Notícia
Separar as peças a bem
No divórcio por mútuo consentimento, pode tratar da papelada e pagar os impostos numa conservatória do registo civil. Na falta de acordo, a mediação familiar é mais rápida e informal do que os tribunais
28 de Maio de 2012 às 09:54
O casamento está em crise. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, registaram-se cerca de 40 mil casamentos em 2009, quase menos 3 mil do que em 2008. Paralelamente, o número de divórcios triplicou entre 1990 e 2009, com mais de 24 mil, tanto em 2008 como em 2009. Estes processos põem fim a uma relação que durou, em média, 14,8 anos. A proporção de separações por mútuo consentimento tem aumentado.
Em outubro de 2008, foi eliminada a figura do divórcio litigioso. No seu lugar, surgiu o divórcio sem consentimento de um dos cônjuges. Antes, nestes casos, só era possível dissolver o casamento devido a separação, ausência prolongada do cônjuge ou violação de um dos cinco deveres conjugais - respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência. Atualmente, um cônjuge que pretenda divorciar-se sem o consentimento do outro pode alegar simplesmente ter deixado de gostar do companheiro. Basta que o motivo comprometa a possibilidade de vida em comum para ser aceite em tribunal.
Em maio e junho de 2011, recolhemos a experiência de quem se separou ou divorciou nos últimos 10 anos ou ainda estava em processo de divórcio. Lançámos um pedido de colaboração no nosso portal, no Facebook e via newsletter. No total, responderam-nos 191 portugueses. Embora a amostra não seja representativa da população, permite identificar tendências sobre o processo de divórcio no País.
Mais simples com consentimento
Problemas de relacionamento, deixar de gostar do outro, infidelidade e dificuldades financeiras são os principais motivos que levaram os inquiridos a divorciar-se ou a separar-se nos últimos 10 anos. Em quase metade dos casos, o casamento terminou após 10 ou mais anos de vida em comum; em 21%, durou menos de 5 anos.
Quando não há reconciliação, a solução desejável é o divórcio por mútuo consentimento, até pela rapidez. Durou menos de 6 meses para três quartos dos inquiridos, enquanto cerca de metade dos processos litigiosos se arrastaram durante mais de 2 anos em tribunal. Além disso, o processo por mútuo consentimento tem menos custos com advogados e não requer audiências em tribunal, que desgastam a família.
O ideal é que ambas as partes se entendam quanto ao destino e uso da casa, responsabilidades parentais dos filhos menores, pensão de alimentos e relação de bens e valores comuns. Podem então avançar para um processo por mútuo consentimento, via escolhida por 74% dos inquiridos. Caso não haja acordo em relação a alguns destes aspetos, a mediação familiar pode ser a solução antes de recorrer ao tribunal. Mas só 1% optou por esta alternativa.
Num divórcio por mútuo consentimento, os cônjuges não têm de indicar o motivo que os leva a esta decisão, e o procedimento é relativamente simples. Dirigem-se a uma conservatória do registo civil com balcão de divórcios (quase todas têm) e fazem o pedido.
Ao requerimento escrito e assinado pelos dois, devem juntar:
• acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais a aprovar pelo Ministério Público ou certidão da sentença de regulação judicial relativa aos filhos menores (se existirem). Este acordo especifica com quem ficam a residir, o regime de visitas do outro progenitor, valor da pensão de alimentos e modo como é paga;
• acordo sobre a pensão de alimentos a pagar ao ex-cônjuge ou declaração de que os cônjuges prescindem de alimentos;
• acordo sobre o destino da casa da família;
• certidão da convenção antenupcial, caso haja;
• lista com o valor dos bens comuns, incluindo casa, veículos, hipotecas e empréstimos.
Se os ainda cônjuges conseguirem chegar a acordo quanto à partilha dos bens, podem formalizá-la logo na conservatória.
Após a entrega do requerimento, os cônjuges são convocados para uma conferência. Confirmada a vontade de se divorciarem e, desde que haja acordo em relação a todos os aspetos da separação, é decretado o divórcio.
A conservatória do registo civil cobra € 250 pelo processo e € 250 pela partilha do património conjugal e registo dos bens: se houver mais de 5 imóveis, pede € 25 por cada bem suplementar e € 20 adicionais por cada bem móvel (carro ou mobília, por exemplo). Quem não tem meios está isento desde que apresente um comprovativo da Segurança Social. Se as dificuldades financeiras só se aplicarem a um dos elementos, o outro paga metade das despesas do processo.
