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“Com salários baixos não há hipótese alguma de motivar as pessoas”

Entrevista a Soares dos Santos, “chairman” da Jerónimo Martins.

07 de Dezembro de 2007 às 20:48
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Há muito o discurso, não só na política, mas também no mundo empresarial, que a qualidade média do cidadão português, em termos da sua formação cívica e educacional é muito baixa, daí justificarem-se níveis de salários igualmente baixos. Também acredita que os salários são baixos porque a formação e a produtividade são más?

Em Portugal, de uma forma geral, existe falta de formação. Essa falta de formação é culpa do ensino actual. No passado, embora não fosse massificado, o ensino era melhor. O de hoje não tem objectivos, o que é grave. Há um problema que se coloca, o empresário pode ter capacidade de dar a formação que falta e que a Escola não seu às pessoas. Seja para lugares mais baixos, seja para os quadros. Considero que com salários baixos não há hipótese alguma de motivar as pessoas.

Os salários poderiam ser mais altos?

Na maior parte dos casos poderia, se houvesse um estudo de empresa, que a racionalizasse, tornando-a mais eficiente e, eventualmente, reduzindo o número de pessoas, mas melhorando o nível salarial das restantes. Não consigo ver de que modo se motiva uma pessoa que no final do mês leva para casa 400 euros. Nada justifica que tenha ânimo para ir trabalhar. À mínima razão, ela falta.

Depois de, em determinado momento, após os problemas ocorridos no Brasil, o grupo Jerónimo Martins ter ultrapassado um conjunto de dificuldades financeiras, o senhor quis dar um bónus a cada um dos trabalhadores, em sinal de reconhecimento pelo que tinham feito. Mas teve dificuldades em fazê-lo. Não eram os administradores das empresas, mas sobretudo os quadros intermédios que procuraram travar essa sua pretensão. Como explica essa resistência?

Muitas vezes, quando os quadros, sobretudo os de topo, analisam os problemas nas empresas, fazem-no apenas sob uma óptica do lucro. A empresa tem que olhar a outros aspectos. No nosso caso, a atribuição do prémio teve em vista agradecer às pessoas o terem percebido que a Jerónimo Martins estava numa situação em que tinha d éter uma política salarial restritiva. Isso foi explicado às pessoas e foi compreendido. Findo esse problema, havia que dizer-lhes que também havíamos pensado nelas. Isso ajuda a motivar.

Mas sendo essa ideia tão racional e sensata, que tipo de obstáculos poderiam ser levantados?

Por exemplo, pensar que os custos aumentam pelo facto de se dar um prémio ou que o lucro a distribuir no final do ano para dividendos se reduz. Mas reduz-se por boas razões. Não há nenhum accionista que não compreenda isso.

Referiu que há responsabilidade do empresário em fazer um esforço complementar na formação do funcionário e o funcionário está disponível para isso?

Está muito mais do que disponível. Quer! Fizemos um acordo para introduzir no grupo este programa do Governo "Novas Oportunidades", e, logo de entrada, sem qualquer anúncio, tivemos 600 voluntários. Pessoas que estão ávidas de progredir e de melhorar a sua formação. As pessoas querem. Expliquem-lhes, que elas respondem.

Daí que centre o problema nacional no comportamento das elites.

As elites têm uma responsabilidade muito grande em motivar a sociedade civil a participar no desenvolvimento. O desenvolvimento não é apenas responsabilidade de um Governo. É de todos os cidadãos.

Hoje em dia, já conhece quase tão bem a Polónia como Portugal. A qualidade das elites polacas é assim tão melhor que a das portuguesas que justifique atitudes da sociedade polaca perante o trabalho radicalmente opostas face ao que se passa no nosso país?

Não sei como actuam as elites polacas. Conheço bem o país e sei a resposta que a Polónia tem dado. O ali se passa é verdadeiramente extraordinário. É o resultado da vontade de um povo. Percebeu que o país tinha de se reconstruir. O regime comunista destruiu o país completamente, em cima já de uma guerra que o tinha destruído, e o povo teve um ânimo brutal e motivou-se para recuperar. Evidentemente que as elites também tiveram a sua quota-parte nesta vitória. Mas acima de tudo, o investimento estrangeiro levou um aport em todos os seus múltiplos aspectos e abriu a juventude polaca para um mundo completamente novo.

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