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A mina de 1.400 milhões que quase virou um punhado de areia

O salar de Pozuelos, na Argentina, está no centro de uma complexa trama financeira que envolve empresários e bancos sul-coreanos, companhias de Hong Kong e avaliações multimilionárias de um negócio em torno da "nova gasolina": o lítio.

Reuters
14 de Abril de 2017 às 10:00
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A história começa em 2009, quando os efeitos da crise económica e financeira mundial ainda abanavam os mercados. Nos quatro anos anteriores, o preço de uma matéria-prima de que começava a ouvir-se falar com insistência, pela sua aplicação na energia, praticamente triplicara. Os valores por tonelada haveriam de oscilar na década seguinte, mas aquele foi o momento que Choi Sung-min escolheu para entrar no comboio do lítio.

Conta a Bloomberg que o empresário comprou por 15 milhões de dólares a LitheA, uma companhia com actividade em Salta, na Argentina. A aquisição foi feita através da sua empresa CordiaGlobal, sediada nas Ilhas Virgens Britânicas. Sung-min e a Lithea ficarão ao longo de oito anos no centro desta história, que transformará uma avaliação da ordem de milhar de milhão de euros numa mão cheia de quase nada.

É no triângulo Argentina– Hong Kong – Coreia do Sul que tudo se passará. É deste último país que é originária a Posco: o maior fornecedor sul-coreano de aço, que desenvolveu uma tecnologia com a qual é possível extrair maiores quantidades de lítio, alegadamente de forma mais económica, rápida e sustentável. E que virá a juntar-se à LitheA, num caminho comum que culminou no anúncio, no ano passado, da construção de uma unidade de processamento de lítio no salar de Pozuelos, utilizando a tal tecnologia inovadora.

A relação entre a empresa sul-coreana e a LitheA começará depois da intervenção de Herman Tso, dono de uma firma de trabalhos geológicos de Hong Kong, mandatada para encontrar potenciais locais para o uso da tecnologia da Posco. A quatro mil metros acima do nível do mar, a reserva de lítio do salar do Lago Pozuelos, gerida pela LitheA e avaliada em 1,5 milhões de toneladas daquele mineral, assenta que nem uma luva ao novo método.

Avaliações exponenciais

Mas a relação entre Herman Tso e o dono da reserva argentina não começou aqui – meses antes, a empresa de Hong Kong tinha avaliado uma mina de carvão russa parcialmente detida por Choi, num relatório que serviu para a Siberian Mining Group levantar financiamento no mercado. A aventura não acabou bem: os investidores que emprestaram milhões de dólares descobriram que a mina não tinha o valor propagandeado e a dona da mina da Sibéria viu derrocar o seu valor em bolsa. Em Novembro de 2010 cada acção valia 4,88 dólares de Hong Kong; em Março de 2013 cotava a 0,23 dólares.

Em Julho de 2013, Tso esteve na Argentina e considerou tecnicamente viável a exploração do projecto LitheA, avaliando-a em 280 milhões de dólares. Um ano antes, a posição de Choi na companhia tinha sido estimada em 250 milhões de dólares. A LitheA previa, numa apresentação institucional, que esse valor poderia quintuplicar logo que a empresa entrasse em bolsa. Ou seja: em três anos, de 2009 a 2012, aquilo que tinha sido uma compra de 15 milhões passava a estar potencialmente avaliada em 1.400 milhões de dólares, quase cem vezes mais.

É por essa altura que Choi começa a ser investigado pelo fundo de garantia de depósitos de Seul, o Korea Deposit Insurance Corp, que tentava reaver dois milhões de dólares que haviam sido emprestados ao empresário por um banco que acabaria por falir. O regulador alegou que o montante foi desviado para investir na mina da Sibéria. O empresário nega as acusações e alega que o dinheiro usado nos seus investimentos teve origem numa outra actividade mineira, na Indonésia.

E, em 2014 Choi acaba por vender a sua posição na LitheA por… 1,3 milhões de dólares. Menos de 1% da avaliação da empresa que tinha sido feita um ano antes. Mas a teia continua a estender-se. É que o comprador da posição é a BMC Global, uma empresa detida por um sócio de Choi e que com ele trabalhara na mina de carvão da Sibéria. Choi defende-se: vendeu a sua posição para liquidar dívidas a um investidor de Hong Kong e não para se esconder das autoridades sul-coreanas.

Relações cortadas?

Os problemas com o empresário levaram a Posco, liderada por Kwon Ohjoon, a cortar relações com a LitheA. Só no final de 2014, e com a condição de afastamento de Choi, reatam contactos. Mas a Bloomberg sustenta que a ausência de Choi não terá correspondido à realidade: o empresário aparece ao lado de Kwon numa imagem, dois anos depois, na mina argentina.

A separação consumou-se em Setembro do ano passado. A Posco abandonou a "joint-venture" alegando violação de contrato, sete meses depois de ter anunciado o investimento na Argentina que permitiria extrair 2.500 toneladas de lítio por ano – o material necessário para as baterias de 60 mil carros por ano, segundo o Business Korea.

De então para cá, os acontecimentos precipitaram-se. As autoridades sul-coreanas continuaram a pressionar Choi e, em Fevereiro do ano passado, um tribunal das Ilhas Virgens deu ordem para congelar até 102 mil milhões de won (84,65 milhões de euros) em bens do empresário, bem como um apartamento em Manhattan, Nova Iorque, avaliado em 3,2 milhões de euros.

A nova dona da LitheA, a BMC, foi entretanto processada por um credor, a Tor Asia Credit Master Fund, e a 15 de Março passado assinou um contrato de venda da empresa argentina à LSC Lithium Corp., uma empresa canadiana. A LSC espera agora, com a compra do salar – ainda dependente da aprovação da bolsa canadiana -, colocar os pés numa das zonas do mundo com maior potencial para a extracção daquele mineral.

O valor da transacção - 44 milhões de euros – é quase três vezes o que o Choi pagou em 2009 e muito menos do que qualquer das avaliações posteriores, incluindo a de Tso - cuja capacidade para avaliar minas foi no ano passado arrasada pelos tribunais. Oito anos depois da compra de Choi, a mina ainda não produziu lítio com fins comerciais.

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