Ministério Público protege menores
O divórcio é, geralmente, difícil para os filhos menores. Metade dos pais que responderam ao inquérito reconhecem que o processo afetou consideravelmente as crianças. Mas o tempo atenua os problemas: no período que se seguiu ao divórcio, o número desceu para 20%, ainda assim uma percentagem relevante.
Quando há filhos menores, a regulação do poder paternal passa sempre pelo Ministério Público, que dispõe de 30 dias para se pronunciar sobre o acordo. Caso considere que os interesses das crianças não estão devidamente protegidos, indica as alterações necessárias. Redigido o novo acordo, este é submetido a avaliação. Após 30 dias, se o Ministério Público nada disser, o conservador marca a conferência e decreta o divórcio.
Embora a lei procure que as responsabilidades parentais se mantenham a cargo de ambos os progenitores, persiste a tendência de as crianças ficarem ao cuidado da mãe. Assim foi com 82% dos inquiridos, embora, em metade dos casos, o pai partilhe das decisões mais importantes. São poucos os casos de menores entregues ao pai ou a viver alternadamente com o pai e com a mãe.
Sem consentimento, o tribunal decide
No divórcio sem consentimento, que substitui o antigo divórcio litigioso, o cônjuge que pretende a dissolução do casamento deve alegar:
• separação de facto durante um ano seguido. Esta rutura não significa forçosamente que o casal vive em locais diferentes; pode habitar a mesma casa, mas não partilha cama, nem refeições e não faz vida em conjunto. A prova da separação de facto nestas circunstâncias não é fácil, podendo ser preciso recorrer a testemunhas;
• ausência do outro cônjuge sem notícias durante mais de um ano;
• deterioração das faculdades mentais do outro cônjuge, que há mais de um ano comprometa a possibilidade de vida em comum;
• outro facto que demonstre a rutura definitiva do casamento (por exemplo, terem deixado de se amar).
O requerimento, onde consta o motivo do pedido de dissolução, é entregue no Tribunal de Família ou, caso não exista, no Tribunal de Comarca da residência daquele que instaura a ação. Junte meios de prova e as certidões de casamento e de nascimento dos filhos.
O juiz marca uma data para a tentativa de conciliação, obrigatória, ao contrário do que sucede no divórcio por mútuo consentimento. Se os cônjuges se reconciliarem, o processo extingue-se. Caso o juiz consiga obter o acordo dos cônjuges para mútuo consentimento, segue os termos desta modalidade. Tal sucedeu a 26% dos inquiridos, cujos processos passaram de litigiosos para mútuo consentimento. Quando não há conciliação nem acordo quanto aos termos do divórcio, o processo segue para julgamento.
A seguir à tentativa de conciliação, o cônjuge contra quem foi instaurado o processo tem 30 dias para contestar por escrito. No julgamento, são apresentadas as provas e ouvidas as testemunhas indicadas pelas partes. Se um dos elementos discordar da decisão do tribunal, pode recorrer da sentença, primeiro para a Relação, depois para o Supremo.
As questões patrimoniais, como o destino da casa, são tratadas noutro processo - o inventário para partilha de bens comuns.
500 euros em advogado
Embora não seja obrigatório recorrer a advogado no divórcio por mútuo consentimento, a sua contratação pode ser aconselhável para garantir a salvaguarda dos interesses das partes e dos filhos. Nos processos litigiosos, tem sempre de o contratar. Cerca de três quartos dos inquiridos com processos por mútuo consentimento ou litigioso contrataram um e cerca de 40% consideram-no útil. Quem ficou insatisfeito critica o elevado custo, a lentidão e a incompetência. Cerca de 35% denunciam o facto de este não ter passado recibo dos honorários, o que é ilegal. Os inquiridos pagaram entre € 500 e € 2820 com advogados, valor a que é preciso juntar as custas judiciais.
Pensão para ajudar cônjuge e filhos
Quase 20% das mulheres inquiridas recebem pensão de alimentos. O valor médio ronda € 200 mensais. Para apurar o direito à pensão e seu montante, o tribunal considera, por exemplo, a duração do casamento, idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações e possibilidades de emprego. Quem pede a pensão não pode exigir a manutenção do padrão de vida que tinha durante o matrimónio. A pensão é uma "ajuda"; cabe a cada um garantir a sua subsistência após o divórcio.
Se houver filhos menores, o tribunal dá prioridade à pensão de alimentos para estes. Quase dois terços das mulheres inquiridas recebem-na: em média, € 155 para uma criança ou € 250, quando há mais.
Para o bem e para o mal
Com o divórcio, cada cônjuge perde os benefícios a que tinha direito por casamento. Os cônjuges deixam de ser herdeiros um do outro e, caso um venha a falecer durante o processo, os seus herdeiros (pais, filhos) prosseguem a ação, para evitar que aquele de quem estava a divorciar-se herde bens.
