizada. E, num considerável número de empresas, o conceito de trabalho "comprimido" tem vindo a ganhar peso e adeptos, com os resultados, no geral, a mostrarem-se lucrativos, tanto para a satisfação dos trabalhadores, como das próprias empresas. De acordo com um estudo realizado nos Estados Unidos pelo Families&Work Institute, em conjunto com a Society for Human Resources Management e com base num universo que incluiu 1051 organizações com mais de 50 empregados, entre empresas e ONGs – cerca de 43% dos empregadores inquiridos em 2014 que tinham optado pelos quatro dias de trabalho semanal estavam satisfeitos com a opção tomada, face a apenas 38% em 2008.
Mas e tendo em conta apenas este exemplo, entre muitos outros que se podem encontrar a comprovar a eficácia desta medida, por que motivo é que não nos atrevemos – nem nós, nem as entidades patronais – a experimentar esta fórmula aparentemente tão bem-sucedida?
Para além das óbvias questões financeiras e mesmo que a tendência para a flexibilização dos horários esteja a aumentar, é ainda relativamente pequeno o número de empresas que já o dão como adquirido. Mas mesmo que esta fosse já uma prática comum, será que estaríamos preparados para a assumir? A verdade é que para muitos de nós, completamente vencidos pelo argumento que temos demasiadas coisas para fazer e responsabilidades inúmeras para cumprir, e queixando-nos de que o dia deveria ter 48 horas, trabalhar o mais arduamente possível é encarado não só como um dever, como também como algo que nos distingue dos demais, faltando apenas usar uma medalha ao pescoço que comprove o quão duramente suamos ao vestirmos a camisola.
Como escreve David Spencer, professor de Economia Política na Universidade de Leeds – e a propósito dos que defendem fins-de-semana de três (e até de quatro!) dias (como ele próprio), "para que consigamos atingir – e usufruir – de um fim-de-semana prolongado [enquanto prática normal], precisaríamos de reimaginar a sociedade mediante formas que subvertem completamente a ética do trabalho. Precisaríamos de abraçar a ideia de que trabalhar menos serviria como um meio de alcançar uma vida melhor". O que, na verdade, e apesar de constituir um sonho para a maioria de nós, é difícil de imaginar e virtualmente impossível de materializar.
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