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De pequenino… se aprende a ser empreendedor

Ainda antes de terminarem o ensino secundário ou nos primeiros anos da Universidade, os alunos de algumas escolas criam empresas, vendem participações e colocam produtos no mercado. O programa da Junior Achievement ajuda a desenvolver sementes de empreendedorismo que podem germinar no percurso profissional

09 de Setembro de 2010 às 16:12
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Adriana Pereira, Ana Bastos, Cíntia Pereira, João Machado
e Luís Carlos Neto, da Universidade do Porto.
E se em vez de uma ementa em papel o empregado do restaurante lhe oferecer a hipótese de escolher a refeição através de um LCD, integrado numa mesa com suporte giratório? A ideia do D´ChoiceTable foi desenvolvida por um grupo de alunos da Universidade do Porto no âmbito do Graduate Program da Junior Achievement, e colocou a equipa portuguesa entre as três melhores da competição europeia de empreendedorismo.

A ideia foi desenvolvida de forma extra-curricular ao longo do ano lectivo de 2009/2010 e contou com o apoio empenhado da professora Manuela Pinto e de um voluntário do Millennium BCP, Miguel Bacelar, que se revelaram peças fundamentais no projecto, como admite João Machado, um dos alunos da equipa. "O conhecimento, a experiência de vida e trabalho e o espírito aventureiro que nos transmitiram, despertaram em nós a curiosidade de aprofundar mais e melhor este projecto", explica. À medida que este ia sendo desenvolvido surgiam mais problemas e estradas sem saída, ou ideias que levavam a mais caminhos, obstáculos que iam sendo superados em conjunto e que acabaram por resultar na criação de um projecto inovador que pode chegar ao mercado real.

Com uma média de idades a rondar os 21 anos, os alunos da Faculdade de Engenharia e Letras da Universidade do Porto e da Faculdade de Ciências formaram uma equipa multidisciplinar, o que é, aliás, uma das imagens de marca do programa promovido pela Associação Aprender a Empreender - Junior Achievement Portugal que oferece uma formação empreendedora aos alunos universitários e do ensino secundário com o envolvimento de professores e voluntários na criação de um projecto. A iniciativa integra-se numa série de programas desenvolvidos pela associação sem fins lucrativos, que abrange também o ensino secundário com A Empresa, esta dirigida a alunos mais novos, mas com objectivos semelhantes.

O objectivo dos dois programas é criar um produto e uma mini-empresa que leve a cabo um negócio sustentável e com viabilidade financeira. Os alunos reúnem capital através da venda de títulos de participação, criam um produto ou serviço, colocam-no no mercado e por último liquidam a operação e pagam os dividendos aos titulares. Pelo meio existe um plano de negócios, uma proposta de investimento, executam-se estudos de mercado e avalia-se a concorrência, tudo com a ajuda de um professor e um voluntário, normalmente oriundo de uma empresa ligada à associação.


Criatividade multidisciplinar
Na Universidade do Porto este ano o programa abrangeu 70 alunos, provenientes de várias faculdades, e duas das mini-empresas criadas conseguiram o primeiro e segundo lugares na Competição Nacional. Um outro projecto, o Ambinova já está no terreno, encontrando-se em fase de pré-incubação na UPTEC, Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto, à semelhança do que já tinha acontecido na edição do ano anterior, em que a MLife, um dos projectos desenvolvidos, que já se constituiu como empresa.

"O programa permitiu principalmente adquirir competências no âmbito da literacia financeira, onde obtivemos o conhecimento necessário para estabelecer um negócio e estar a par de todos os conceitos financeiros envolvidos nesse processo".
João Machado
TDT - Tecnologias Digitais Tácteis Produto: D´ChoiceTable
Criadores da empresa:
Adriana Pereira, Ana Bastos, Cíntia Pereira e João Machado (do Curso de Ciências da Informação da Faculdade de Engenharia e Letras) e Luís Carlos Neto (do Curso de Engenharia de Redes e Sistemas Informáticos)
Escola de origem:
Faculdade de Engenharia e Letras e Faculdade de Ciências da Universidade do Porto)
Ano de participação no programa:
Ano lectivo 2009/2010
Manuela Pinto, professora da Universidade que acompanhou o projecto TDT lembra que "o programa se sustenta num modelo internacionalmente validado e que para além dos seminários, que contam com a colaboração de professores da U.Porto e profissionais da área, as equipas são acompanhadas por um professor e um tutor do Millennium BCP, contando, ainda, com o contributo pontual de profissionais das diferentes áreas desta instituição financeira". Tudo elementos que conjugados com a criatividade e empenho dos alunos ajudam a criar os ingredientes necessários para a fermentação de ideias de sucesso.

