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"O mercado imobiliário tem três grandes desafios pela frente"
Francisco Rocha Antunes tomou posse este mês como novo presidente do Urban Land Institute (ULI) em Portugal, liderança que até agora era ocupada por Gilberto Jordan. Em entrevista ao Jornal de Negócios, Francisco Rocha Antunes sublinha que o mercado nacio
Em Portugal há um défice de debate sobre o mercado imobiliário?
O mercado português é tradicionalmente fechado. No ULI acreditamos que o mercado ganha em sermos todos mais abertos e os membros da Urban Land são convidados a, na sua actividade corrente, terem uma postura de abertura diferente do que é clássico no mercado imobiliário português.
De uma maneira falta transparência. É isso?
É um mercado em evolução. Tem hoje desafios e regras diferentes dos que tinha há dez anos. Portugal, como todos os mercados, está a evoluir num sentido melhor, de maior exigência e transparência.
Quais os segmentos do imobiliário em que no caso português há maiores carências?
O mercado imobiliário português tem diferentes análises. Genericamente o segmento imobiliário português mais desenvolvido é o do retalho, é aquele em que nós exportamos tecnologia, na área dos centros comerciais. Esse será um segmento que está com um grau de profissionalização superior. Mas o resto dos segmentos imobiliários funcionam relativamente bem.
Mas não há problemas?
Há problemas no imobiliário como em qualquer outro mercado. A ideia de que o mercado seja comparável com os problemas que existem em Espanha ou Inglaterra é completamente desfasada. O mercado português deixou de estar em subida em 2002. Se há seis anos que não subimos não podemos agora pensar que estamos numa situação semelhante à do mercado espanhol, que parou de subir há dois meses ou três. Aquilo que se verifica no mercado inglês e espanhol de queda de preços resulta de uma circunstância que não é portuguesa.
Que problemas existem então?
Os mais importantes são o excesso de legislação, de regulação nem sempre coordenada com as realidades económicas e um clássico problema que resulta da excessiva concentração das duas áreas metropolitanas. Não cabe ao mercado imobiliário contrariá-lo, cabe aos políticos.
As funções do Instituto da Construção e do Imobiliário estão a ser bem conseguidas?
Não nos cabe a nós comentar se um determinado organismo de regulação está ou não a funcionar bem, porque não somos uma associação de promotores imobiliários. Somos uma associação que defende um melhor uso do espaço urbano, portanto somos mais vastos e menos corporativos. Como associação de melhores práticas evidentemente que achamos que há sempre coisas a melhorar. Estou de acordo que a protecção do consumidor seja cada vez maior, como é, mas gostaríamos também de sentir razoabilidade nas imposições que nos são colocadas no sentido de que não sejam impostas tantas condições que os valores para fazer espaços de acordo com a legislação fiquem fora do alcance da maior parte das bolsas.
Que imposições são essas?
Não vamos particularizar. O que sentimos é que são feitas dentro de uma perspectiva legítima mas que não entra em conta com o efeito no conjunto.
Em que medida a organização do espaço, como o defendem, pode ser prejudicada pelo excesso de regulação?
Temos a consciência de que existe um esforço de protecção do consumidor, que não podemos deixar de saudar, mas que implica a criação de cada vez mais regulamentos e ao mesmo tempo temos o Simplex, que supostamente simplifica. Não nos está a parecer claro qual dos dois movimentos irá resultar como predominante.
Há diferenças substanciais entre a forma como a gestão imobiliária é feita em Portugal e noutros mercados europeus?
Não. Existem em todos os mercados diferenças dentro do mercado, entre agentes com maiores preocupações de profissionalização e agentes não tão preocupados. Mas sentimos que o mercado imobiliário português a nível dos seus agentes é absolutamente típico dentro do contexto europeu.
E no contexto mundial?
A lógica espacial americana é muito diferente da europeia e, como tal, historicamente, tem limites muito diferentes da europeia. Na Europa sempre tivemos grandes discussões sobre quem determinava o uso e ocupação dos espaços, enquanto nos EUA o espaço sobra. Naturalmente isto tem consequências na definição das regras. Curiosamente, sentimos que os nossos colegas americanos têm uma curiosidade cada vez maior em questões como a densidade de construção para acabarem ou limitarem a mancha urbana, que é ambientalmente um dos maiores problemas que as cidades americanas têm.
A que desafios é que os diversos agentes em Portugal vão ter de responder nos próximos anos?
Pensamos que o mercado imobiliário tem três grandes desafios pela frente. A questão da acessibilidade económica à habitação, não apenas nas franjas em que habitualmente funcionam os programas de habitação social, mas naquilo que se chama "habitação para as classes trabalhadoras". A segunda grande preocupação é a questão da enorme dificuldade em manter o investimento nas infra-estruturas. Estamos a ficar com infra-estruturas sub-mantidas e isso a prazo é um problema sério. A terceira é a questão ambiental.
Quem é que vai ser responsável para se conseguir bons resultados nessas questões?
O conjunto dos membros [do ULI]... Estamos a preparar programas e estudos que nos permitam na prática continuarmos a ser líderes na resolução destes problemas. É através da partilha desses conhecimentos entre os membros que propomos que os resultados vão aparecendo.
Já houve propostas concretas que tenham resultado a mudanças em estratégias de urbanização e promoção imobiliária?
Há claramente dentro dos membros do ULI preocupações de sustentabilidade ambiental que são realidade em projectos desenvolvidos. Não cabe a mim particularizar.