Nas relações patrimoniais entre o casal, o divórcio tem efeitos desde o início do processo. Significa isto que, nos regimes de comunhão geral ou de bens adquiridos, os salários recebidos por cada um passam a pertencer a cada um em exclusivo. Porém, relativamente a terceiros, o divórcio só tem efeitos a partir da data em que é registado, o que pode originar dívidas comuns, mesmo depois de iniciado o processo.
Em outubro de 2008, foi eliminada a figura do divórcio litigioso. No seu lugar, surgiu o divórcio sem consentimento de um dos cônjuges. Antes, nestes casos, só era possível dissolver o casamento devido a separação, ausência prolongada do cônjuge ou violação de um dos cinco deveres conjugais - respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência. Atualmente, um cônjuge que pretenda divorciar-se sem o consentimento do outro pode alegar simplesmente ter deixado de gostar do companheiro. Basta que o motivo comprometa a possibilidade de vida em comum para ser aceite em tribunal.
Mais simples com consentimento
Problemas de relacionamento, deixar de gostar do outro, infidelidade e dificuldades financeiras são os principais motivos que levaram os inquiridos a divorciar-se ou a separar-se nos últimos 10 anos. Em quase metade dos casos, o casamento terminou após 10 ou mais anos de vida em comum; em 21%, durou menos de 5 anos.
Quando não há reconciliação, a solução desejável é o divórcio por mútuo consentimento, até pela rapidez. Durou menos de 6 meses para três quartos dos inquiridos, enquanto cerca de metade dos processos litigiosos se arrastaram durante mais de 2 anos em tribunal. Além disso, o processo por mútuo consentimento tem menos custos com advogados e não requer audiências em tribunal, que desgastam a família.
O ideal é que ambas as partes se entendam quanto ao destino e uso da casa, responsabilidades parentais dos filhos menores, pensão de alimentos e relação de bens e valores comuns. Podem então avançar para um processo por mútuo consentimento, via escolhida por 74% dos inquiridos. Caso não haja acordo em relação a alguns destes aspetos, a mediação familiar pode ser a solução antes de recorrer ao tribunal. Mas só 1% optou por esta alternativa.
Num divórcio por mútuo consentimento, os cônjuges não têm de indicar o motivo que os leva a esta decisão, e o procedimento é relativamente simples. Dirigem-se a uma conservatória do registo civil com balcão de divórcios (quase todas têm) e fazem o pedido.
Ao requerimento escrito e assinado pelos dois, devem juntar:
• acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais a aprovar pelo Ministério Público ou certidão da sentença de regulação judicial relativa aos filhos menores (se existirem). Este acordo especifica com quem ficam a residir, o regime de visitas do outro progenitor, valor da pensão de alimentos e modo como é paga;
• acordo sobre a pensão de alimentos a pagar ao ex-cônjuge ou declaração de que os cônjuges prescindem de alimentos;
• acordo sobre o destino da casa da família;
• certidão da convenção antenupcial, caso haja;
• lista com o valor dos bens comuns, incluindo casa, veículos, hipotecas e empréstimos.
Se os ainda cônjuges conseguirem chegar a acordo quanto à partilha dos bens, podem formalizá-la logo na conservatória.
Após a entrega do requerimento, os cônjuges são convocados para uma conferência. Confirmada a vontade de se divorciarem e, desde que haja acordo em relação a todos os aspetos da separação, é decretado o divórcio.
A conservatória do registo civil cobra € 250 pelo processo e € 250 pela partilha do património conjugal e registo dos bens: se houver mais de 5 imóveis, pede € 25 por cada bem suplementar e € 20 adicionais por cada bem móvel (carro ou mobília, por exemplo). Quem não tem meios está isento desde que apresente um comprovativo da Segurança Social. Se as dificuldades financeiras só se aplicarem a um dos elementos, o outro paga metade das despesas do processo.
Ministério Público protege menores
O divórcio é, geralmente, difícil para os filhos menores. Metade dos pais que responderam ao inquérito reconhecem que o processo afetou consideravelmente as crianças. Mas o tempo atenua os problemas: no período que se seguiu ao divórcio, o número desceu para 20%, ainda assim uma percentagem relevante.
Quando há filhos menores, a regulação do poder paternal passa sempre pelo Ministério Público, que dispõe de 30 dias para se pronunciar sobre o acordo. Caso considere que os interesses das crianças não estão devidamente protegidos, indica as alterações necessárias. Redigido o novo acordo, este é submetido a avaliação. Após 30 dias, se o Ministério Público nada disser, o conservador marca a conferência e decreta o divórcio.