"É fantástico ver como jovens oriundos de áreas como a Ciência da Informação, a Engenharia, o Desporto, a Bioquímica, a Museologia, as Artes, a Economia, ou a História e Relações Internacionais, interagem, identificam oportunidades e dinamicamente criam bens ou serviços que estarão na base da sua futura mini-empresa. Para a própria Universidade é mais uma vertente em que a aposta na partilha do conhecimento, na interacção e na transversalidade da abordagem saem claramente reforçados", justifica Manuela Pinto.

No caso da TDT, o Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto já mostrou interesse em acolher o projecto no Pólo das Indústrias Criativas, para incubação, existindo a possibilidade de firmar uma parceria com uma empresa líder no mercado nacional de software de restauração. Caminhos que João Machado admite que farão parte das decisões a tomar em Setembro.
Até porque, naturalmente, nem todos os projectos se transformam em empresas reais. Aliás, esse nem sequer é o objectivo. E a experiência mostra que, às vezes, serão ideias a desenvolver no futuro. É caso do projecto DOADEAL, criado por alunos da Escola Salesiana de Manique no 12º ano, ao abrigo do programa A empresa, que - apesar das várias solicitações para a criação do negócio e comercialização do jogo desenvolvido - acabou por não avançar nesse sentido, até porque as ambições académicas dos seis alunos envolvidos não se coadunavam com essa concretização, como explica Pedro Espírito Santo, porta-voz do grupo.

A DOADEAL desenvolveu como produto um jogo informático que, de um modo dinâmico e interactivo, pretendia transmitir à população jovem conceitos económicos essenciais e fomentar práticas económicas racionais e responsáveis. O jogo colocava o jovem na posição de gestor familiar, sendo este interpelado por um vasto rol de desafios económicos que acarretavam escolhas e ponderações económicas.

Mesmo sem experimentar, ainda, a concretização no mundo real, Pedro Espírito Santo sublinha que estas iniciativas trazem diversas mais-valias aos alunos, nomeadamente no desenvolvimento de uma cultura de criatividade, que se torna um hábito, e a aprendizagem da resiliência, pela procura de soluções face a situações adversas.

"Creio que competições como esta estimulam na população jovem um espírito proactivo e inquieto que se reflecte invariavelmente no modo de perspectivar a generalidade dos desafios de vida", explica o jovem aluno que acabou por seguir o Curso de Direito e que mostra confiança no facto de existir cada vez mais um espírito de empreendedorismo entre os jovens. "Já são hoje inúmeros os exemplos de sucesso consistente nas mais variadas áreas, que estimulam um "capital de esperança e inovação". Torna-se, por isso, imperioso que programas e estruturas como esta (públicas e privadas) se multipliquem e continuem a promover o empreendedorismo. Também se aprende a empreender", sublinha.

A ideia é partilhada por Gonçalo Vicente, um dos voluntários envolvidos no Junior Achievement, que trabalha como consultor e formador em várias áreas desde 2007. A sua experiência mostra que o espírito empreendedor está cada vez mais presente entre os jovens, e já esteve envolvido em diversos projectos de grande interesse, onde se conta o jogo electrónico dos alunos que venceram a edição nacional de 2008/2009, mas também o desenvolvimento de "hambúrgueres saudáveis", na proporção de 50% de carne de vaca e 50% de legumes, e mesmo a criação de um curso de formação sobre a doença celíaca.

Da esquerda para a direita: Liliana Martinho, António Sá,
Daniela Caeiro, Cláudia Sousa, Catarina Pires. Madalena Pacheco
ao centro.
A participação na Junior Achievement é conjugada com a sua carreira de Gestor de Produto na HP, empresa que patrocina a associação e que lhe disponibiliza tempo para participar no programa. E o balanço é positivo para o seu percurso profissional, já que admite que o torna mais produtivo, mas também para os jovens. "Este programa está muito bem estruturado, e o facto dos alunos se confrontarem com profissionais e situações muito perto da realidade proporcionam um cenário de empresa real", justifica.

Envolvimento e motivação
O salto qualitativo em termos de iniciativa, ideias e capacidade de desenvolvimento que é conseguido entre os alunos que participam no programa A Empresa é também reconhecido por Sandra Marques, professora no INETE - Instituto de Educação Técnica, uma Escola profissional.
A parceria com a Associação começou em 2008 e o projecto é trabalhado durante o ano lectivo do 11º ano, tendo já dado azo ao desenvolvimento de produtos que continuam a ser comercializados pelos alunos, como o da Eco2 Arte, que produz sacos a partir de sacos de café e pacotes de leite.
"Acredito que o espírito empreendedor está aliado aos portugueses, especialmente nestas idades. Há é falta de credibilidade mesmo por serem empreendedores tão novos". Madalena Pacheco
Pocket&Food - Produto:
Pocket Lunch
Criadores da empresa: Madalena Pacheco, Catarina Pires, Cláudia Sousa, Daniela Caeiro, Liliana Martinho e António Sá
Escola de origem: Escola Profissional Magestil
Ano de participação no programa: ano lectivo 2007/2008

A professora lembra porém que os alunos do INETE são ainda muito novos para que os projectos levem à criação de empresas reais. "Os alunos têm 17/18 anos e ainda têm ambições de desenvolvimento académico, mas ajuda a mostrar que há outras hipóteses para além de trabalhar por conta de outrem, e no futuro acredito que poderá criar outras saídas profissionais", explica.

