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Contabilistas preocupados com acesso do Fisco a dados valiosos das empresas

A Ordem dos Contabilistas admite preocupação perante "os valiosos" dados empresariais que em 2019 serão enviados ao Fisco, segundo as novas regras de simplificação da Informação Empresarial Simplificada (IES), mas avisa que o cuidado tem de ser das empresas.

Lusa
08 de Março de 2018 às 09:18
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As entidades que entregaram Informação Empresarial Simplificada (IES) a partir do segundo semestre deste ano já beneficiam das novas regras de simplificação desta obrigação fiscal imposta pelo Fisco a empresas e contribuintes com contabilidade organizada, mas o objectivo é alargar no próximo ano a todos com aquela obrigação declarativa.

 

Esta medida Simplex, a IES+, vai possibilitar ao Fisco pré-preencher de forma automática, tal como já faz na declaração de IRS, as demonstrações financeiras na IES a partir dos dados enviados pelos contabilistas, cujos programas de contabilidade vão extrair um ficheiro SAF-T (abreviatura de 'Standard Audit File for Tax Purposes -- Portuguese Version', que tem toda a documentação fiscalmente relevante da empresa, relativa a um determinado período de tempo) que depois é enviado ao Fisco.

 

O Fisco vai ter, assim, acesso a dados valiosos das empresas e, para quem entende de contabilidade, não é sequer difícil obter dados valiosos, como a margem comercial de uma empresa ou os seus fornecedores, e que são muito apetecíveis às vendas ilegais das bases de dados.

 

"Há aqui dois pontos. A parametrização, que vai existir, vai beneficiar os contabilistas no exercício da sua profissão e facilitar o trabalho do dia-a-dia. Mas não deixa de ser uma promiscuidade muito grande, até porque a partir do momento em que a Autoridade Tributária está a interferir na contabilidade, parametrizando-a, não é muito positivo do ponto de vista contabilístico", defendeu a nova bastonária, empossada na segunda-feira, Paula Franco.

 

A uniformização da informação vai diminuir e melhorar os tempos de trabalho dos contabilistas, e isso é positivo para estes profissionais, mas o controlo que o Fisco vai ter sobre esses dados, já preocupa a bastonária.

 

"A questão da protecção de dados é uma questão que deve preocupar muito as empresas. Os contabilistas têm levantado essa preocupação, mas quem tem de estar preocupado são as empresas", afirmou, defendendo que as associações empresariais deviam estar "mais activas" neste processo, tentar "perceber a informação e como essa informação vai ser protegida" pela AT.

 

"É verdade que se trata de uma informação muito valiosa e vai estar onde muita gente a pode consultar, porque a AT permite o acesso a muitos elementos, embora tenha também limitações de consulta. Mas é informação que vai estar espalhada por muitos lados e, ao estar espalhada, pode sempre ir parar onde não deve. Acho que deve existir uma preocupação das empresas", afirma, em entrevista à Lusa.

  

Problemas na banca podiam ter-se evitado se imparidades não fossem escondidas

 

A nova bastonária dos Contabilistas considera que muitos dos problemas que levaram à queda de bancos e de outras empresas podiam ter sido evitados se estes profissionais não tivessem ocultado a contabilização de imparidades.

 

"Os casos do BES [Banco Espírito Santo], e outros que vieram a público, vieram provar que, se as situações não tivessem sido ocultadas, em termos de demonstrações financeiras, já teriam vindo a público muito mais cedo e, se calhar, até se tinham evitado muitos dos problemas", disse a bastonária, em entrevista à Lusa.

 

A expressão "perda por imparidade" foi introduzida pelo Sistema de Normalização Contabilística (SNC) e acontece quando a quantia recuperável de um activo, ou de uma unidade geradora de caixa, é inferior à quantia escriturada ou contabilizada.

 

Paula Franco lembra: um contabilista "tem de ter isenção" e "tem de perceber que, quando dizemos sim a uma administração, não estamos a ajudar, estamos a prejudicar", tanto a sociedade como a própria administração ou empresa.

 

"Num primeiro momento podemos ser flexíveis, tentar ajudar e pensar que estamos a ajudar", ressalvou a bastonária, mas para logo de seguida defender que há necessidade de "uma mudança" quanto à isenção, mas tanto nos profissionais inscritos na Ordem como nas empresas para quem trabalham.

 

"Também quem contrata serviços não deve exigir que a contabilidade seja adaptada às necessidades das empresas, porque isso não vai beneficiar a empresa, vai antes prejudicá-la", alertou.

 

A bastonária salientou que o prejuízo, da falta de isenção, pode até não se verificar no ano em que foram ocultadas as informações, e até ao contabilista "pode parecer que está a ajudar" o cliente.

 

Mas, "mais tarde ou mais cedo, as situações financeiras vêm ao de cima e, portanto, tudo o que é virtual ou criativo, em termos de contabilidade, não beneficia as empresas, prejudica antes as empresas. Se não for nesse ano, será mais tarde ou mais cedo", concluiu.

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