Embora a lei procure que as responsabilidades parentais se mantenham a cargo de ambos os progenitores, persiste a tendência de as crianças ficarem ao cuidado da mãe. Assim foi com 82% dos inquiridos, embora, em metade dos casos, o pai partilhe das decisões mais importantes. São poucos os casos de menores entregues ao pai ou a viver alternadamente com o pai e com a mãe.
Sem consentimento, o tribunal decide
No divórcio sem consentimento, que substitui o antigo divórcio litigioso, o cônjuge que pretende a dissolução do casamento deve alegar:
• separação de facto durante um ano seguido. Esta rutura não significa forçosamente que o casal vive em locais diferentes; pode habitar a mesma casa, mas não partilha cama, nem refeições e não faz vida em conjunto. A prova da separação de facto nestas circunstâncias não é fácil, podendo ser preciso recorrer a testemunhas;
• ausência do outro cônjuge sem notícias durante mais de um ano;
• deterioração das faculdades mentais do outro cônjuge, que há mais de um ano comprometa a possibilidade de vida em comum;
• outro facto que demonstre a rutura definitiva do casamento (por exemplo, terem deixado de se amar).
O requerimento, onde consta o motivo do pedido de dissolução, é entregue no Tribunal de Família ou, caso não exista, no Tribunal de Comarca da residência daquele que instaura a ação. Junte meios de prova e as certidões de casamento e de nascimento dos filhos.
O juiz marca uma data para a tentativa de conciliação, obrigatória, ao contrário do que sucede no divórcio por mútuo consentimento. Se os cônjuges se reconciliarem, o processo extingue-se. Caso o juiz consiga obter o acordo dos cônjuges para mútuo consentimento, segue os termos desta modalidade. Tal sucedeu a 26% dos inquiridos, cujos processos passaram de litigiosos para mútuo consentimento. Quando não há conciliação nem acordo quanto aos termos do divórcio, o processo segue para julgamento.
A seguir à tentativa de conciliação, o cônjuge contra quem foi instaurado o processo tem 30 dias para contestar por escrito. No julgamento, são apresentadas as provas e ouvidas as testemunhas indicadas pelas partes. Se um dos elementos discordar da decisão do tribunal, pode recorrer da sentença, primeiro para a Relação, depois para o Supremo.
As questões patrimoniais, como o destino da casa, são tratadas noutro processo - o inventário para partilha de bens comuns.
500 euros em advogado
Embora não seja obrigatório recorrer a advogado no divórcio por mútuo consentimento, a sua contratação pode ser aconselhável para garantir a salvaguarda dos interesses das partes e dos filhos. Nos processos litigiosos, tem sempre de o contratar. Cerca de três quartos dos inquiridos com processos por mútuo consentimento ou litigioso contrataram um e cerca de 40% consideram-no útil. Quem ficou insatisfeito critica o elevado custo, a lentidão e a incompetência. Cerca de 35% denunciam o facto de este não ter passado recibo dos honorários, o que é ilegal. Os inquiridos pagaram entre € 500 e € 2820 com advogados, valor a que é preciso juntar as custas judiciais.
Pensão para ajudar cônjuge e filhos
Quase 20% das mulheres inquiridas recebem pensão de alimentos. O valor médio ronda € 200 mensais. Para apurar o direito à pensão e seu montante, o tribunal considera, por exemplo, a duração do casamento, idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações e possibilidades de emprego. Quem pede a pensão não pode exigir a manutenção do padrão de vida que tinha durante o matrimónio. A pensão é uma "ajuda"; cabe a cada um garantir a sua subsistência após o divórcio.
Se houver filhos menores, o tribunal dá prioridade à pensão de alimentos para estes. Quase dois terços das mulheres inquiridas recebem-na: em média, € 155 para uma criança ou € 250, quando há mais.
Para o bem e para o mal
Com o divórcio, cada cônjuge perde os benefícios a que tinha direito por casamento. Os cônjuges deixam de ser herdeiros um do outro e, caso um venha a falecer durante o processo, os seus herdeiros (pais, filhos) prosseguem a ação, para evitar que aquele de quem estava a divorciar-se herde bens.
Nas relações patrimoniais entre o casal, o divórcio tem efeitos desde o início do processo. Significa isto que, nos regimes de comunhão geral ou de bens adquiridos, os salários recebidos por cada um passam a pertencer a cada um em exclusivo. Porém, relativamente a terceiros, o divórcio só tem efeitos a partir da data em que é registado, o que pode originar dívidas comuns, mesmo depois de iniciado o processo.