A juventude foi também um dos argumentos utilizados por Madalena Pacheco para explicar porque é que o projecto Pocket Lunch não saiu da gaveta da iniciativa A Empresa. Para avançar era preciso reunir alguns elementos, um dos quais a vontade de o concretizar, mas "também é preciso capital, financiamento e conhecimentos mais maduros", lembra a aluna, que não desiste de ideias empreendedoras que poderão concretizar-se no futuro.

"Acredito que o espírito empreendedor está aliado aos portugueses, especialmente nestas idades. Há é falta de credibilidade mesmo por serem empreendedores tão novos. Havendo falta de credibilidade há falta de oportunidade e falta de instituições como a Aprender a Empreender", refere Madalena Pacheco.

A trabalhar como voluntário há quatro anos em vários programas da Junior Achievement, Nuno Lucas já teve oportunidade de estar envolvido em alguns projectos que acredita terão pernas para andar no futuro. Mas o mais importante não é só criar já uma empresa, sobretudo para alunos tão jovens. Ao complementarem o programa de ensino curricular com conceitos que poderão ser utilizados na vida profissional futura de alguns alunos, mas que fazem parte da vida de todos como cidadãos. "Esta iniciativa é também uma oportunidade de fazer a ponte entre a escola e as empresas, dando aos alunos uma visão mais próxima do mundo de trabalho e que os pode ajudar a fazer escolhas para o seu futuro profissional", adianta o profissional que conjuga o voluntariado com o cargo de Consultor Sénior na área de Estratégia da Accenture, que apoia os projectos da associação desde a sua fundação.


Menus digitais
O terceiro lugar na competição Europeia de Empreendedorismo foi o mais elevado já conseguido por uma equipa portuguesa integrada num programa da Junior Achievement, o que deixa os jovens da Universidade do Porto cheios de orgulho, mas também confiança no trabalho realizado ao longo do ano lectivo, de forma extra-curricular.

A proposta da mini-empresa centrava-se no produto D´ChoiceTable, dirigido ao sector da restauração, que propõe a utilização de um LCD onde os clientes do restaurante podem seleccionar o menu para a refeição, recebendo informação extra como o tempo necessário à confecção e até a lista de pratos mais pedidos. Depois de ganhar a edição nacional do concurso, a equipa composta por cinco alunos teve de provar o que valia na final europeia, que decorreu
em Sofia, na Bulgária, onde o projecto foi apresentado a um júri de potenciais investidores,
com montagem de um stand, apresentação da ideia em palco e a fase de elevator pitch.

"Foi uma experiência totalmente diferente do concurso nacional pois estávamos a competir contra os melhores da Europa! Havia ideias muito boas e muito fortes", admite João Machado, um dos alunos da equipa, que reconhece ter sido uma experiência enriquecedora, somando-se à do desenvolvimento do projecto em si, que já deu uma bagagem de conhecimento sobre
o mundo empresarial que é uma mais-valia para projectos futuros.



Inspirar empreendedorismo
Os programas A Empresa e Graduate Programme são apenas duas das iniciativas que a Junior Achievement Portugal implementou desde que foi fundada, em Setembro de 2005.

A adesão e receptividade das escolas, alunos, empresas e voluntários tem permitido à associação crescer todos os anos, sendo já considerada um caso de sucesso na Europa, como explica Erica Nascimento, directora da Junior Achievement Portugal.

A partir dos seis anos de idade os alunos já podem ser envolvidos em programas que promovem a cidadania e ética, empreendedorismo e literacia financeira, experimentando conceitos de gestão familiar, organização da comunidade e finanças pessoais, que culminam
com as iniciativas de criação de empresas para os mais crescidos.

No ano lectivo de 2009/2010 estiveram envolvidos nos vários programas mais de 28 mil alunos
e no próximo ano, que tem início em Setembro, a meta é chegar aos 35 mil alunos. "O nosso objectivo é que as crianças e jovens tenham uma experiência com a Junior Achievement", sublinha.

E se numa primeira fase a actividade da associação estava centrada na Grande Lisboa e Grande Porto, hoje estende-se a todo o país, chegando este ano aos Açores. "No início éramos nós que contactávamos as escolas mas agora todos os dias recebemos pedidos de escolas que querem participar", adianta ainda Erica Nascimento, explicando que é muito fácil às escolas e empresas envolverem-se neste conceito que ajuda a criar riqueza para todo o país.


Almoço para transportar

A observação de hábitos de alguns dos professores da Escola Profissional Magestil, que transportavam diariamente as suas refeições sem um acondicionamento apropriado,
foi o rastilho da ideia de um grupo de alunos no segundo ano do curso, que decidiu criar o Pocket Lunch.

O produto consistia numa mala de transporte individual de refeições, criada com apoio dos professores de design, e que há chegou às mãos do Presidente da República, embora este possa não ter muitas oportunidades para usar esta lancheira estilizada.

Manuela Pacheco, uma das alunas da equipa, admite que apesar de esta ser uma experiência efémera, quando termina fica a bagagem e o conhecimento adquirido, mas "é uma fase que acaba e a vida real continua", sublinha. "Depois deparamo-nos com a realidade que é bem nua e crua e se continuarmos a ser empreendedores é no nosso quotidiano e na forma como encaramos a vida, as oportunidades e as metas. Sim, é isso, ficamos mais motivados, mas sem certezas no futuro", adianta a jovem.

Para transformar o projecto em realidade faltaram vários elementos: a vontade, capital, financiamento e conhecimentos mais maduros. Mas Manuela Pacheco não desiste totalmente de ser empreendedora. "Nunca se sabe as voltas que a vida dá, e as ideias inovadoras que ainda poderão surgir no futuro para dar vida a empresas reais, de igual sucesso.



"Creio que competições como esta estimulam na população jovem um espírito proactivo e inquieto que se reflecte invariavelmente no modo de perspectivar a generalidade dos desafios de vida". Pedro Espírito Santo Doadeal- Produto: Do a Deal - jogo informático
Criadores da empresa: Pedro Espírito Santo, João Jesus, Rita Cavaco, Vítor Pereira, Diogo Capitão e Carolina Beja
Escola de origem: Escola Salesiana de Manique
Ano de participação no programa: ano lectivo 2008/2009
Aprender a economizar
A ideia foi desenvolvida na disciplina de Área de Projecto, no 12º ano de escolaridade por um grupo de alunos da Escola Salesiana de Manique, que criaram um jogo onde se promovem conceitos de economia e práticas responsáveis. Inspirado na política americana New Deal, criada devido à crise financeira de 1929, este jogo era dirigido a um público-alvo de jovens a
quem eram colocados desafios económicos que acarretavam escolhas e ponderações económicas. Os próprios criadores da ideia ainda não tinham passado a fasquia dos vinte anos, mas o conceito acabou por ter sucesso e dar azo a uma série de convites para a avançarem com a empresa, que acabaram por não encontrar acolhimento face à ambição de carreiras académicas que os seis alunos possuíam, e que aliás levaram avante, estando actualmente no primeiro ano universitários de cursos de Direito, Sociologia e Gestão Hoteleira.

Mesmo que em "suspenso" os ensinamentos de empreendedorismo ganhos com a experiência não se perdem, quer pelo hábito de desenvolver a criatividade e a capacidade de ultrapassar obstáculos, ou mesmo de exercício do trabalho em rede, como salienta Pedro Espírito Santo, um dos alunos responsáveis pelo projecto.

A possibilidade do jogo ser difundido pelo público para o qual foi criado ainda não está colocada de lado, já que decorrem negociações para comercializar o jogo em regime de exclusividade através da Junior Achievement.



DECLARAÇÕES
"É fantástico ver como jovens oriundos de áreas como a Ciência da Informação, a Engenharia, o Desporto, a Bioquímica, a Museologia, as Artes, a Economia, ou a História e Relações Internacionais, interagem, identificam oportunidades e dinamicamente criam bens ou serviços que estarão na base da sua futura mini-empresa".
Manuela Pinto, professora


"Os alunos têm 17/18 anos e ainda têm ambições de desenvolvimento académico, mas ajuda a mostrar que há outras hipóteses para além de trabalhar por conta de outrem, e no futuro acredito que poderá criar outras saídas profissionais".

Sandra Marques, professora

"Esta iniciativa é também uma oportunidade de fazer a ponte
entre a escola e as empresas, dando aos alunos uma visão mais próxima do mundo de trabalho e que os pode ajudar a fazer escolhas para o seu futuro profissional".

Nuno Lucas, voluntário


"Este programa está muito bem estruturado, e o facto dos alunos se confrontarem com profissionais e situações muito perto da realidade proporcionam um cenário de empresa real".

Gonçalo Vicente, voluntário

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